Homilia do Cardeal Stanislaw Rylko no Congresso das Novas Comunidades

Queridos amigos, hoje, a Igreja faz memoria a dois apóstolos: Simão e Judas
Tadeu. No trecho do Evangelho (Lucas 6,12-19), São Lucas nos lembra o momento
exato do chamado dos apóstolos. Foi um dos momentos decisivos da Igreja
nascente. Jesus foi ao monte rezar; quando amanheceu, chamou seus discípulos e
escolheu doze daqueles, aos quais deu o nome de apóstolos.

Na primeira leitura (Efésios 2,19-22), São Paulo nos introduz no coração do
mistério da Igreja, que é mistério de comunhão missionária. Ele escreve:
“Irmãos, vocês não são mais estrangeiros nem hóspedes, mas são concidadão dos
santos, família de Deus, edificados sobre os fundamentos dos apóstolos e dos
profetas, tendo como pedra angular, o próprio Jesus Cristo.

Querido irmãos e irmãs, essa é a nossa mais profunda identidade. Somos
concidadãos dos santos, somos familiares de Deus, fomos edificados sobre o
fundamento dos apóstolos, a fé deles e o testemunhos deles até a efusão do
sangue. Cristo é a pedra angular deste fundamento. Cristo, pedra angular,
portanto, o cento da vida da Igreja e da sua missão. Cristo é o centro da vida
do cristão.

Paulo nos explica este mistério quando, dirigindo-se aos Efésios, escreve: “Em
Cristo, toda construção, ou seja, Igreja, cresce bem ordenada para ser templo
santo no Senhor. Em Cristo, também vós sois edificados juntos para se tornar
habitação de Deus por meio do espírito. Se acrescenta, assim, outro elemento da
nossa identidade mais profunda: templo santo do Senhor, habitação de Deus por
meio do Espírito Santo. É por isso que, como nos recorda o Santo Padre Bento
XVI, o início do ser cristão não é uma decisão ou uma grande ideia, mas um
encontro, um acontecimento com uma pessoa que dá à vida um novo horizonte, e
com isso a direção decisiva.

Vocês que estão aqui presentes, que são membros das várias comunidades e
movimentos carismáticos católicos espalhados pelo mundo, entendem muito bem o
que quer dizer encontrar Cristo verdadeiramente, abrir diante dEle todas as
portas, até mesmo as mais profundas, que normalmente, diante dos outros, não se
abrem. Mas para Ele sim.

No relato do Evangelho de Lucas, a eleição dos apóstolos segue ao encontro de
Jesus como uma multidão de gente que O procura. Escreve o evangelista que havia
uma grande multidão que veio para escutá-lo e para ser curada de suas doenças.
Toda multidão queria tocá-Lo, porque dEle saia uma força que curava a todos.
Isso quer dizer encontrar Cristo, tocá-Lo. Quantas maneiras existem em nossa
vida de tocar Cristo, tocar em
sua Palavra, tocar no tempo passado diante do Santíssimo
Sacramento, do silêncio, e deixar-se tocar por Ele; isso é ainda mais
fundamental. E quando Ele nos toca, nos muda profundamente. Aqui está o
mistério da conversão.

Hoje de manhã, nós dissemos que na vida, cada pessoa que pertence a uma
comunidade, pertence a uma nova comunidade, sempre tem um antes e um depois.
“Antes eu era assim, mas o Senhor me tocou e me mudou; abriu o mundo diante dos
meus olhos.” Toda multidão buscava tocá-lo.

Cristo coloca os apóstolos diante de uma multidão necessitada; eles tinham fome
da Palavra, queriam escutá-Lo. As pessoas necessitadas de serem curadas do
corpo, mas, ainda mais, tocadas no espírito. A esta gente os apóstolos foram
enviados. A missão deles é anunciar uma palavra que cura e salva. Como naquela
época, também hoje permanece mais do que antes, que espera, aguarda pela
salvação. Por causa de uma secularização galopante, até mesmo os países de
antiga tradição cristã hoje estão se tornando verdadeiros países de missão, ou
seja, países de primeiro anúncio.

Nos estamos falando da nova evangelização, mas, hoje, na nossa velha Europa, há
tantos ambientes nos quais Cristo precisa ser anunciado pela primeira vez. Isso
pode parecer inacreditável, mas nenhum cristão pode negar essa tarefa, esse
dever. Deve exclamar junto com Paulo: “Ai de mim se eu não anunciar o
Evangelho”. O próprio neste contexto se insere de maneira organizada o discurso
desses movimentos eclesiais e das novas comunidades. O servo de Deus, João
Paulo II, via nelas um novo espírito, um sinal de esperança para a Igreja e
para a humanidade inteira. O sinal de uma nova primavera cristã, de uma nova
época missionária da Igreja. Em continuidade, o seu sucessor, Bento XVI,
explica que os movimentos constituem uma constante na vida da Igreja, e são uma
resposta tempestiva que o Espírito Santo diante das atuais desafios da missão
evangelizadora da Igreja. Não são frutos de projetos humanos. Com certeza não
são! Mas um dom que vem do alto. Assim como diz o Santo Padre, as permanentes
irrupções na vida da Igreja.

O que são mais precisamente os movimentos eclesiais? Gerados pelos respectivos
carismas, são, antes de tudo, lugares de encontro pessoal com Cristo, que muda
a vida das pessoas. Lugar onde não só se fala de Cristo, mas onde se pode ver e
tocá-Lo, experimentar a força que sai dEle e cura a todos. Os movimentos
eclesiais e as novas comunidades são verdadeiros laboratórios da fé; espaços
onde as pessoas são preparadas para uma fé adulta, uma fé viva, uma fé plena de
alegria, como vocês estão demostrando, nessa Eucaristia, mediante o canto de vocês.
Quantas mudanças de vida, quantas conversões de homens, mulheres, adultos,
jovens! Quantas descobertas essenciais e decisivas para a vida! A descoberta da
beleza de ser discípulo de Cristo, a descoberta da fé cristã como projeto
positivo e fascinante. Por isso vale a pena entregarmos a nossa vida à
descoberta de que vale a pena ser cristão.

