O que significa a Incorrupção dos Corpos?

Transcrevemos a seguir um interessante artigo do padre Oscar González Quevedo (Fonte: Lista “Reflexões” – www.veritatis.com.br) sobre corpos de santos que não se corromperam após a morte.

No livro do Eclesiastes, se lê esta frase: “Lembra-te que és pó. E ao pó retornarás”. Além de lembrar ao homem sua condição perecível e transitória, esta sentença recorda a aniquilação física, a decomposição do organismo, após a morte. A realidade é constatada quase universalmente. Digo quase universalmente, por se darem exceções, embora raríssimas, de não decomposição física. Exceção esta conhecida pelo nome de Incorrupção. A Incorrupção é a preservação do corpo humano da deteriorização que comumente afeta todo organismo poucos dias após a morte. É evidente que são excluídas as mumificações, as saponificações e outros processos químicos de preservação dos corpos dos mortos; pois seriam incorrupções artificiais.

O primeiro documento de autenticidade indiscutível que relata uma Incorrupção, data do século IV e é redigido por Paulino, secretário de Santo Ambrósio, Bispo de Milão: este documento é redigido em forma de carta dirigida ao Bispo de Hipona, Santo Agostinho. Paulino descreve o descobrimento feito por Ambrósio: “Por este tempo, ele (Ambrósio) encontrou o corpo do mártir Nazário que se encontrava enterrado num jardim fora da cidade de Milão; recolheu o corpo e o transladou para a Basílica dos Apóstolos. No túmulo foi encontrada a cabeça que fora decepada pelos inimigos, em perfeito estado, como se tivesse apenas sido colocada junto ao corpo, do qual emanava sangue vivo e uma fragrância que superava todos os perfumes”. Tinham transcorrido 200 anos do martírio.

Mais preciso e mais digno de crédito é o relato de Eugippius acerca do corpo de São Severino, bispo de Noricum, morto em 482. Seis anos após sua morte, o corpo foi encontrado incorrupto.

Embora existam muitos outros casos a partir do século IV até o século XVI, interessam-nos mais as preservações a partir do século XVI, por possuirmos fontes históricas mais comprovadas e mais fidedignas.

Em 19 de outubro de 1634, falecia a Madre Inês de Jesus, priora de Langeac. Seu corpo, sem sofrer qualquer processo de extração de entranhas ou de embalsamento, foi sepultado na sala capitular, ao lado de outros membros da comunidade. Passados alguns anos, o Sr. Bispo, em vista do processo de Beatificação, ordenou que seus restos fossem exumados. O corpo foi encontrado sem sinal de decomposição. Transladações e verificações foram realizadas até o ano de 1770. Em 1698 e 1770, cientistas, cirurgiões e médicos declararam que humanamente, a preservação do corpo era inexplicável.

São Vicente de Paula faleceu em 1660, para atender aos pedidos de canonização a exumação do corpo foi feita em 1712, depois de mais de 50 anos de sua morte. Aberto o túmulo, na expressão de uma testemunha ocular “tudo estava como quando foi enterrado”.

Quantos puderam vê-lo, observaram que seu corpo estava em perfeitas condições e os médicos atestaram que o corpo não podia ter sido preservado por meio natural algum, durante tanto tempo.

A beata Maria Ana de Jesus, terciária da ordem de Nossa Senhora da Redenção, nascida em Madrid e falecida na mesma cidade em 1642; teve o corpo preservado da decomposição. Pouco depois de sua morte, o Cardeal Treso, Bispo de Málaga e presidente da Castela; que a conhecera pessoalmente em vida, no processo de beatificação, declara ter estado presente na primeira exumação e afirma: “Eu vi e me assombrei ao presenciar que o corpo morto há anos, sem que tivessem sido retiradas as vísceras ou embalsamado, pudesse estar tão perfeitamente conservado que nem sequer o abdômen e nem as faces oferecessem sinal de deteriorização, com exceção de uma mancha nos lábios, embora esta já a tivesse em vida”.

