Homeopatia: Ciência ou superstição? (Parte 3)

5.3. A posição soviética

Em carta oficial, o
ministério da Saúde da URSS declarou:

“A homeopatia baseia-se
numa representação idealista e não em fundamentos científicos. Ao longo de seus
cento e cinqüenta anos de existência, ela não foi enriquecida por qualquer dado
científico e utiliza fundamentalmente os princípios, os métodos e os
procedimentos de cura estabelecidos desde o seu aparecimento. O arsenal dos
meios utilizados pelos homeopatas permanece inalterado.

A medicina científica,
fundamentada na compreensão materialista da morbidade e da cura como processo
complexo e multiforme da correlação do organismo com seu meio ambiente, atingiu
resultados extremamente satisfatórios na prevenção, detecção precoce e cura de
inúmeras doenças, até então endêmicas. Os antibióticos, as preparações
bacteriológicas, as vacinas e os soros disponíveis, após experimentação precisa
e pesquisas científicas cuidadosas, permitiram o sucesso obtido pelas
organizações de saúde na erradicação da varíola, da poliomielite, e no
retrocesso brutal de outras doenças infecciosas.

Em nosso país, entre mais de
meio milhão de médicos, os métodos e meios homeopáticos só são aplicados por
grupos insignificantes. Isto testemunha que a grande maioria dos médicos não
acredita e não participa nesses meios. E mesmo os que participam, fazem-no em
conjunto com a medicina científica, o que retira da homeopatia seu caráter de
independência” (Aulas em Landmann pg 63).

VI. Casos de experiências

Estas experiências não
conseguem ser concludentes para diferenciar a eficácia dos medicamentos
homeopáticos em relação aos placebos.

Em Praga, 1828, o Dr.
Marenzelle foi encarregado de tratar pacientes no Hospital Militar de Viena
através da homeopatia. Supervisionado por médicos alopatas, ele cuidou de 43
pacientes sem que nada pudesse ser verificado contra ou a favor da homeopatia.
(Landmann pg 109).

Na França, no Hospital
L’Hotel Dieu em Paris, o Prof. Armand Trousseau deu a um grupo de pacientes
remédios homeopáticos, e a outro grupo, placebo de miolo de pão. Muitos doentes
reagiram favoravelmente ao placebo, o que indicou que a homeopatia poderia agir
por sugestão:

“Dessa primeira parte
de nossas experiências é permitido concluir que as substâncias mais inertes,
tais como o amido, administradas homeopaticamente, agem sobre a imaginação dos
doentes produzindo efeitos idênticos aos dos medicamentos homeopáticos mais
possantes” (Trousseau em Landmann pg 109).

Em 1914, o Dr. Chadwell experimentou
a homeopatia contra a escarlatina. Numa epidemia, um em cada dois doentes
recebeu beladona homeopatizada. Os resultados foram decepcionantes.

Alguns anos mais tarde, o
Dr. Wesselhoeft também quis tentar o método homeopático no Hospital Infantil de
Boston. Suas observações não mostraram diferença entre as crianças tratadas com
beladona e as outras. O mesmo Wesselhoeft realizou um teste análogo para o
combate da coqueluche. O resultado também foi decepcionante (Aulas em Landmann
pg 110).

Em 1938, os Drs. Bayer e
Schilsky, numa clínica infantil de Hamburgo, também tentaram usar o método
homeopático contra a coqueluche. Em 170 crianças, uma em cada duas era tratada
por homeopatia. Os resultados foram nulos. (ibid pg 110).

Extensa pesquisa foi
realizada na Alemanha nazista, acompanhada pelo Dr. Fritz Donner, antigo
homeopata que foi escolhido para supervisionar as pesquisas no Reich. O Dr.
Donner, após dois anos de pesquisa, chegou a conclusão da inocuidade total do
método homeopático. Seus relatórios foram, porém, censurados e não puderam ser
publicados a não ser muitos anos após a queda do nazismo. E assim mesmo, em
publicação francesa, porque nenhuma revista homeopática alemã aceitou o
trabalho. (Donner em Landmann pg 110).

Foram realizadas
experiências em 10 pacientes com hipertensão arterial, durante 16 semanas,
alternando tratamento alopático, homeopático e placebo. Os remédios
homeopáticos eram prescritos por médicos homeopatas.

