O que é educar? (Parte 1)

1208286_74630791O Papa João Paulo II disse que “o ato de educar é o prolongamento do ato de gerar”; isto é, fazem parte do mesmo ato.

“Gerar segundo a carne significa dar início a uma posterior ‘geração’, gradual e complexa, através do inteiro processo educativo” (CF, 16). Educar os filhos é a grande missão que Deus confiou aos pais. É por causa da importância dessa tarefa, que Deus ‘encheu de honra’ as pessoas dos pais.

O que é educar?

Os pensadores deram muitas respostas a esta importante pergunta. Gandhi dizia que “a verdadeira educação consiste em pôr a descoberto o melhor de uma pessoa.” Nisto é preciso a arte de educar, a mais difícil e mais bela de todas.

Certa vez Michelangelo viu um bloco de pedra e disse: “aí dentro há um anjo, vou coloca-lo para fora!” Depois de algum tempo, com o seu gênio de escultor, fez o belo trabalho. Então lhe perguntaram como tinha conseguido aquela proeza. Ele respondeu: “o anjo já estava aí, apenas tirei os excessos que estavam sobrando”. Educar é isto, é ir com paciência e perícia tirando os maus hábitos e descobrindo as virtudes, até que o ‘anjo’ apareça.

Michel Quoist dizia “que não é para si que os homens educam os seus filhos, mas para os outros e para Deus”.

Coelho Neto dizia que “educar é colaborar com Deus”, e que “é na educação dos filhos que se revelam as virtudes dos pais”. Também ensinava que a educação não pode ser feita pelo medo, já que “a educação pelo medo deforma a alma”.

O pensador inglês John Spalding, dizia que “a educação pelos outros lança as bases; a educação por si mesmo termina o edifício”. É preciso preparar os filhos para que entendam que a própria pessoa é a principal responsável por sua educação, e que, quem cultiva as suas qualidades sente a própria dignidade e valor da sua vida. Isto será mais importante ainda naqueles casos em que a pessoa tem problemas especiais de saúde, deficiência física, etc. As vezes é preciso chegar ao heroísmo para cultivar-se.

Sotelli afirmava que “educar é formar homens verdadeiramente livres”. Para Rousseau, “educar é a arte de formar homens”. Para Platão, “educar é dar à alma e ao corpo toda a perfeição de que são susceptíveis”.

De fato, educar é promover o crescimento e o amadurecimento da pessoa humana em todas as suas dimensões: material, intelectual, moral e religiosa. Por isso, educação não se aprende só na escola, mas principalmente em casa. Às vezes se ouve dizer: “ele é analfabeto, mas é muito educado”. Não adianta ser doutor e não saber tratar os outros; não cumprir com a palavra dada; não se comportar bem; trair a esposa e os filhos; não ser gentil; não ser afável, etc. Sem dúvida, a educação é a melhor herança que os pais devem deixar aos filhos; esta ninguém pode lhes roubar nem destruir.

A educação não é só para as crianças e jovens; é para todos; é uma tarefa que nunca termina na vida. Aliás, alguém disse que a vida é uma escola que nunca tem férias. Cada encontro novo, cada conversa boa, cada aula, cada fato novo, cada livro, acrescenta algo em nossa educação. Na vida, aprendemos com a experiência, nossa e dos outros. É muito mais sábio quem aprende com a experiência dos outros, sem ter que sofrer com os próprios erros.

Ramalho Ortigão afirmou que “o homem sem educação, por mais alto que o coloquem, permanece um subalterno”.

Educação não é “esperteza”, ter sucesso a qualquer custo, às vezes pisando e tapeando os outros. A triste filosofia do “levar vantagem em tudo”, se transformou em filosofia de vida para muitos.

Certa vez Andrew Carnegie disse que “muitos são instruídos, mas poucos são educados. Um homem educado é aquele que aprendeu a usar a sua mente de forma a conseguir tudo o que deseja sem violar os direitos dos outros.”
O grande pensador grego Aristóteles, dois séculos antes de Cristo, já dizia que “a educação é um ornamento na prosperidade e um refúgio na adversidade”.

