O Reino de Deus

No último domingo do Ano Litúrgico a Igreja Católica celebra a Festa de Cristo Rei.

Ele já reina enquanto espera o Dia em que entregará ao Pai todas as coisas e, então, “Deus será tudo em todos” (1Cor 15,28). São Paulo assim explicou: “Porque é necessário que ele reine, até que ponha todos os inimigos debaixo de seus pés. O último inimigo a derrotar será a morte, porque Deus sujeitou tudo debaixo dos seus pés. A morte foi tragada pela vitória (Is 25,8). Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão? (Os 13,14)” (1Cor 15,24-55).

Jesus disse que o Reino de Deus já está entre nós, mas disse a Pilatos que seu Reino “não é deste mundo”. Esta frase foi o motor da “Revolução cristã” no mundo desde que os Apóstolos começaram a espalhar o Evangelho. Com a certeza de que o Reino de Deus se estabelece definitivamente na eternidade, milhões de homens e mulheres desprenderam-se desta Terra, sem desprezá-la, e mergulharam no deserto, nos mosteiros, nas missões no mundo todo, enfrentaram todos os perigos, a morte, os martírios sem conta, ontem e hoje.

Mas hoje há uma tendência perigosa de se confundir o Reino de Deus com o reino dos homens, como se o bem estar geral fosse já a concretização do Reino de Deus. Muitos estão enganados nisso – especialmente os adeptos da teologia da libertação marxista – que sonham com o paraíso socialista na terra como se fosse o Reino dos Céus. Ledo e perigoso engano. É interessante notar que os artigos escritos por essas pessoas só destacam os “pecados sociais”, como se os demais não tivessem a menor importância. Parecem tolerar com incrível facilidade os pecados contra a moral sexual, por exemplo.

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A Igreja sempre chamou a atenção para este perigoso engano. O Papa João Paulo I, que teve um pontificado de apenas 33 dias, teve tempo de dizer que o “regnohominis não se confunde com o Regno Dei”. O Catecismo da Igreja nos previne: “Num trabalho de discernimento segundo o Espírito, devem os cristãos distinguir entre o crescimento do Reino de Deus e o progresso da cultura e da sociedade em que estão empenhados. Esta distinção não é separação. A vocação do homem para a vida eterna não suprime, antes reforça seu dever de acionar as energias e os meios recebidos do Criador para servir neste mundo à justiça e à paz” (§2820).

Há hoje muitos países onde o bem estar é geral, com a Bélgica, Alemanha, Holanda e outros, mas a maioria das pessoas não estão no Reino de Deus, nem sabem o que é isso; querem apenas o paraíso terrestre. Muitas de suas leis e costumes aprovam o que Deus proíbe: aborto, eutanásia, controle abusivo da natalidade, prostituição, pornografia, exploração sexual, casamentos gay até com adoção de crianças, famílias alternativas, inseminação artificial, manipulação de embriões, etc.. Nada disso está de acordo com o Reino de Deus.

O Reino de Deus não se opõe ao reino do homem, e a Igreja o estimula desde que respeite sua dignidade de filho de Deus e não contradiga a sã moral. O Catecismo da Igreja, a Norma da fé católica, como disse o Beato João Paulo II, não nos deixa cair na ilusão de que o Reino de Deus se realizará completamente neste mundo: “Já presente em sua Igreja, o Reino de Cristo ainda não está consumado “com poder e grande glória” (Lc 21, 17) pelo advento do Rei na terra… Por este motivo os cristãos oram, sobretudo na Eucaristia, para apressar a volta de Cristo, dizendo-lhe: “Vem, Senhor” (Ap 22,20)” (§671).

A Igreja sabe, como Cristo avisou, que ela passará por fortíssima provação antes da consumação do Reino de Deus. O Catecismo diz que: “Antes do advento de Cristo, a Igreja deve passar por uma provação final que abalará a fé de muitos crentes. A perseguição que acompanha a peregrinação dela na terra desvendará o “mistério de iniquidade” sob a forma de uma impostura religiosa que há de trazer aos homens uma solução aparente a seus problemas, à custa da apostasia da verdade” (§675).