A análise dos resultados
mostrou que só houve diminuição significativa da pressão arterial nos casos
tratados com remédios alopáticos. No que se refere à melhora sintomática, os
resultados foram idênticos com o uso de homeopatia, alopatia ou placebo. (Aulas
em Landmann pg 110).

Foram realizadas
experiências em pacientes com artrite, utilizando placebo, medicação
homeopática e alopatia. Todos os resultados foram inconcludentes (ibid pg 111).

Alguns ensaios sobre o ópio
C15 e iperita C30 sobre o trânsito intestinal e feridas de gás mostarda,
respectivamente, são apontados como resultados de melhoras reais decorrentes da
homeopatia. Porém, estes dados são considerados insuficientes perante o número
de experiências realizadas, e pelo seu caráter isolado e sem metodologia.
(Aulas em landmann pg 111).

VII. Considerações

7.1. Identificação de
doutrina com o nazismo

Em 8 de agosto de 1937, no
Congresso Internacional da Sociedade de Homeopatia em Berlim, Hudolph Hess
criticou os que se opunham à homeopatia, falando que o Reich tomava para si a
proteção deste congresso. Em contraste com a posição de todos os outros
governos.

Assim, a homeopatia cresceu
consideravelmente na Alemanha de Hitler. O Dr. Fritz Donner, antigo homeopata,
foi escolhido para supervisionar as pesquisas no Reich. Após dois anos de
trabalho, chegou à conclusão da inocuidade total do método homeopático.
Escreveu um extenso relatório às autoridades superiores, mas suas conclusões
não foram levadas em conta e a publicação de seus trabalhos foi proibida (Rouzé
em Landmann pg 66).

7.2. Ligação entre a
Homeopatia e o Swedenborguismo

Emanuel Swedenborg
(1688-1772) foi discípulo de Jacob Boehme, astrólogo, gnóstico e precursor do
espiritismo.

Na América do Norte do séc.
XIX, o swedemborguismo encontrou na homeopatia um sistema médico que a
completava. A homeopatia encontrou no Swedemborguismo uma moldura religiosa
para expandir suas idéias. Os grandes homeopatas americanos do século passado,
como Hans Gram e Hering eram adeptos de Swedemborg e a indústria farmacêutica
homeopática e a imprensa homeopática pertenciam a adeptos da seita (Campbell).

Swedemborg acreditava que a
natureza essencial do homem era determinada por um impulso espiritual básico,
cuja alteração era a causa das doenças. O imaterial determinava o material por
uma relação mística.

7.3. Misticismo da
homeopatia Kentiana

James Tyler Kent (1849 –
1916) foi um importante homeopata americano.

Ele cria na origem moral das
doenças, o que vai de encontro com as teorias espíritas das doenças,
influenciando a sintomatologia homeopática atual. Pela sua concepção metafísica
das origens das doenças, fica clara sua postura em relação às dinamizações: ele
recomendava altíssimas diluições, até a diluição C 1000).

Cria também que a homeopatia
era a única verdade em
medicina. Era ímpio questionar a homeopatia, pois era uma
ciência inspirada por Deus. As doenças seriam resultado da transgressão da
ordem divina. No fundo, dizia que as doenças crônicas eram conseqüências do
Pecado original (Kent, Lição XVIII) (Landmann pg 89).

Assim, teremos na
sintomatologia características psicológicas, como podemos ver em alguns trechos
do Guia Homeopático de Matéria Médica Clínica, do Dr. Nilo Cairo:

Nux Vomica

“… Moreno, cabelos
pretos, magro, colérico, irritável, impaciente, teimoso, nervoso, melancólico,
de hábitos sedentários e preocupações de espírito: tal é o doente de Nux Vômica.
Homens de negócio…” (Cairo pg 487).

Pulsatila Nigricans

“… Constituição e
tipo: É um remédio mais adaptado às constituições femininas, apesar de ser
indicado também para homens. É indicado para mulheres louras, claras e de olhos
azuis. O caráter das pacientes é dócil, silencioso e submisso. É uma paciente
triste e sem coragem, que chora por um nada e a propósito de tudo. Procura o
consolo das pessoas que a ouvem…”(Cairo pg 537).

7.4. Condenações à medicina
moderna

Uma condenação bastante
irracional por parte dos homeopatas é a respeito das vacinas. Eles acusam as
vacinas de alterarem a “energia vital” a ponto de poderem causar
tumores:

“… Acabamos de dizer
que as doenças infecciosas são válvulas de escape que permitem que não se
agrave um desequilíbrio já existente. O que aconteceria se para toda doença
infecciosa já tivesse sido encontrada uma vacina? O organismo precisaria de
outras válvulas de escape, novas doenças surgiriam, porém desta vez mais
graves, como são as doenças degenerativas ou as hipertrofias (tumores)”
(Barollo pg 124).