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5 milagres que a ciência tentou, mas nunca conseguiu explicar

Em 1731, tendo já transcorridos 107 anos da morte da Serva de Deus, teve lugar uma inspeção oficial e mais completa, por ordem das autoridades eclesiásticas interessadas na causa da Beatificação. Os restos mortais se apresentavam suaves, flexíveis e elásticos ao tacto. Esta investigação teve lugar em Madrid, tendo sido fácil reunir médicos e peritos. Nove professores de medicina e cirurgia tomaram parte nas investigações e depuseram como testemunhas. Foram feitas incisões na parte carnosa e no peito; foram estudados os orifícios naturais por onde poderiam Ter sido introduzidos preservativos contra a putrefação. Foi uma verdadeira dissecação.

Após completar as investigações, os médicos declararam: “Os órgãos internos, as vísceras e os tecidos carnosos, estavam todos eles intactos, sãos, úmidos e elásticos”.

Baseada nesse testemunho, a Congregação dos Ritos aceitou a preservação como fato milagroso, apesar de 35 anos mais tarde, antes que fosse publicado o decreto de beatificação, uma terceira inspeção revelasse que na oportunidade, o corpo já não era mais flexível e brando. Os tecidos tinham endurecido, mas não estavam decompostos.

Do relato aparece claramente que o corpo da Beata fora preservado da corrupção, não devido a um processo de saponificação ou de mumificação. Seria incrível que competentes cirurgiões, após as incisões e os exames das vísceras, descrevessem os tecidos como sãos e intactos se os mesmos se tivessem se convertido numa massa adipoeira. Além do mais, eles insistem que o corpo, cem anos depois da morte, estava elástico e perfeitamente flexível, enquanto que outros corpos enterrados na mesma cripta, tinham seguido a lei natural da decomposição.

Uma outra narração nos chama a atenção; é a do mártir jesuíta André Bobola, que tendo combatido com sua palavra, os cismáticos russos, tornando-se conhecido como o “apóstolo de Pinsk”, atraiu o ódio de seus adversários, os cossacos; e foi submetido a um cruel martírio. Em mãos dos cossacos, e recusando-se a aceitar o cisma russo, foi açoitado, ultrajado de uma maneira incrível. Foi praticamente esfolado vivo, cortada uma mão, enfiados estiletes de madeira por debaixo das unhas, arrancada sua língua, e sua fisionomia tão deformada que mal parecia homem. “Sangrava, afirmava uma testemunha, como um boi no matadouro”.

Após horas de tormento, saciados já os sanguinários e dando apenas sinais de vida, desferiram-lhe um golpe de espada na garganta. Após jogar o deformado cadáver numa esterqueira, retiraram-se os cossacos e os católicos recolheram os restos mutilados e os enterraram às pressas na cripta da Igreja dos Jesuítas, em Pinsk.

Quarenta e quatro anos mais tarde, o reitor do colégio dos jesuítas de Pinsk, por uma visão ou sonho que acreditou ser sobrenatural, fez uma investigação para encontrar o corpo do mártir. Foi encontrado, segundo todas as aparências, exatamente no mesmo estado em que fora depositado: com as mutilações, continuava integro e incorrupto; as articulações continuavam flexíveis; a carne, nas partes menos afetadas pelas mutilações era elástica e o sangue que cobria o cadáver parecia recém-coagulado.

O último exame ordenado pela Santa Sé, teve lugar em 1730 – setenta anos depois da morte. Seis eclesiásticos e cinco médicos mantiveram as declarações anteriores. Também eles declararam que o corpo, exceto as feridas causadas pelos assassinos, estava intacto; a carne conservava-se flexível e que sua preservação não poderia ser atribuída a uma causa natural.

Em 1835, a preservação do corpo foi aceita pela Congregação dos Ritos, como um dos milagres exigidos para a beatificação. Segundo testemunhas, nenhum corpo dos depositados na cripta onde se encontrava o corpo de André Bobola foi preservado.

Não se pode afirmar que tal fato pertença somente aos séculos passados; Santa Madalena Sogia Barat, fundadora da sociedade do Sagrado Coração, faleceu em 1865; vinte e oito anos mais tarde, seu corpo foi encontrado quase perfeitamente inteiro, embora o ataúde estivesse parcialmente podre e recoberto de mofo.

