Igreja Católica Liberal

Pontos essenciais sobre a Igreja Católica Liberal:

Na Declaração de Princípios da Igreja Católica Liberal, cita-se a seguinte declaração de São Vicente de Lerins: “Afirmemos aquilo em que se tem acreditado em todas as partes, sempre e por todos, porque isso é verdadeiro e propriamente Católico”. E também outra de Santo Agostinho que diz: “A idêntica coisa que agora chamamos Religião Cristã, existiu entre os antigos e nunca faltou desde os começos da raça humana até à vinda de Cristo em carne, desde cujo momento a verdadeira religião que já existia, começou a chamar-se Fé Cristã”.

No decorrer da História do Cristianismo, encontramos duas tendências: (1) uma atitude mais estreita, limitada e ortodoxa, que sustenta somente certas crenças e doutrinas estreitamente definidas, derivadas geralmente das escrituras ou de opiniões de algum Padre da igreja ou teólogo particular. (2) uma tendência “Liberal”, mais aberta, disposta a aceitar o que concorde com o sentido comum e a intuição, incluindo os ensinamentos de outras religiões e filosofias.

A primeira atitude costuma vir acompanhada de intolerância, condenação e perseguição aos que pensam de forma diferente. Tem a tendência a converter-se em dogmatismo estreito e em uma interpretação literal e materialista que gradualmente impede toda a nova visão e iniciativa.

A segunda atitude é de tolerância e de apreciação de outros pontos de vista e com frequência tende a extrair de diversas fontes uma visão global que apela ao coração humano e à razão. Esta é a que podemos chamar de uma atitude “Liberal”. As vezes se inclina a ser sincretista, ou eclética, quer dizer, combinar diferentes doutrinas, atitude esta que é anatematizada pela mente dogmática que não pode aceitar senão uma só verdade ou revelação. Estas duas tendências são manifestações de qualidades inerentes à mente humana. Uma ensina, como diríamos, a nível terreno, para baixo, pois só percebe o que crê que é sólido e realidade na matéria e em todas as coisas terrenas. O outro ensinamento instintivamente indica para cima, até ao céu, percebendo uma visão ideal da unidade divina na diversidade de toda a criação.

A melhor e mais bela representação simbólica destas duas atitudes nos é dada pelo famoso quadro de Rafael, existente na biblioteca do Vaticano, que nos mostra em sua pintura, a Academia de Atenas. No centro do célebre quadro, aparecem Platão e Aristóteles, os dois grandes filósofos da antiguidade, um assinalando com o dedo para cima, e o outro para baixo. Nos gestos simbólicos desses Filósofos percebemos uma verdade que o grande artista quis revelar-nos: que estas qualidades são características dadas por Deus ao homem, ambas como partes iguais para sua missão divina na terra. Uma para explorar o mundo criado até suas últimas profundidades e a outra para alçar-se em contemplação e devoção até Deus nas alturas como meta final de sua peregrinação.

Em nossa Declaração de Princípios, encontramos a seguinte referência às escolas de pensamento com as quais a Igreja Católica liberal pretende ter afinidade: “Ao formular este corpo de doutrina e ética, a Igreja Católica Liberal assume uma posição que por certos aspectos é distinta entre as Igrejas da Cristandade. A Igreja Cristã sempre conteve dentro de si diferentes escolas de pensamentos. Os escolásticas medievais que sistematizaram a Teologia na Igreja do Ocidente, seguiam os métodos de Aristóteles. Porém, os primeiros Padres da Igreja, de tendências filosóficas, foram Platonistas. E a Igreja Católica Liberal, sem menosprezar a claridade e precisão dos sistemas escolásticos, tem muito em comum com as Escolas Platônica e Neo-Platônica de tradição Cristã”. É, pois, entre os representantes das Escolas Platônica e Neo-Platônica de tradição Cristã, que teremos que ir buscar a nossos precursores espirituais.

Vejamos então, alguns de seus ensinamentos: Clemente de Alexandra (150 a 215 D.C.) foi por algum tempo chefe da Escola Catequista de Alexandria. Ensinou uma síntese da filosofia grega e as doutrinas éticas da Cristandade. “O Caminho e a Verdade são portanto unos, porém, dele como a um rio permanente, afluem correntes de todas as direções”. Clemente falava muito da existência de mistérios na Cristandade e de uma tradição secreta ou Gnosis (conhecimento) transmitida desde os apóstolos. “A Tiago e a Pedro lhes foi entregue a Gnosis pelo Senhor, depois da ressurreição”.

