O Islamismo – EB (Parte 2)

simbolo-islamismoO paraíso é concebido como jardins banhados por riachos; os homens terão “esposas purificadas” (Corão 2,25); todos gozarão de bens que satisfarão plenamente as suas necessidades corporais e espirituais. Todavia raramente serão chamados a ver a Deus, pois isto é uma graça toda especial.

O inferno consta de fogo ardente para sempre, devido aos incrédulos ou àqueles que tiverem colocado ídolos ao lado de Deus.

6) Embora o Corão afirme que “Deus dirige quem quer ser dirigido” (74,31), toda a  tradição muçulmana exalta tanto a vontade de Deus que disto se segue a predestinação ou um desígnio prévio de Deus; este predetermina o homem para o paraíso ou para o inferno. Diz o Corão: “Aquele que o quer , tome a via que leva ao Senhor; mas vós não o haveis de querer, se Deus não o quiser” (76,29s).

O Islã contemporâneo tende a incutir a liberdade do ser humano e a necessidade de se esforçar em prol da salvação. Mas, de outro lado, incita sempre a submeter-se  aos misteriosos decretos de Deus como o fez Abraão.

Existe, pois, uma questão aberta neste particular. Como afirmar simultaneamente a soberania absoluta de Deus e a liberdade do homem?

As cinco pilastras do culto

Segundo uma tradição, Maomé respondeu a um anjo que o visitava: “O Islamismo consiste em testemunhar que não há outro Deus além de Allah e que Maomé é o seu enviado, em recitar a oração ritual, em pagar o imposto ritual, em jejuar durante o mês de Ramadã e em peregrinar à Casa de Deus desde que isto seja possível”.

Examinemos cada qual destas “cinco pilastras”:

1) A profissão de fé (shahada) na unicidade de Deus (Allah) e na missão de Maomé resume o essencial do Credo; faz  de todo homem um verdadeiro muçulmano desde que proferida com os lábios e o coração; recomenda-se especialmente que os devotos a pronunciem nos últimos momentos com o dedo indicador voltado para os céus, a fim de confirmar a fé dos moribundos na hora decisiva.

2) A oração ritual (salat) há de ser recitada cinco vezes por dia: na aurora, ao meio-dia, no meio da tarde, ao pôr-do-sol e no começo da noite. Exige-se pureza do corpo e das vestes do orante assim como do local de oração; daí as várias abluções (de pés e mãos) que costumam os muçulmanos fazer antes de rezar.. A oração consta de fórmulas simples, acompanhadas de  gestos e prostrações. Na sexta-feira ao meio-dia, o rito é mais solene, pois se realiza na mesquita central do bairro da cidade, após uma homilia, a fim de testemunhar a unidade de “comunidade muçulmana”.

3) A esmola legal (zakat), destinada a purificar o uso dos bens deste mundo, consiste em transferir para a caixa comum um décimo dos proventos anuais de cada fiel; tal dinheiro destina-se aos pobres e necessitados (Corão 9,60). Nos modernos Estados muçulmanos, esta esmola se acha incluída no montante  dos impostos que cada cidadão deve pagar. É praticada espontaneamente, máxime no fim do mês de Ramadã e por ocasião das festas litúrgicas.

4) O jejum (sivam) do mês de Ramadã exige que todo fiel se abstenha de todo alimento, bebida e relacionamento sexual desde a aurora até o pôr-do-sol, para honrar a Deus, sentir fome, disciplinar o corpo e aprender a padecer com os infelizes. Durante a noite ocorrem a refeição, as festas, as orações e meditações suplementares, que fazem do mês de Ramadã um período de mais estrita observância religiosa.

5) A peregrinação (haji) a Meca  (Arábia) é prescrita uma vez na vida a todos aqueles que a possam efetuar. Os fiéis veneram a Caaba (Santuário que encerra a Pedra Negra), girando sete vezes em torno dela; recitam as orações prescritas; vão a Arafat, colina que dista 21 km de Meca, a fim de rezar em pé e invocar a Misericórdia Divina; voltam a Meca, passando por Muzdalifa e Mina, onde degolam uma ovelha em memória do que terá feito outrora Abraão naquele lugar… A peregrinação é sempre ocasião de afervoramento para quem a prática.

A peregrinação é efetuada no dia 10 do último mês do ano litúrgico muçulmano, ano de meses lunares (e, por isto, onze dias mais breve do que o solar).. A hegira (hijra = migração) é o ponto de partida desse calendário, cujas festas litúrgicas são móveis em relação ao calendário gregoriano, habitual no Ocidente.

5. Vida moral e familiar

O muçulmano, atento à vontade de Deus, procura cumprir tudo que a sua fé lhe impõe. Assim, por exemplo, deve abster-se de alimentos proibidos: carne de porco ou de animal não imolado ritualmente, sangue…, vinho, álcool.

No plano moral Maomé deixou nove preceitos:

“O meu Senhor me ordenou nove coisas: ser sincero na vida particular e em público, ser moderado na riqueza e na pobreza, justo na cólera e na satisfação, perdoar a quem me oprime, reatar as relações com quem as rompe comigo, dar a quem me priva de algo, fazer do meu silêncio uma meditação, dos meus discursos uma deificação, do meu olhar na consideração a fim de aprender dos acontecimentos e das coisas  que me caem sob os, olhos”.

Na vida de família, o Corão é tolerante em matéria de contracepção, mas rigoroso na rejeição do aborto. Permite ao homem ter até quatro mulheres por motivos legítimos (seja, justo para com elas dentro dos limites do possível; cf. Corão 4,3); ao marido é lícito despedir a esposa sem dar explicações a quem quer que seja (nem a um juiz). A mulher, em geral, ocupa posição  inferior no lar e na sociedade; os filhos são mais ligados ao pai do que à mãe.cpa_falsas_doutrinas

Vários códigos jurídicos muçulmanos têm procurado, nos últimos tempos, remediar a estes costumes, obtendo ora mais, ora menos êxito.