Imunidade idêntica foi outorgada a João batista Vianney, o célebre Cura De Ars que morreu em 1859 e foi beatificado em 1905. Idêntico privilégio coube à vidente de Lourdes, Bernardete Soubirous; faleceu em 1879 com a idade de 34 anos. Em 1909, passados 30 anos, o corpo foi exumado e uma testemunha afirma: “Não havia o menor indício de corrupção. Seu rosto aparecia levemente escurecido e os olhos um tanto afundados, parecendo estar dormindo”. O corpo foi novamente encerrado num ataúde juntamente com um informe do estado em que foi encontrado.

Poderíamos continuar a enumerar fatos, mas os já citados são suficiente para dar um ideia do fenômeno da Incorrupção e sua inexplicabilidade. Digo inexplicabilidade, porque, apesar de existirem outros tipos de incorrupção, não coincidem com a exposta.

Corrupção total do corpo e preservação integral de certos órgãos – Se a preservação total ou parcial da corrupção de alguns corpos é um assunto intrigante para a ciência e enigmático também para a Igreja, para a qual a simples constatação da incorrupção não é critério de santidade, e portanto, milagre evidente, muito mais intrigante e enigmática é a preservação de um determinado membro de um corpo que foi reduzido a pó. Será, logicamente, muito mais difícil para a ciência encontrar uma explicação para tal preservação e um caminho muito mais aberto e claro para a Igreja afirmar o fato como miraculoso.

Nenhum exemplo poderia ser mais sugestivo para discernir a Providência Divina do que a preservação parcial do coração de santa Brígida, da língua de Santo Antonio, de São João Nepomuceno e da beata Batista Varani.

Santa Brígida, da Suécia faleceu em 23 de julho de 1373. Seus restos mortais foram exumados; tudo estava reduzido a pó encontrando-se o coração incorrupto. A atitude da Igreja Católica mostrou-se sempre muito cautelosa perante fatos inusitados, inclusive perante a incorrupção dos corpos de pessoas santas. Num levantamento feito pelo competente e autorizado estudioso de Parapsicologia, Pe. Herbert Thurston, S.J, com 42 santos célebres por sua vida, obra e santidade, entre os quais muitos foram encontrados incorruptos depois de anos, assevera o mesmo autor que nenhum deles foi canonizado por ter sido preservado da corrupção.

Há aqueles que afirmam que a sobriedade na comida e na bebida, característica de todos os ascetas, podem modificar completamente as condições do metabolismo normal e tende a eliminar certa classe de micróbios que são mais ativos no processo de putrefação; poderíamos replicar que existem muitas pessoas pobres ou doentes ou por opção que são abstêmias, e uma vez mortas, a lei da decomposição as acompanha normalmente.

A experiência comum mostra que não concorrendo condições extremas excepcionais, por exemplo, um frio intenso, a decomposição chega, mais cedo ou mais tarde e que antes de passados 15 dias da morte, são visíveis os primeiros sinais. E o problema tornar-se-á ainda mais insolúvel para o cientista ao constatar que as incorrupções são verificadas em místicos e santos (em ambiente religioso).

Muitos segredos da natureza já foram desvendados, dado o contínuo progresso das diversas ciências. Há outros, entretanto, que são indecifráveis porque não só superam as forças e leis da natureza, como também, e isto é significativo, são característicos do catolicismo, e só dele.

Não consta historicamente, apesar de aprofundadas pesquisas na procura, que pessoas de outros credos e em qualquer outro tempo, tenham manifestado ausência de rigidez cadavérica.

No catolicismo, ela é exclusiva de pessoas que em vida, manifestaram uma santidade excepcional, mas não de todos os grandes santos, pois nenhum milagre tem regras fixas.

O primeiro caso de que temos notícias data de 1160 e a primeira pessoa em que foi verificado foi Rainerio de Pisa. Quem relata o fato é um contemporâneo e, ao que tudo indica, digno de crédito. “Seus membros não demonstravam depois da morte, nenhum sinal de rigidez. Pelo contrário, conservavam-se úmidos e molhados de suor e eram tão flexíveis como os de um homem vivo”.