O homem moderno está, sem dúvida cheio de ciência e de sofisticada tecnologia, mas pobre de sabedoria; e sem esta o mundo não pode ser feliz; eis a razão pela qual temos tanta dor. Somente homens sábios poderão dar ao mundo o que ele precisa.

O grande filósofo grego Sócrates, mesmo sem conhecer o cristianismo, já dizia que “só é útil o conhecimento que nos faz melhores”.

Todos esses conceitos emitidos sobre a educação nos ajudam a entendê-la melhor. O que importa é não deixar o filho sem ela; seria a sua ruína; e, como disse, certa vez Gautier, “de todas as ruínas do mundo, a ruína do homem é sem dúvida o espetáculo mais melancólico”.

A educação leva a pessoa a descobrir o mundo cada vez mais e a se alegrar com as maravilhas criadas por Deus. O Papa Paulo VI falava do “banquete da vida”. Só as pessoas educadas podem desfrutar saudavelmente deste banquete. Fernando Pessoa dizia sentir-se “nascido a cada momento para a eterna novidade do mundo”.

O documento de Medellin, do II CELAM, diz que: “A educação é efetivamente o meio-chave para libertar os povos de toda escravidão e faze-los subir de condições menos humanas a condições mais humanas”(4,8).

É através da educação que a pessoa vai se apropriando da herança da humanidade, aprende a ler as palavras e a realidade que a circunda, torna-se cidadão deste mundo e apto a dar a sua parcela na construção desta obra de Deus, para que o mundo seja um lugar agradável para viver, como irmãos. É pela educação que o homem deve aprender que o progresso não pode sacrificar a natureza (água, terra, ar, matas, rios, oceanos…), nem pode violar as leis da ética e da moral. Quando isto não acontece, o homem acaba temendo “aquilo que ele mesmo construiu com as suas mãos e com a sua inteligência”, como disse o Papa João Paulo II, na Redemptor Hominis (15).

Há um belo Salmo que diz:
Os que semeiam entre as lágrimas,
Recolherão com alegria.
Na ida, caminham chorando,
Os que levam a semente a esparzir.
Na volta virão com alegria,
Quando trouxerem os seus feixes. (Sl 125,5-6).

Assim será a vida dos pais e dos educadores; como um semear entre lágrimas, paciência, compreensão, carinho, perseverança, fé, bondade, alegria em ver a semente da virtude ser colocada na terra boa dos corações dos filhos.

Na volta virão com alegria, vendo com o passar dos anos a semente frutificar em boas obras e ações nos próprios filhos.

Nada se constrói neste mundo sem sacrifício e perseverança; muito menos um ser humano. Como ele é a obra mais bela de Deus neste mundo, conclui-se que a sua educação é a atividade mais importante deste planeta.

Ao falar da educação, na Carta às Famílias, o Papa João Paulo II, assim se expressou: “Em que consiste a educação ? Para responder a esta questão, há que recordar duas verdades fundamentais: a primeira é que o homem é chamado a viver na verdade e no amor; a segunda é que cada homem realiza-se através do dom sincero de si. Isto vale tanto para quem educa como para quem é educado… O educador é uma pessoa que “gera” no sentido espiritual. Nesta perspectiva, a educação pode ser considerada um verdadeiro e próprio apostolado” (CF, 16). É valioso relembrar aqui, que na celebração do matrimônio, os futuros pais prometem a Deus educar os filhos na fé: “Estais dispostos a receber amorosamente das mãos de Deus os filhos e a educa-los segundo a lei de Cristo e da Igreja?”

Sobre esta missão dos pais, diz o Papa: “Se os pais ao darem a vida, tomam parte na obra criadora de Deus, pela educação tornam-se participantes da sua pedagogia conjuntamente paterna e materna.”
“Os pais são os primeiros e principais educadores dos filhos e têm também neste campo uma competência fundamental: são educadores porque são pais.”
“Qualquer outro participante no processo educativo não pode operar senão em nome dos pais, com o seu consenso e, em certa medida, até mesmo por seu encargo.”

