Desprender nosso coração da terra e voltá-lo para o céu; carregar valorosamente a cruz de cada dia e aceitar, com júbilo, os sacrifícios que se nos deparam no decorrer da existência são coisas penosas a que a natureza humana dificilmente se afaz.
Só o auxílio de uma coisa cuja força e amabilidade nos sejam atrativos contínuos e uma alegria que compense as agruras da vida é que nos poderão facilitar o cumprimento dessa rude tarefa.
Pois bem, esse tesouro, nós o temos: é o amor.
O amor é a inclinação da vontade para um bem que contenta o coração, satisfaz sua aspiração à felicidade e cuja posse lhe dá paz e alegria. Essa tranquilidade, esse contentamento, inseparáveis do amor, são os efeitos naturais que dimanam da posse do bem anelado e por isso, o amor tem a primazia sobre tudo o mais. Deus é amor; e entre os dons por ele outorgados ao homem, nenhum sobreleva e este.
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Mas para que o amor possa dar ventura duradoura e satisfazer a todas as faculdades, cumpre não somente que o bem, fonte de alegria e paz, constitua um ideal de verdade, de bondade e beleza, mas também que esse ideal exista realmente e não seja apenas uma possibilidade.
Além disso, importa que, de um lado, ele nos supre, a fim de elevar-nos acima de nós mesmos atraindo-nos para si; de outro, que se assemelhe a nós para que possamos compreendê-lo e dele nos achegar confiadamente. É preciso que seja imutável e eterno porquanto, se não nos sobrevivesse, seria inferior a nós. Finalmente, deve constituir o Bem infinito, incomensurável, para que lhe seja possível satisfazer plenamente os desejos eliminados de nosso coração.
Onde, porém; encontrar esse ideal neste mundo, em que tudo é finito e perecedouro? Cumpre, pois, subir ao céu para fazê-lo e lá descer (cf. Dt 30,12). Deus conhece nossa instante necessidade de amar e encontrar a ventura no amor. Foi ele que gravou essa aspiração em nossa alma e sua solicitude não se descurou e satisfazê-la. Existe Alguém que habita simultaneamente o Céu e a Terra e que, sendo, ao mesmo tempo, Deus e homem, reúne em si toda a formosura, toda a excelência da natureza humana e da divina. No Céu e na Terra, tudo vive da vida desse ideal, haurindo a alegria no reflexo de sua beleza.
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Nunca poderemos compreender toda a sua magnificência não bastando, para isso, a própria eternidade. Caia sobre nós um raio de sua glória e de sua formosura e isso basta para constituir a felicidade da vida inteira, para compensar a perda de todos os bens e consolar das maiores tribulações. É o antegozo da eterna bem aventurança.
Esse Alguém é Nosso Senhor Jesus Cristo, Deus infinitamente bendito nos séculos dos séculos. Alguns traços de sua adorável fisionomia, e uns tantos pormenores acerca de sua vida nos proporcionarão sobejos motivos de amá-lo, motivos suficientes para arraigar esse amor em nosso coração, aumentá-lo incessantemente e nos fazer encontrar nele a força que anima e ampara a vida.
Retirado do livro: “A Vida Espiritual Reduzida a Três Princípios”. R. P. Mauricio Meschler, S. J. Ed. Cléofas e Cultor de Livros.