Com Maria (Parte 1)

Peregrina materna, a Praça de São Pedro
transforma-se no Cenáculo do Grande Jubileu

(Esta transcrição é feito do Jornal L´Osservatore Romano, ou
do site do Vaticano, edição em português, de Portugal; algumas palavras são
escritas de forma diferente do português usado no Brasil)

João Paulo II juntamente com os Bispos confia à Mãe de Cristo
o futuro que nos espera

No dia 8 de Outubro João Paulo II, juntamente com o todo o
Episcopado presente no Vaticano, consagrou a Nossa

Senhora de Fátima o futuro da Igreja e do mundo, no
encerramento do Jubileu dos Bispos celebrado na Praça de São Pedro:

1. “Mulher, eis aí o teu filho!” (Jo 19, 26).

Quando já se aproxima o termo deste Ano jubilar, no qual Tu,
ó Mãe, nos deste novamente Jesus, o fruto bendito do teu ventre puríssimo, o
Verbo encarnado, o Redentor do mundo, é nos particularmente doce ouvir esta
palavra com que Ele nos entrega a Ti, tornando”Te nossa Mãe: “Mulher, eis aí o
teu filho!”. Confiando-Te o Apóstolo João, e com ele os filhos da Igreja, e
mesmo todos os homens, Cristo, longe de atenuar, reiterava o seu papel
exclusivo de Salvador do mundo. Tu és esplendor que nada tira à luz de Cristo,
porque existes n”Ele e por Ele.

Em Ti tudo é “fiat”, “faça-se”: Tu és a Imaculada, és
transparência e plenitude de graça. Assim, eis aí os teus filhos, congregados
ao teu redor, no alvorecer do novo Milênio.

Hoje a Igreja, pela voz do Sucessor de Pedro, à qual se
junta a de muitos Pastores aqui reunidos das várias partes do mundo, procura
refúgio sob a tua materna proteção e implora confiadamente a tua intercessão
perante os desafios que o futuro apresenta.

2. Muitos, neste ano de graça, viveram e continuam a viver a
alegria superabundante da misericórdia que o Pai nos concedeu em Cristo.

Nas Igrejas particulares espalhadas pelo mundo, e ainda mais
neste centro da cristandade, acolheram este dom as mais variadas categorias de
pessoas.

Aqui vibrou o entusiasmo dos jovens, daqui se elevou a
súplica dos doentes.

Por aqui passaram sacerdotes e religiosos, artistas e
jornalistas, homens do trabalho e da ciência, crianças e adultos e todos
reconheceram, no teu amado Filho, o Verbo de Deus, feito carne no teu seio.

Com a tua intercessão, ó Mãe, faz com que não se percam os
frutos deste Ano, e que as sementes da graça se desenvolvam até à estatura
completa da santidade à qual todos nós somos chamados.

3. Hoje queremos consagrar-Te o futuro que nos espera,
pedindo”Te que nos acompanhes no nosso caminho. Somos homens e mulheres de um
período extraordinário, tão cheio de triunfos e de contradições.

Hoje a humanidade possui instrumentos de força inaudita:
pode fazer deste mundo um jardim, ou reduzi-lo a um amontoado de ruínas.

Alcançou uma extraordinária capacidade de intervenção sobre
as próprias fontes da vida: pode usá-la para o bem, dentro das margens da lei
moral, ou ceder ao orgulho míope de uma ciência que não aceita confins, até
espezinhar o respeito devido a todo o ser humano.

Hoje, como nunca no passado, a humanidade encontra-se numa
encruzilhada.

E, uma vez mais, a salvação está total e unicamente, ó
Virgem Santa, no teu Filho Jesus.

4. Por isso, Mãe, assim como o Apóstolo João, também nós
queremos receber-Te na nossa casa (cf. Jo19,27), para aprendermos de Ti a
conformar-nos com o teu Filho:

“Mulher, eis aí os teus filhos!”. Viemos à tua presença para
consagrar à tua solicitude materna nós mesmos, a Igreja e o mundo inteiro.

Intercede por nós junto do teu amado Filho para que Ele nos
dê o Espírito Santo em abundância, o Espírito de verdade que é fonte de vida.

Acolhe-O por nós e conosco, como na primeira comunidade de
Jerusalém, aconchegada ao teu redor no dia de Pentecostes (cf. At 1, 14).