Em nossa época, onde somos expectadores de um Cristianismo cansado e
desanimado, o Espírito Santo nos surpreende novamente nesses focos de fé e
alegria, cheio de entusiasmo. Os movimentos eclesiais e as novas comunidades
também são lugares de liderar tantos leigos, homens e mulheres de nosso tempo,
com extraordinário deslanche missionário de um Cristianismo fechado em si
mesmo, medroso diante do mundo. Esses respondem com maravilhosa coragem, com
uma grande criatividade missionária, sem medo de anunciar Cristo e aqueles que
buscam caminhos novos para levar o Evangelho aos meios de comunicação, da
cultura, da economia, da política. Estamos vendo aqui essas câmeras que estão
transmitindo, ao vivo, o nosso encontro, a nossa Eucaristia, para um outro
continente, para o Brasil, através da internet em todo o mundo. Esse é o
exemplo da criatividade missionária das novas comunidades, que tornam a Palavra
de Deus presente na mídia, que hoje é poderosa. Portanto, como não agradecer o
Espírito Santo por esses dons preciosos. Cada dom para nós pastores se traduz
também numa tarefa de grande responsabilidade; é preciso acolhê-lo,
acompanhá-lo pastoralmente, respeitando cada carisma específico.

O Papa Bento XVI, por várias vezes, solicitou aos pastores que sigam ao
encontro dos movimentos com muito amor. E último pensamento, ligado ao lugar
onde estamos – Assis -, o discurso sobre esses movimentos adquire um
significado especial na cidade de São Francisco. Por isso somos muito gratos ao
arcebispo de Assis pela sua presença, porque vemos o papel do caminho de São
Francisco, que realizou naquele tempo. Ele poderia ter fechado tudo, mas soube
ler este sinal, esta linguagem do Espírito Santo que falava através de
Francisco. Assim, na Igreja entrou uma nova primavera, uma nova força do
Espírito Santo. Por que em Assim? O discurso sobre os movimentos se tona mais
significativo em outro lugar? Segundo o Santo Padre, Bento XVI, o franciscanismo
e sua primeira fase representa um paradigma perfeito naquilo que quer dizer o
movimento eclesial. Olhando para o franciscanismo em sua primeira fase, podemos
entender melhor o que quer dizer também hoje o movimento eclesial, uma nova
comunidade.

Nos tempos de São Francisco, a Igreja atravessava uma crise profunda, e
precisava renovar-se carismaticamente por dentro, como escreve o Papa.
Precisava reavivar a chama da fé, não somente as capacidades e estratégias
administrativas e políticas. O Papa Inocêncio III entendeu rapidamente esse
importante sinal de Francisco, intuiu que se tratava de uma força carismática
inovação. A história do franciscanismo se manisfesta de maneira quase palpável
entre carisma e instituição na Igreja. O Papa Bento XVI escreve a propósito:
Francisco poderia até mesmo ir até o Papa, muitos grupos e movimentos
religiosos estavam se formando naquela época, e muitos deles se colocavam
contra a Igreja enquanto instituição. Mas São Francisco pensou rapidamente em
colocar o seu caminho e de seus companheiros nas mãos do bispo de Roma, o
sucessor de Pedro. E disse o Papa: este fato revela o seu autêntico espírito
eclesial. O Papa reconheceu isso e apreciou.

É preciso pensar que Francisco não pensava em fundar uma ordem, para ele
bastava o monarquismo que já existia. Nessa situação em que o cristão se
encontrava pesado, fraco, completamente sufocado, Francisco queria simplesmente
anunciar o Evangelho e reunir o povo. De tudo isso, surgiu, quase contra sua
vontade, esse movimento, que, enfim, assumiu. Também neste caso, contra sua
vontade, a confirmação jurídica da ordem.

Queridos amigos, Francisco queria simplesmente escolheu o Evangelho como uma
regra de vida. Ele não queria fazer mais do que anunciar o Evangelho. Quando
vocês se lembram da origem da comunidade de vocês, não foi também deste jeito?
Quando se pergunta ao fundadores dos vários movimentos e das várias
comunidades, se desde o início queriam criar um movimento, todos negam. Eles
simplesmente queriam viver e anunciar o Evangelho, nada mais do que isso.

Escreve o Papa: “Hoje, a Igreja continua a esperar que lá, onde tende a
afogar-se, a cair na rotina, onde possa naufragar, ali, o Espírito Santo faça
germinar de dentro um novo início que ninguém tenha planejado, mas favorecido
por homens que iluminados pela graça, façam frutificar o Evangelho. Francisco
foi um destes.

Deixemos-nos todos entrar profundamente neste espírito de Assis. Nesta cidade,
onde cada pedra recorda o pobrezinho, é com certeza mais fácil sintonizarmos
com aquilo que o Espírito Santo diz à Igreja dos nosso tempos: diante desses
novos dons carismáticos, somente o Espírito Santo nos permite entender
plenamente a vocação e a missão dos movimentos eclesiais e das novas
comunidades hoje. Nesta Eucaristia, rezemos, portanto, para que São Francisco
nos ensine a amar e servir a Igreja como ele sempre a amou e serviu. Amém.
Assis –
28.10.10

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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