Eles a entregaram ao resto dos Apóstolos e estes aos Setenta. “Os mistérios se transmitem misticamente e o que se diz, pode estar na boca do que fala, mas não em sua voz, mas sim no seu íntimo”. Cristo é o Mestre dos Mistérios Divinos e a Igreja ensina que os “Mistérios Menores” e a Gnosis, ou conhecimento interno, são o caminho para os “Mistérios Maiores”. Clemente foi contemporâneo das grandes escolas Gnósticas e tal os mais modernos Doutores Gnósticos, susteve que a Gnosis, (um conhecimento interno ou iluminação) era um elemento essencial para a perfeição do indivíduo. Todo Cristão deveria esforçar-se até esta meta. Seu ideal gnóstico Cristão é um dos mais nobres Ideais que se apresentam ao homem: “Vive uma vida de pureza, amor e beleza, como ensinou Cristo”.

Orígenes, (185 – 257 D.C.) sucedeu a Clemente como chefe da Escola de Alexandria. Foi considerado como o primeiro grande teólogo da Igreja. Ensinou doutrinas bem familiares para os Católicos Liberais. Orígenes foi mais conhecido por seus ensinamentos sobre a pré-existência. Pensava-se geralmente que ele não ensinava a reencarnação como se entende agora. Porém, as seguintes citações de seu “DE PRINCIPIS” parecem implicar que a ensinava, pelo menos em parte: “A alma não tem princípio nem fim… Toda a alma entra neste mundo fortalecida pelas vitórias ou debilitada pelas derrotas da vida anterior… seu trabalho neste mundo, determina seu comportamento no mundo que se há de seguir a este…”

Orígenes foi também um UNIVERSALISTA, quer dizer, acreditava que todos os homens serão “SALVOS”, porque são divinos em essência. “Todos, em sua devida hora e por sua própria vontade, regressarão a Deus; incluindo o diabo e os “Anjos Caídos”, regressarão finalmente salvos e então “Deus estará todo e em Todos”.

Giordano Bruno (1548 – 1600) foi um monge Dominicano que teve de fugir da Itália por suas opiniões ortodoxas, porém, finalmente foi aprisionado pela Inquisição e queimado vivo na fogueira em 1600. Aparece um grande lapso de tempo entre Orígenes e Bruno, porém isto não significa que durante esse tempo não houve homens e mulheres com ideais similares em certos aspectos, com que agora têm os membros da Igreja Católica Liberal. Bruno foi um defensor do sistema Copérnico, porém, também ensinou que a natureza vive e é divina. Deus é a onipenetrante da alma das coisas, o pequeno e o grande e por sua vez imanente e transcendente. “Sustento que o universo é infinito… Mundos infinitos existem ao lado de nossa Terra. Sustento, com Pitágoras, que a Terra é uma estrela como todas as demais… Que todos estes inumeráveis mundos são um conjunto no espaço infinito…”

Ao nos aproximarmos do Século XX encontramos que se usa a palavra “LIBERAL” para descrever certas opiniões e doutrinas que apareceram no século XIX entre católicos e protestantes. Tem-se definido esta palavra como “Sustentar opiniões liberais em política e teologia” como significando mente aberta, sem prejudicar ou se opor ao pensamento conservador, literal ou ortodoxo.

Neste sentido, tem havido e todavia há “Católicos Liberais” dentro do rebanho Católico Romano e “Protestantes Liberais” e “Evangélicos Liberais”, dentro das Igrejas Protestantes. Tudo quanto possa dizer-se que há em comum entre eles é uma tendência geral a favorecer a liberdade e o progresso. Com um sentido mais amplo, é que nossa Igreja adotou o nome de “Católica Liberal”, sendo um movimento de um tipo diferente ao “Catolicismo Liberal” que floresceu dentro da Igreja Romana no século XIX.

Durante o século XIX houve grupos liberais, principalmente entre os intelectuais, na Igreja Católica Romana na França, Itália, Alemanha e Inglaterra. Em cada país eram algo diferentes as suas opiniões e propósitos a miúdo mesclados com diferentes fins políticos. Todos estes grupos e tendências liberais foram condenados pelo Papa Pio IX na SYLLABUS ERRORUM de 1864. O “cemitério” para o movimento liberal na Igreja Católica Romana veio com o pronunciamento da INFABILIDADE do Papa no 1.º Concílio Vaticano em 1870.

Um movimento posterior de índole algo diferente e mais radical, o MODERNISMO, surgiu na virada do século e foi condenado pelo Papa em 1907. Mencionemos um grupo de teólogos Anglo-Católicos que sob a liderança do Bispo Charles Gore tratou de entrar em entendimentos com o pensamento moderno em princípios deste século. O Livro LUX MUNDI (LUZ DO MUNDO) de muitos autores, foi editado pelo Bispo Gore, que gostava de apelidar este movimento da Igreja Anglicana como “Catolicismo Liberal”. Ao repassar a história da Cristandade, vemos que os Católicos Liberais podem pretender e sentir pelo menos uma afinidade parcial com alguns Padres da Igreja, místicos, filósofos, letrados e também com movimentos que têm caracterizado a Religião Cristã através das idades, desde Platão até alguns dos grandes Instrutores Gnósticos, tais como Clemente de Alexandria, Orígenes e outros e até mesmo Santo Agostinho..

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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