Revista
“PERGUNTE E RESPONDEREMOS”
D. Estevão
Bettencourt, osb
Revista nº.
425, Ano 1997, p. 478
I Cor
15,29: BATISMO EM
FAVOR DOS MORTOS?
Em síntese:
O Apóstolo São Paulo em 1 Cor 15 quer incutir nos fiéis a realidade da
ressurreição de todos os homens, visto que Cristo ressuscitou como primícias de
nova humanidade. Entre outros argumentos, refere-se à prática de receber o
Batismo em prol dos mortos, prática que Paulo não explica nem julga. Dentro da
concepção cristã, é inconcebível tal uso, pois a morte estabiliza todo homem
em sua opção final, não podendo haver conversão após a morte. Ademais os
sacramentos beneficiam a quem os recebe, de modo que ninguém pode receber algum
sacramento em lugar de outra pessoa (viva ou defunta).
* * *
Em 1 Coríntios
15, 29 diz São Paulo: “Se não há ressurreição dos mortos, que proveito teriam
aqueles que se fazem batizar em favor dos mortos? Se os mortos realmente não
ressuscitam, por que se fazem batizar em favor deles?”.
Nesta
passagem o Apóstolo refere-se a uma prática vigente entre os fiéis de Corinto
(talvez num grupo pequeno da comunidade), segundo a qual os cristãos vivos
poderiam beneficiar os que haviam passado para a outra vida, fazendo-se batizar
no lugar deles. São Paulo não explica precisamente em que consiste esse rito,
nem as idéias que lhe estavam subjacentes. Apenas menciona o fato (sem o
julgar, sem o aprovar) para daí tirar um argumento ad hominem (válido para os
coríntios) em favor da ressurreição dos mortos. É este artigo de fé que São Paulo
quer incutir com muita ênfase.
Tal prática
caiu logo em desuso, pois não há vestígios da mesma na literatura cristã
posterior até o século passado; os Mórmons, fundados por Joseph Smith em 1830, a restauraram. Tal
uso se deve a influências heterogêneas que moveram alguns fiéis de Corinto a
algo que a fé-cristã não pode reconhecer.
Com efeito.
Somente na vida terrestre é dado ao homem converter-se para Deus e definir a
sua sorte definitiva. Os sacramentos, entre os quais o Batismo, são canais da
graça que possibilitam e alimentam a conversão. A morte estabiliza todo ser
humano na sua última opção quem morre em Cristo, tendo Deus no seu coração,
gozará para sempre da visão de Deus face-a-face no céu; quem morre consciente e
voluntariamente avesso a Deus, se terá definitivamente afastado de Deus, sofrendo
a frustração mais profunda que é o inferno. Não é possível mudar de opção na
vida futura. Daí a enorme importância da caminhada terrestre, durante a qual o
Senhor Deus proporciona às suas criaturas as mais diversas e ricas
oportunidades de escolher o bem e nele se fixar. Cada qual colherá, na hora da
morte, o que tiver semeado.
Além disto,
é de notar que os sacramentos são canais da graça para quem os recebe, e tão
somente para estes. Ninguém pode receber um sacramento em lugar do seu irmão
(vivo ou defunto). Verdade é que na linguagem popular se diz: “Vou oferecer a
S. Comunhão por um(a) aniversariante ou por um(a) defunto(a)”. Em tal caso, os
frutos ou as graças da Comunhão Eucarística ficam sempre reservados para quem
comunga; acontece, porém, que comungar é um ato bom ou meritório (como atender
a um doente, dar uma esmola, cuidar de
uma criança…); pode então alguém pedir a Deus que os méritos dessa boa ação
revertam em prol do próximo. Estamos na Comunhão dos Santos, de modo que as
boas obras praticadas por uns podem redundar em benefício de outros. “Uma alma
que se eleva, eleva o mundo inteiro” (João Paulo II, Exortação Apostólica sobre
Reconciliação e Penitência, nº 16). Com outras palavras: uma pessoa que pratica
o bem e se santifica, contribui para a santificação de seus irmãos.
Eis as
lições concretas que podemos deduzir de uma reflexão sobre o texto de
1Coríntios 15, 29.