O Catecismo deixa muito claro que o Reino de Deus não se estabelecerá na Terra de uma maneira triunfante, onde um paraíso terrestre se realizará, ao contrário: “Portanto, o Reino não se realizará por um triunfo histórico da Igreja segundo um progresso ascendente, mas por uma vitória de Deus sobre o desencadeamento último do mal, que fará sua Esposa descer do Céu. O triunfo de Deus sobre a revolta do mal assumirá a forma do Juízo Final depois do derradeiro abalo cósmico deste mundo que passa” (§677).

No Prefácio da Oração Eucarística da missa de Cristo Rei, a Igreja reza que o Reino de Deus é um Reino de Verdade e Vida, Santidade e Graça, Amor, Paz e Justiça. São sete ingredientes que não podem faltar na felicidade. Tudo isso vem de Deus e o homem sozinho não é capaz de produzir, por isso o Reino é de Deus. São Paulo diz que: “O Reino de Deus é justiça, paz e alegria no Espírito Santo” (Rm 14,17).

Jesus contou muitas parábolas para explicar este Reino que Ele veio inaugurar entre nós; e, sobretudo, colocou a Constituição deste Reino no Sermão da Montanha; não apenas nas oito Bem-aventuranças, mas em todos os capítulos 5, 6 e 7 de São Mateus.

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É importante notar que “o germe desse Reino é a Igreja”, como disse o Concílio Vaticano II. Sem ela não há e nem haverá Reino de Deus. As chaves do Reino foram entregues a Pedro e aos Apóstolos em comunhão com ele (Cat. §551-553). Jesus disse-lhes: “Disponho para vós o Reino, como meu Pai o dispôs para mim, a fim de que comais e bebais à minha mesa em meu Reino, e vos senteis em tronos para julgar as doze tribos de Israel” (Lc 22,29-30). O Catecismo da Igreja confirma: “Jesus confiou a Pedro uma autoridade específica: “Eu te darei as chaves do Reino dos Céus: o que ligares na terra será ligado nos Céus, e o que desligares na terra será desligado nos Céus” (Mt 16,19). O “poder das chaves” designa a autoridade para governar a casa de Deus, que é a Igreja. Jesus, “o Bom Pastor” (Jo 10,11), confirmou este encargo depois de sua Ressurreição: “Apascenta as minhas ovelhas” (Jo 21,15-17). O poder de “ligar e desligar” significa a autoridade para absolver os pecados, pronunciar juízos doutrinais e tomar decisões disciplinares na Igreja. Jesus confiou esta autoridade à Igreja pelo ministério dos apóstolos e particularmente de Pedro, o único ao qual confiou explicitamente as chaves do Reino” (§553).

O Reino de Deus tem um inimigo infernal, Satanás; mas o Catecismo diz que “o poder de Satanás não é infinito. Ele não passa de uma criatura, poderosa pelo fato de ser puro espírito, mas sempre criatura: não é capaz de impedir a edificação do Reino de Deus. Embora Satanás atue no mundo por ódio contra Deus e seu Reino em Jesus Cristo, e embora a sua ação cause graves danos – de natureza espiritual e, indiretamente, até de natureza física – para cada homem e para a sociedade, esta ação é permitida pela Divina Providência, que com vigor e doçura dirige a história do homem e do mundo” (§395).

Só um coração puro pode dizer com segurança: “Venha a nós o vosso Reino”. Então, como disse São Paulo: “Portanto, que o pecado não impere mais em vosso corpo mortal” (Rm 6,12). “Quem se conserva puro em suas ações, em seus pensamentos e em suas palavras pode dizer a Deus: “Venha o vosso Reino”” (§2819).

Prof. Felipe Aquino

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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