A espiritualidade do Islã

Existem dois tipos de vivência islâmica:

1) Há quem queira fazer prevalecer  os direitos de Deus na vida pública, recorrendo ao poder do Estado. Este então se torna tutor da prática religiosa, que pode  redundar em certo “legalismo” oficial frio e quase farisaico. Esta tendência a associar política e religião é assegurada por três Organizações internacionais do Islã: 1) o Congresso do Mundo  Muçulmano, fundado em 1926, com sede em Karachi (Paquistão); 2) A Liga do Mundo Muçulmano, criada em 1962, com sede em Meca, e estritamente ligada ao Governo da Arábia Saudita; 3) a Organização da  Conferência Islâmica, fundada em Rabat  (1969), com sede em Gedda, congregando 44 Estados.

Os países de população muçulmana em nossos dias adotam ora mais, ora menos rigidamente a união da religião e do estado. Todos os países árabes (com exceção do Líbano e da Síria) têm o Islã como religião do estado; existem que o chefe do Governo seja muçulmano e que as leis islâmicas sejam a fonte inspiradora da vida social. Embora o Islã não tenha clero, em todos os países maometanos existem os “homens da religião”, que fazem as vezes de um clero pago pelo Estado para tratar da observância da religião no respectivo país. Os cidadãos são identificados e tratados de acordo com a sua confissão religiosa – o que quer dizer que os cristãos e os judeus são considerados cidadãos especiais, que não podem ter acesso às funções governamentais.

2) Todavia há também um Islã místico, que se preocupa com o aprofundamento do mistério de Deus e tende a crescente amor do Criador. Não se  afasta do Corão, mas procura seguir as suas básicas inspirações religiosas. Alguns místicos muçulmanos chegaram até a certo monismo, professando a absorção e o desaparecimento do fiel em Deus. Entre os principais vultos da mística árabe, está Al-Ghazali (1059-111), que  fez escola dentro da ortodoxia, apregoando a ascese como via para chegar à união com Deus e à paz da alma.

O Islã e suas variedades hoje

Os muçulmanos continuam até hoje a  referir-se ao Corão e à  tradição profética; professam o mesmo Credo, realizam o mesmo culto…, mas apresentam variadas formas de existência.

A primeira grande divisão é a de Sunitas e Sciitas. Os primeiros seguem a Tradição (Sunna), como veio através dos primeiros califas (= sucessores do mensageiro de Deus). Os Sciitas, aos quais se acrescentam os harigitas, são um ramo tido como dissidente, porque segue o califa Ali (665-660), primo de Maomé, ao qual se opunha outro parente do profeta, chamado Muawija, Governador da Síria.

Os Sunitas representam 90% dos muçulmanos atuais, ao passo que os Sciitas e outros dissidentes 10%.

De modo geral, entre os maometanos encontra-se um amplo leque de atitudes perante  os desafios do mundo contemporâneo: há os que querem conciliar sua fé com os costumes da sociedade moderna no tocante aos direitos da mulher e dos  filhos e no tocante ao direito penal (o Corão estipula a lei do talião e outras punições drásticas). Há igualmente os Fundamentalistas ou “Irmãos muçulmanos”, que não aceitam outra Constituição  que não o Corão e querem retornar ao islã dos tempos de Maomé em Medina (têm sua expressão no Irã de Khomeyni e  no Líbano).

Além do mais, as culturas regionais imprimem  suas características aos muçulmanos, de modo que se distinguem os maometanos árabes dos não árabes (africanos, turcos, soviéticos, indianos, indonesianos…).

Conclusão

O Islã resulta de uma amálgama de Judaísmo, Cristianismo e antiga religião árabe; serviu a Maomé para unificar a população da península árabe e transmitir a seu povo a têmpera forte das conquistas políticas mediante a Guerra Santa (quem morre em guerra de conquista, tem assegurada a salvação eterna, segundo o Corão). Conserva traços das suas origens pré-cristãs como a prática da poligamia, que ofende a própria lei natural ou a instituição natural do matrimônio.

Apesar de julgarem os cristãos extravagantes e exagerados, os maometanos dedicam-lhes especial amizade, de acordo com os seguintes dizeres do Corão:

“Verás que aqueles que são mais vizinhos e amigos dos que crêem, são os que dizem: “Somos cristãos”. Entre estes, encontram-se sacerdotes e monges, que são pessoas que não se incham de orgulho” (Corão 5,82).

Possa o Espírito Santo agir no coração daqueles que se dizem filhos de Abraão, para que mais e mais cheguem ao conhecimento da verdade revelada!

Estevão Bettencourt – osb

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¹ Entre os cristãos, distinguem-se: católicos (910.600.000); protestantes (322.000.000); ortodoxos (173.000.000); anglicanos (51.600.000); autóctones (125.500.000). Estes são dados relativos ao ano de 1987, fornecidos pelo Conselho Mundial de Igrejas (organização protestante-ortodoxa).

² O animismo professa que todos os seres da natureza são dotados de vida e capazes de agir de acordo com uma finalidade.

¹ Esta alegação não se sustenta, pois a tradição dos manuscritos bíblicos do Antigo e do Novo Testamento é suficientemente rica e significativa para se poder acompanhar a história do texto sagrado e reconstituir o seu teor original sempre que surja alguma dúvida. Ver Curso Bíblico por Correspondência, 1ª. Etapa, Módulo 3, Caixa Postal 1362 – 20001 Rio (RJ).

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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