“O sofrimento dos imigrantes inspirou minha vocação sacerdotal”

padre.jpg.jppEntrevista com o Pe. Gonzalo Meza, de San Antonio (EUA)

Em 6 de fevereiro de 2011, o site ZENIT.org publicou uma bela entrevista com o Pe. Gonzalo Meza, que relata com detalhes como o sofrimentos dos imigrantes nos Estados Unidos o influenciou na descoberta de sua vocação para o sacerdócio. Em virtude de estarmos vivendo o mês das vocações na Igreja, achamos conveniente compartilhar com vocês esta história:

– Trabalhando na Embaixada dos EUA na Cidade do México, Gonzalo Meza enfrentava todo dia o sofrimento daqueles que tentavam chegar aos Estados Unidos.

Foi o sofrimento dessas pessoas que incutiu em Meza um desejo de alimentar a sua esperança, o que o levou ao sacerdócio.

Hoje, o Pe. Meza é um sacerdote da diocese de San Antonio, Texas, que estuda em Roma, na Pontifícia Universidade da Santa Cruz. Nesta entrevista, ele conta a sua vocação.

O que o inspirou a se tornar um padre?

Pe. Meza: Eu trabalhei alguns anos na embaixada dos EUA na Cidade do México, na seção consular, e lá percebi o problema da imigração. Compreendi como as pessoas sofrem para tentar chegar aos Estados Unidos. Por várias razões, eu tive que ler estas histórias tristes.

Como essas histórias de imigração o motivaram para o sacerdócio?

Pe. Meza: Eu tocava o sofrimento das pessoas e pensava que precisava fazer alguma coisa. Precisava fazer alguma coisa para ajudar essas pessoas. Precisava dar esperança a essas pessoas. Eu não podia dar-lhes esperança, mas podia transmitir esperança e a esperança é Cristo. Percebi que, sendo um padre, poderia ajudar e fazer muitas coisas para ajudar as pessoas, muito mais do que estando no escritório de uma embaixada. Foi um trabalho que eu gostei, mas acho que pregar o Evangelho, dar esperança às pessoas, é o que elas realmente precisam. Precisam de dinheiro, é claro, mas eles precisam mais de Cristo.

Quarenta e cinco por cento da população do México vive abaixo da linha da pobreza. Por que há tanta pobreza?

Pe. Meza: Quando se pensa do México, pensa-se em um país, mas há muitos Méxicos. É um país de contradições. De um lado está a pobreza extrema e, do outro, um monte de gente rica – um mexicano está na lista Top 10 da Forbes. O México é um país de contradições.

As diferenças são enormes, mas existe alguma ponte?

Pe. Meza: No México, há uma pequena classe média. A riqueza do México vem sobretudo do petróleo. Temos uma grande indústria de petróleo, PEMEX, uma empresa de petróleo mexicana. Outra fonte de renda é o turismo; e a terceira fonte de renda são as remessas dos EUA para o México. A economia mexicana precisa de mais, porque quando se depende apenas desses pilares, quer dizer que não se está usando o potencial que as pessoas podem dar.

Voltando à sua vocação. Você pôde dar esperança, como sacerdote?

Pe. Meza: Sim, é uma belíssima experiência pregar o Evangelho, celebrar a Missa, ouvir confissões; apenas falar com as pessoas – especialmente hispânicas – e dar-lhes esperança, porque, como mencionei, muitas delas estão tristes.

O México tem uma população de 110 milhões, e a maioria da população é católica romana. O governo legalizou o aborto (na capital). Isso significa que a influência da Igreja Católica está diminuindo?

Pe. Meza: Para responder a esta pergunta, deixe-me lhe dizer algo. Ao analisar as pesquisas, vemos diferentes instituições e a influência dessas diversas instituições nos mexicanos. Várias pesquisas indicam que a Igreja é a primeira na qual os mexicanos acreditam.

A questão do aborto e sua legalização não significam que a Igreja perdeu a sua influência, porque foi uma decisão tomada por um pequeno grupo de pessoas que decidiu introduzir a lei. Na mente dos mexicanos não há uma cultura do aborto, porque, para os mexicanos – eu sou mexicano e posso dizer isso – existe esse sentimento e instinto natural de proteger a vida.