Outro ponto já citado é o de
acusar os remédios alopáticos de até inviabilizar a cura das doenças.

Os homeopatas são contra a
adição de flúor na água por causa de sua doutrina “energética”,
prática tão utilizada:

“A Homeopatia não pode
concordar com a imposição a toda uma população, de tomar água com flúor ou
outro medicamento qualquer.”

Igualmente existiu uma
oposição à utilização de restaurações dentárias feitas de amálgama de prata,
pois alegavam que a amálgama interferia com o tratamento homeopático. (ibid pg
125).

7.5. Ligação da homeopatia
com o espiritismo no Brasil

Como já foi dito, há uma
forte coerência doutrinária entre o espiritismo e a homeopatia. Isto é
observado pela ligação entre homeopatas e espíritas no Brasil, como podemos ver
nas citações dos anais do XII Congresso Brasileiro de Homeopatia de 1972:

“… Por outro lado, o
crescente interesse da população pela Homeopatia tem como principal fonte
(maioria absoluta) o desenvolvimento muito grande que se vem observando do
movimento religioso de instituições ligadas ao Espiritismo, Umbandismo, etc.
(religiões mediúnicas), nas quais, por crenças que não nos compete analisar no
presente trabalho, são receitados complexos e medicamentos homeopáticos por
leigos”.

“… A homeopatia
reparte-se assim em: uma medicina dos pobres (instituições caritativas
espíritas), exercida por leigos que administram complexos, e, de outro lado,
uma terapêutica, de consultórios particulares…” (Lafetá pg 254).

VIII. Conclusão

A homeopatia possui total
coerência com a doutrina de Paracelso, Van Helmont e Stahl, que são doutrinas
herméticas, mágicas e gnósticas.

O método homeopático das
diluições infinitesimais e a própria doutrina homeopática da origem das doenças
mostra uma concepção imaterial das doenças e dos remédios. Nesta doutrina é
negada a causa material das doenças e a lógica de causa-efeito. Isto mostra o
total afastamento da homeopatia com a ciência.

O método das dinamizações só
pode ser coerente com uma doutrina esotérica, a qual afirma existirem
“energias vitais” imateriais aprisionadas em todos os seres materiais
(orgânicos e minerais).

A teoria das doenças
crônicas, tão bem explorada por Kent, não pode deixar de ser vista como uma fuga
de Hahnemann ao fracasso de sua doutrina. Uma conotação espiritualista desta
teoria tentou fazê-la menos artificial ao esquema homeopático.

O principal argumento de
Hahnemann para a teoria do similia similibus curantur, o caso da quinina para o
tratamento da febre, é comprovadamente falso, sendo o mecanismo de ação da
quinina o oposto ao pregado pela homeopatia.

As experiências feitas para
provar a eficácia do método homeopático não conseguem fazer uma diferenciação
palpável entre o medicamento homeopático e o placebo.

As ligações da Homeopatia
com a seita de Swedenborg (USA), com as seitas mediúnicas e com o nazismo
mostram a afinidade da homeopatia com o romantismo/ misticismo.

“Hahnemann, esta rara
combinação de filosofia e sabedoria, cujo sistema deverá eventualmente provocar
ruína das mentes comuns abarrotadas de receitas, mas que ainda é muito pouco
aceito pelos clínicos, e muito mais evitado que investigado” (Goethe,
Zerstr Blatter, vol II)

Por fim, podemos fazer uma
consideração a respeito da tentativa de propor ao mundo duas correntes de
pensamento, uma racionalista e outra mística esotérica. Portanto, encontraremos
as seguintes relações:

 A Homeopatia é, em suma, uma
concepção esotérica espiritualista do mundo, aplicada à arte de curar.***

IX. REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS

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diplome d’homeopathie par les Facultés de Medicine. Bull. Acad. Nat. Med. Paris
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LANDMANN, J “As
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PESET, J.L. “Terapéutica
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ROUZÉ, M. “Homeopathie,
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TROUSSEAU, A. E. Gouraud, H.
“Experiences homeopathiques tentées a l’Hotel Dieu de Paris.”Jounal de
Connaissances Medico-Chirusgicales, 7, 238-241, 1834

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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