Pouco mais de meio século depois (1226), ocorreu a morte de São Francisco e Assis. O novo superior da Ordem, o irmão Elias, num comunicado aos demais confrades, descreveu minuciosamente como durante os últimos dias, Francisco era incapaz de levantar a cabeça. Seus membros “estavam rígidos como os de um morto”. Mas depois de sua morte… os membros antes rígidos se tornaram flexíveis.

Pelo menos 50 casos bem estudados de ausência de rigidez cadavérica existem entre santos da Igreja católica, desde o século 12 até nossos dias.

Exemplos

Parece oportuno agora falar um pouco sobre o aspecto fisiológico da questão do “Rigor mortis”.

Thurston revisou os manuais clássicos ingleses, franceses, alemães, espanhóis e italianos sobre jurisprudência médica: “Não descobri nenhum que reconhecesse a possibilidade de alguém estar isento da rigidez cadavérica”.

Há alguma variação com respeito a hora do aparecimento e término da rigidez: pode variar algumas horas dependendo do clima e do continente. Para a Inglaterra, por exemplo, o Prof. Glaister declara:

“Ordinariamente a rigidez começa no pescoço, mandíbula e no rosto, cinco ou seis horas após a morte. Após dez horas, abrange toda a parte superior do corpo, e doze a dezoito horas após a morte, afetará todo o corpo”.

Segundo E. Harnack, médico alemão, na maioria dos casos, a rigidez chega a ser completa no prazo de 5 a 6 horas após a morte.

“Com toda a probabilidade, a rigidez terminará na maioria dos casos, transcorridas 36 horas”, dando origem à corrupção. Segundo os clássicos alemães, porém, a rigidez cadavérica dura habitualmente 72 horas.

O “rigor mortis” pode demorar em aparecer até 16 horas após a morte e permanecer até 21 dias, mas ambos são casos e circunstâncias raríssimas, como determinadas substâncias usadas na medicação. Nas doenças de consumpção, de curta ou prolongada duração, a rigidez pode começar imediatamente após a morte e desaparecer logo, iniciando-se imediatamente a putrefação.

O número de casos em que não se verificaram traços de rigidez cadavérica é grande para enumerar e discutir um por um. Cadáveres que destilam óleo – Surpreendente constatação:

Certos cadáveres, anos após a sepultura e até séculos depois, destilam um líquido semelhante ao óleo vegetal. Outros, em idênticas condições, sem causa que o justifique, emitem água. É relativamente comum que este líquido brote de qualquer incisão feita nos corpos preservados da corrupção.

Os católicos gregos, antes do cisma da Igreja oriental, tinham um nome especial para determinados e numerosos casos de cadáveres de santos: “movoblútai”, isto é, “destiladores de óleo”.

O Papa Bento XIV exige (e garante nestes casos) para afirmar a realidade do prodígio da água e do óleo, que tenham sido removidas todas as causas naturais, como a infiltração da água ou a possibilidade de ter sido colocado algum líquido. Os restos mortais devem ficar em lugar apropriado e completamente seco, excluindo-se qualquer possibilidade de intervenção humana.

Aqui nos defrontamos com um fenômeno de todo inusitado e inexplicável para o qual a ciência não pode encontrar nenhuma explicação razoável e satisfatória, apesar de tratar-se de casos fáceis de examinar e constatar qualquer vestígio de explicação, caso esta fosse possível. A evidência do fato é indiscutível.

A Parapsicologia não encontra sequer uma hipótese que possa dar uma pista ou tênue esperança de solução. A Parapsicologia no seu caminhar no estudo do maravilhoso, se defronta, uma vez mais, com o absoluto Senhor da Vida, que pode manifestar-se igualmente na morte, para testemunhar a Doutrina e santidade de seus santos.

Retirado do livro: “A Intercessão e o Culto dos Santos – Imagens e Relíquias”. Prof. Felipe Aquino. Ed. Cléofas.

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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