Esta ideia de matar um bebê no útero é completamente estranha à cultura mexicana e vem toda de fora, não está dentro dos valores originais dos mexicanos. Então, como mencionei, esta nova lei, permitindo o aborto em certas circunstâncias, é algo estranho aos valores e à cultura do México e, claro, absolutamente contrária à doutrina católica.

Como você descreveria a fé dos católicos mexicanos?

Pe. Meza: Esta é uma pergunta interessante. Os católicos no México têm uma grande devoção e fé verdadeiramente “do povo”, mas essa devoção nasce de muitas coisas, por exemplo, de Nossa Senhora de Guadalupe. A história de Nossa Senhora de Guadalupe é uma história de inculturação excelente. Através de Nossa Senhora, o povo do México foi evangelizado, porque Nossa Senhora de Guadalupe chegou em um momento de grande sofrimento para a população, na época da Nova Espanha. Ela apareceu como uma consoladora, como uma mãe que consola o seu povo sofredor, porque, na época em que os conquistadores chegaram, houve muita devastação, havia muitas coisas ruins, mas Nossa Senhora chegou para evangelizar e inculturar a mensagem do Evangelho.

O que você quer dizer com “inculturação”?

Pe. Meza: A “inculturação” é a difusão do Evangelho através da cultura local, colocar o Evangelho nas tradições do povo; proclamar Jesus Cristo às pessoas que utilizando suas tradições, seus costumes, sua língua e sua forma de agir.

Nossa Senhora de Guadalupe teve algum impacto em sua vida?

Pe. Meza: Existe um ditado que diz: “Nós somos mexicanos, mas sobretudo somos guadalupanos”. Minha primeira Missa foi na Basílica de Nossa Senhora de Guadalupe. Decidi confiar a Ela o meu ministério sacerdotal. Tenho uma grande devoção a Nossa Senhora de Guadalupe, Nossa Mãe. Ela está sempre conosco, em todos os momentos de nossas vidas, nos tempos bons e nos difíceis, e nas nossas provações e tribulações. Ela está sempre conosco, e não apenas os mexicanos, mas os latino-americanos também têm uma grande devoção a Nossa Senhora de Guadalupe.

Qual é a situação atual com relação aos direitos indígenas?

Pe. Meza: O governo está trabalhando para melhorar seus direitos e está dando passos para melhorar a situação dos indígenas. Em determinado momento, as pessoas perceberam que os indígenas existem e que eles têm seus próprios valores, costumes e tradições, e pedem que estes sejam respeitados. Os mexicanos esqueceram, durante muitos anos, de que tinham indígenas. Estes constituem 10% da população, então não estamos falando de um grupo pequeno. Percebemos agora que eles estão aí e que têm direitos. A Igreja, a sociedade em geral e o governo estão trabalhando juntos para ajudar os indígenas.

Continuam sendo os mais pobres?

Pe. Meza: Sim, infelizmente são, mas acho que eles têm muitas coisas para nos ensinar.

O que eles podem nos ensinar?

Pe. Meza: Um dos valores que aprendi deles é o serviço. No nosso sistema capitalista, servimos porque esperamos ser pagos. Na tradição indígena, servir é parte dos valores, servir sem esperar compensação e fazer isso de maneira espontânea. Isso não é vantajoso somente para os mexicanos, mas para o mundo inteiro.

Será que algum dia se eliminará a pobreza do México?

Pe. Meza: Do ponto de vista econômico, sempre haverá pobres, mas do ponto de vista cultural e espiritual, o México é um dos países mais ricos do mundo. Podemos dizer que somos ricos – o território foi evangelizado há mais de 500 anos – e somos ricos porque temos Cristo. Somos ricos porque temos Nossa Senhora de Guadalupe. Somos ricos porque temos uma grande devoção, em nossos corações, que influencia nossos pensamentos, valores e tradições. Nunca perderemos a esperança, porque nossa esperança é Cristo e Cristo nos ajudará a melhorar a situação.

* * *

Esta entrevista foi realizada por Mark Riedemann para “Deus chora na terra”, um programa rádio-televisivo semanal produzido por Catholic Radio and Television Network, (CRTN), em colaboração com a organização católica Ajuda à Igreja que Sofre.

Mais informação em www.aisbrasil.org.br, www.fundacao-ais.pt

Fonte:http://www.zenit.org/pt/articles/o-sofrimento-dos-imigrantes-inspirou-minha-vocacao-sacerdotal

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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