O Espírito abra os corações à justiça e ao amor, à mútua
compreensão e a uma firme vontade de paz.

Consagramos-Te todos os homens, a começar pelos mais
frágeis: as crianças ainda nascituras e as que nasceram em condições de pobreza
e de sofrimento, os jovens à procura de um sentido, as pessoas carecidas de um
emprego e atribuladas pela fome e a doença.

Consagramos-Te as famílias em crise, os idosos desprovidos
de assistência e quantos vivem sozinhos e sem esperança.

5. Ó Mãe, que conheces os sofrimentos e as esperanças da
Igreja e do mundo, assiste os teus filhos nas provações quotidianas que a vida
reserva a cada um e faz com que, graças ao esforço de todos, as trevas não
prevaleçam sobre a luz.

A Ti, aurora da salvação, confiamos o nosso caminho no novo
Milênio para que, sob a tua guia, todos os homens descubram Cristo, Luz do
mundo e único Salvador, que reina com o Pai e o Espírito Santo pelos séculos
dos séculos. Amém.

(©L´Osservatore Romano, 14 de Outubro de 2000)

RITO PENITENCIAL Homilia de D. Giovanni Battista Re, na
celebração na Basílica de São João de Latrão “O nosso ministério chama-nos a
ser sinais vivos de Jesus Cristo”

Peregrinos entre os peregrinos, os Bispos da Igreja de
Cristo espalhada por todo o mundo iniciaram na tarde do dia 6 de Outubro, na
Basílica de São João de Latrão, o primeiro ato da sua programação jubilar com
um solene rito penitencial, precedido pela procissão penitencial para
atravessar a Porta Santa daquela Patriarcal Basílica, catedral do Bispo de
Roma.

Desde os tempos do Concílio Vaticano II não se via um número
tão grande de Bispos provenientes do mundo inteiro, para viverem uma grande
experiência de colegialidade “cum Petro et sub Petro”. Prefeitos, Presidentes e
Secretários de Dicastérios da Cúria Romana, Cardeais, Arcebispos e Patriarcas,
Presidentes de Conferências Episcopais, Ordinários diocesanos, Bispos Eméritos,
Administradores Apostólicos ali estavam a representar Igrejas de grande
tradição eclesial ou de recente criação, todos irmanados na vivência do
espírito jubilar deste Ano Santo.

A celebração penitencial teve por tema “Ministros de Jesus
Cristo”, o qual foi desenvolvido durante a homilia por D. Giovanni Battista Re,
novo Prefeito da Congregação para os Bispos, que apresentou alguns pontos de
reflexão para preparar o ato penitencial comunitário e a administração do
sacramento da confissão individual. No final deste rito sagrado foi feita uma
coleta missionária em favor das Igrejas pobres, como testemunho de humanidade,
sensibilidade e solidariedade num espírito de verdadeira comunhão colegial
“afetiva e efetiva”.

Eis o texto da homilia de D. Giovanni Battista Re:

Caríssimos e Veneráveis Irmãos no Episcopado!

1. Peregrinos entre os peregrinos, também nós, Pastores do
povo de Deus, iniciamos o nosso Jubileu passando pela Porta Santa desta
Basílica “omnium ecclesiarum mater et caput”. Do mosaico da abside, Cristo olha
para nós com um rosto repleto de vigor e de misericórdia. Sabemos que Lhe
pertencemos por um título muito especial. Somos seus: “Christi Iesu ministri”!
Confiamos na graça abundante que Ele nos infunde, neste evento jubilar que
celebra os dois mil anos do seu nascimento. Estamos aqui, antes de tudo, para
reafirmar a nossa fé n”Ele, que é o unigênito Filho de Deus e filho da Virgem
Maria. Ele é a nossa salvação e a nossa esperança. Ele é o “ponto focal dos
desejos da história e da civilização” ” como nos recorda o Concílio ” Ele é “a
alegria de todo o coração” (cf. Gaudium et spes, 45). Por isso nós temos d’Ele
uma necessidade cada vez maior.

2. A
Palavra de Deus há pouco proclamada convida”nos a contemplá-Lo sobretudo na sua
figura de Bom Pastor, ao qual devemos conformar”nos, se quisermos estar à
altura da nossa vocação, diante dos desafios que a presente hora traz consigo.