Falando de educação, não podemos deixar de dizer claramente uma grande verdade: Não é possível educar sem Deus e sem a Religião. A educação depende das normas morais, e estas vêm da Religião. Na hierarquia dos valores da pessoa humana, acima de todos está a vida espiritual, eterna , transcendente. Sem isto, a educação fica mutilada.

Por que o mundo de hoje se apresenta diante dos nossos olhos tão macabro? Por que tantos crimes? Por que tanta violência? Por que tanto estupro, que não se ouvia falar antes? Por que tanta droga? Por que tanto alcoolismo? Por que tanto assalto, homicídio, sequestro, corrupção, fraudes, suicídios, ‘trombadinhas’? A resposta é fácil: Porque a educação moderna, ateia, materialista, consumista, hedonista, tirou Deus do coração das crianças, dos jovens e dos adultos. O Criador foi expulso da terra! Eis, meus amigos, a dura realidade.

Enquanto este triste quadro não for revertido, enquanto Deus, o único e verdadeiro, não voltar ao coração das famílias e das escolas, como antes, não será possível acabar com todas essas mazelas que atormentam a nossa vida hoje. Sem isto não será suficiente encher as ruas de policiais e os códigos de leis. Enquanto o coração do homem não for transformado por Deus, nada mudará na sociedade.

Lamentavelmente, a educação de hoje deixou de lado os valores espirituais e adotou um sistema que apenas valoriza as capacidades pragmáticas, em vista da produção e do consumo imediatos.

Esta filosofia educacional passa por cima dos valores morais, eternos, que dão harmonia e equilíbrio ao homem. Desta forma o educando passa a ser apenas uma peça na gigantesca máquina de produção. Precisamos de uma nova educação, que dê privilégio ao homem e não à produção, ao consumo e ao prazer. E esta é uma guerra que passa por dentro de cada família. É aí, sobretudo, que está lançada a sorte da sociedade.

Pelo que foi dito acima, torna-se super importante a missão educadora e evangelizadora dos pais cristãos hoje. São Tomás de Aquino disse que “a missão dos pais é uma tarefa até certo ponto paralela ao sacerdócio dos padres” (Contra Gent. 4, 58).

A Educação dos Filhos

O capítulo 30 do Livro do Eclesiástico nos ensina profundamente sobre essa enorme responsabilidade de educar os filhos, sem o que eles não chegarão à maturidade humana. Começa dizendo: “Aquele que ama o seu filho, castiga-o com frequência, para que se alegre com isso mais tarde…” (Eclo 30,1).

Podemos traduzir o “castiga-o’ por ‘educa-o”, uma vez que o castigo só tem sentido se for para educar. Por causa do pecado original, todos nós temos uma natureza lesada, decaída, inclinada ao mal (concupiscência). A educação visa sobretudo recolocar o homem no caminho do bem e da virtude, do qual ele sempre tende a se desviar. É aos pais que cabe sobretudo dar início a esta tarefa na vida dos filhos. A Igreja nos ensina: Pela graça do Sacramento do matrimônio os pais receberam a responsabilidade e o privilégio de evangelizar os seus filhos. Por isso os iniciarão desde a tenra idade nos mistérios da fé, da qual são para os filhos os “primeiros arautos” (LG,11). Associa-los-ão desde a primeira infância à vida da Igreja. (CIC, 2225)

O Código de Direito Canônico da Igreja afirma que os pais participam do múnus [missão] de santificação ‘quando levam uma vida conjugal com espírito cristão e velando pela educação cristã dos filhos’ (Cân. 835, §4). A tarefa de educar, como dizia D. Bosco, “é obra do coração”, é obra do amor. Exige dedicação, renúncia, sacrifício, esquecer-se de si mesmo.

A Gaudium et Spes, do Vaticano II, ensina que: “Os filhos são o dom mais excelente do matrimônio e constituem um benefício máximo para os próprios pais” (GS 48, § 1).

O Catecismo da Igreja afirma que: “Os pais são os principais e primeiros educadores de seus filhos” (CIC, 1653; GE,3).

É por tudo isso que o Papa João Paulo II afirmou que a tarefa fundamental do Matrimônio e da família é “estar a serviço da vida’, e daí ser chamada de ‘santuário da vida” (FC, 28).