O profeta Ezequiel anunciou-nos ” na primeira leitura ” a
decisão de Deus, de se fazer pastor do seu povo: “Assim diz o Senhor Javé. Eu
mesmo vou procurar as Minhas ovelhas… cuidarei delas” (Ez 34, 11). Nunca
devemos esquecer esta verdade fundamental: antes de nós, o Pastor é e continua
a ser Deus. A nossa confiança está colocada em Deus. A nossa força é
Cristo, que continua a apascentar o seu povo, e segura com firmeza o leme da
Igreja no meio das ondas da história: “Eis que Eu estarei convosco todos os
dias, até ao fim do mundo” (Mt 28, 20). A certeza do apoio de Deus foi sempre a
força dos seus enviados. Jeremias, no momento da vocação, foi tomado de pânico,
mas imediatamente foi assegurado pela promessa divina: “Estou contigo para te
proteger” (Jr 1, 8). Uma palavra análoga foi ouvida por Paulo: “Não tenhas
medo, continua a falar, não te cales, porque Eu estou contigo” (At 18, 9).
Aquele, a quem somos chamados a representar, é o Presente e está Vivo, e não só
nos acompanha mas precede”nos nos caminhos da história, com a força do seu
Espírito. Esta certeza, porém, não nos deve induzir a subestimar a nossa
responsabilidade. É a mesma página de Ezequiel que no-lo recorda: “Ai dos
pastores de Israel que são pastores de si mesmos” (Ez 34, ). Conhecemos o
comentário que Santo Agostinho fez a respeito desta página, no Discurso sobre
os Pastores: “Devemos prestar contas a Deus pela nossa própria vida, como
cristãos; mas, além disso, devemos prestar contas a Deus pelo exercício do
nosso ministério, como pastores” (CCL 41, 529; cf. 2ª leitura do Ofício
litúrgico da 2ª feira da XXIV semana do Tempo comum).

3. O Evangelho lido há pouco apresenta-nos Cristo, Bom
Pastor, como o modelo supremo: Aquele que “conhece” as suas ovelhas, numa
relação de intimidade e reciprocidade, mas sobretudo como Aquele que por elas
dá a vida (cf. Jo 10, 11″16).

Nesta tarde, confrontados com o olhar do Bom Pastor,
queremos deixar que Ele nos interpele. O nosso ministério, caros Irmãos,
chama-nos a ser sinais vivos de Jesus Cristo. Enquanto “Christi Iesu ministri”
é”nos pedido, a duplo título, aquela santidade que constitui a vocação comum de
todos os batizados.

Deixemos, pois, que Cristo nos interpele sobre o nosso
empenhamento espiritual e pastoral, fazendo a cada um de nós a pergunta que,
por cerca de três vezes, Ele fez a Pedro antes de lhe confiar a condução da
Igreja: “Tu amas”Me?” (cf. Jo 21, 15-17). Esta pergunta tinha certamente, para
o chefe dos Apóstolos, uma densidade particular, mas nela podemos identificar a
lógica profunda de todo o ministério pastoral. Todas as vezes que Cristo confia
as “suas” ovelhas, e os “seus” cordeiros a alguém, pede o mesmo atestado de
amor. O ministério pastoral é questão de amor, como sublinhava Agostinho,
precisamente ao comentar esta página de São João: “Sit amoris officium pascere
dominicum gregem” (In Iohannis Evangelium 123, 5). E far-lhe-á eco S. Tomás de
Aquino: “Só se pode ser bom pastor tornando-se uma só coisa com Cristo e com os
seus membros, mediante a caridade. A caridade é o primeiro dever do bom pastor”
(Comentário ao Evangelho de São João, c. 10, lição 3).

O fato que a pergunta sobre o amor tenha sido feita por
Jesus a Pedro depois da sua queda, de certo modo conforta-nos: revela-nos que
Cristo é capaz de uma confiança sem limites e que não diminui, nem sequer
diante da debilidade humana e da traição. Portanto, se trazemos hoje diante
d’Ele o fardo das nossas incoerências, fazem-lo sabendo que Ele nos convidará a
retomar com impulso o nosso compromisso de amor por Ele.