A Igreja não se cansa de repetir que a família deve ser a ‘igreja doméstica’, pois é no seio da família que ‘os pais são para os filhos, pela palavra e pelo exemplo…, os primeiros mestres da fé’ (LG 11; FC 21).

É no seio da família que o filho deve ser educado na fé e nos bons costumes.

Diz o Catecismo: “Em nossos dias num mundo que se tornou estranho e até hostil à fé, as famílias cristãs são de importância primordial, como lares de fé viva e irradiante” (CIC, 1656).

A Igreja é a “família de Deus” (Ef 2,19), e desde a sua origem ela teve o seu núcleo nas famílias que se tornavam cristãs. Quando se convertiam, os cristãos desejavam que toda a sua casa fosse salva. O anjo enviado ao centurião Cornélio, ao mandar chamar Pedro à sua casa, disse-lhe: “Ele te dirá as palavras pelas quais será salvo tu e toda a tua casa” (At 11,14).

“Senhores, que devo fazer para me salvar? Disseram-lhe [Paulo e Silas]: Crê no Senhor Jesus e serás salvo tu e tua família” (At 14,31).

O conhecido jornalista da Folha de São Paulo, Gilberto Dimenstein, quando residia nos Estados Unidos, escreveu em 21/09/97, um interessante artigo intitulado Solução Caseira é Melhor Remédio Contra o Vício, sobre a terrível questão das drogas. Diz ele: ”Para dar apenas um número da gravidade do problema: aqui (EUA) todos os anos 110 mil jovens experimentam heroína. Já são 600 mil viciados em heroína…”.

O jornalista afirma que as universidades americanas receberam dinheiro do governo federal para entrevistar 110 mil jovens e 18 mil pais. E conclui: “Das entrevistas sai, porém, a indicação de que o melhor remédio contra o vício está em casa. Os pesquisadores encontraram uma íntima relação entre o contato afetivo dos filhos com os pais e os distúrbios. Quanto maior a ligação emocional na família, menor a chance de envolvimento com drogas, bebidas, suicídio, sexo promíscuo e violência”.

Em seguida o jornalista afirma que as gangues procuram de certa forma oferecer aos jovens a família que não tiveram: “O charme das gangues é justamente oferecer um ambiente de aceitação e até hierarquia. Ou seja, uma família”.

Também a escola aparece com papel fundamental: “A investigação mostra que o envolvimento emocional com os professores também é um antídoto contra a delinquência”.

Em 21/06/98, o mesmo jornalista, no artigo Você sabe a data do seu nascimento?, sobre os meninos de rua, afirma:
“A culpa por estarem na rua é da pobreza, certo? Errado. A investigação ajuda a desfazer o mito de que só a pobreza gera crianças de rua e de que pobreza gera violência”.

É, na verdade, um preconceito. Apenas uma minoria saiu de casa para ganhar dinheiro, algo que tinha percebido (mas não colocado em números), desde o início de minhas pesquisas em 1989.

Quando indagada sobre porque saiu de casa, a imensa maioria se refere aos desentendimentos familiares muitas vezes abusos dos padrastos. Foram para a rua porque não suportavam o inferno doméstico, marcado pelo abuso sexual, alcoolismo, drogas e pancadarias… Ou seja, a motivação econômica estava bastante distante.

“Há toneladas de estudos mostrando que o inferno familiar ajuda a jogar os jovens em comportamentos autodestrutivos, o que significa drogas, tentativa de suicídio, violência.” (Folha de São Paulo, Cotidiano, 3-7, 21/06/98).

Se o jovem não tem um lar acolhedor, então, acaba indo buscar na rua o carinho e o amor que não encontrou na própria casa.

É necessário descer até as raízes do problema, que são os pais e a moral familiar destruída: divórcio, amor livre, uniões ilícitas, alcoolismo, drogas, etc. O Catecismo afirma que: “O lar é assim a primeira escola de vida cristã e uma escola de enriquecimento humano” (GS,52,§ 1). “É daí que se aprende a fadiga e a alegria do trabalho, o amor fraterno, o perdão generoso e mesmo reiterado, e sobretudo o culto divino pela oração e oferenda de sua vida” (CIC, 1657).

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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