4. Tu amas-Me? Podemos perguntar”nos sobre o que comporta o
amor que Cristo espera de nós, quando nos confrontamos com o “munus docendi”,
que é o primeiro âmbito do nosso serviço. Sois vós que mo ensinais, caros
Irmãos, empenhados quotidianamente na pregação: pode haver um Magistério
episcopal irrepreensível “como deve ser!” no plano da ortodoxia, e talvez
também brilhante, porque enriquecido de cultura e eloquência. Mas não é
suficiente. Sente-se a necessidade de um Magistério vibrante, que saiba tocar
os corações transmitindo uma experiência viva do mistério. E onde é possível
haurir esta força interior a não ser na contemplação prolongada e amorosa do
rosto de Cristo? O Bispo deve ser um enamorado por Cristo. Todas as vezes que
ele fala, deveria ser possível perceber, na sua voz, o testemunho de Paulo:
“Para mim o viver é Cristo”! (Fl 1, 21).

Se isto se verifica, então, a nossa pregação torna-se
“profecia”, eco fiel da Palavra de Deus, bater de asa que levanta os ânimos e,
ao mesmo tempo, luz projetada sobre os acontecimentos da história. O nosso
tempo já não é “se alguma vez o foi “o da retórica vazia. Já o recordava
Paulo VI: “O homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as testemunhas
do que os mestres, ou então se escuta os mestres, é porque eles são
testemunhas” (Evangelii nuntiandi, 41).

Por trás das nossas palavras deve existir uma vida. Ficamos
muitas vezes impressionados com o fascínio exercido pela palavra e a presença
de João Paulo II: também sobre os jovens, como demonstrou o grande encontro de
Tor Vergata superando todas as nossas expectativas. Certamente, deve-se isto ao
carisma extraordinário deste Pontífice que sabe falar, como poucos, às
multidões. Mas a sua experiência de pregador universal e itinerante, com a sua
capacidade de interpelar as consciências, põe”nos diante do desafio de como dar
sempre mais força ao nosso magistério, permanecendo ancorados na Palavra de
Deus e ao mesmo tempo atentos à linguagem dos nossos interlocutores.

5. Tu amas-Me? Esta identificação amorosa com Cristo tem
para nós, Bispos, outro lugar privilegiado no “munus sanctificandi”, exercido
in persona Christi Capitis na celebração dos Sacramentos. Sabemos que a Igreja,
contra aqueles que vinculavam à santidade do ministro a própria validade dos
Sacramentos, defendeu a sua eficácia ex opere operato. Era um modo de afirmar
que Cristo está presente nos Sacramentos e opera para além da fragilidade do
ministro. Mas, afirmando isto, é de igual modo evidente que a santidade do
ministro é a condição mais natural para a celebração dos Sacramentos. A
experiência pastoral mostra que há uma influência misteriosa que passa
precisamente através do testemunho do ministro, quando nele resplandece íntima
participação, envolvimento profundo, coerência total de fé e de vida. A santidade
é algo que o povo de Deus percebe como que por instinto, e dela tem sede. Fazer
hoje o nosso ato penitencial significa também perguntar”nos em que medida nos
aproximamos do serviço sacramental com admiração sempre renovada,pondo”nos
diante do Mistério que se atua na Liturgia com adorante consciência da
santidade de Deus, e ao mesmo tempo com a confiante intimidade que é fruto de
uma profunda relação com Cristo.

6. Tu amas-Me? A pergunta de Cristo leva”nos ao terceiro
âmbito do nosso ministério, que é o governo pastoral. Nós somos guias do povo
de Deus. Mas somos, sobretudo, “pais” das nossas comunidades.

Não me cabe recordar, a vós que todos os dias os viveis, os
diversos aspectos deste ministério e as múltiplas virtudes que o devem
acompanhar, da sabedoria à fortaleza, do acolhimento à prudência, da atenção às
pequenas coisas à capacidade de projetos que harmoniza as diversidades e sabe
ser clarividente. Contudo, parece-me que poderia ser útil verificar sobretudo o
sentido da paternidade, com o qual tudo isto deve ser vivido.

Devemos estar atentos, caríssimos Irmãos, a jamais nos
reduzir, por assim dizer, a “administradores” da pastoral. O “bom pastor” e o
“administrador” são figuras bem diversas!

Requer-se que um Bispo nunca se esqueça que tem diante de si
pessoas, não só executores, muito menos “números”. Ser pai significa saber
encontrar as pessoas dando atenção a cada uma. Sem dúvida, não podemos ter para
todos o mesmo tempo e a mesma possibilidade de relacionamento. Mas como é
importante que cada um daqueles com os quais nos encontramos possa ter a
sensação de ser acolhido, estimado, visto com amor.

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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