Apocalipse de São Pedro?

O
Apocalipse de Pedro, trata-se de um livro apócrifo redigido entre 125 e 150 dC
(i.é, séc. II) e falsamente atribuído ao príncipe dos apóstolos, São Pedro. De
fato, alguns cristãos consideravam-no inspirado, como, por exemplo, o escritor
e doutor grego Clemente de Alexandria e o autor do já citado fragmento de
Muratori (ainda que faça a ressalva).

Além
disso, algumas igrejas da Palestina liam partes de seu texto na liturgia da
Sexta-Feira Santa (até meados do séc. V) mas, com a definição oficial do cânon
bíblico no final do séc. IV, e consequente classificação do Apocalipse de Pedro
como “apócrifo”, o mesmo deixou de ser lido e empregado, sendo
destruído ou caindo no esquecimento até que, por fim, acabou por desaparecer.

E
assim foi durante muito tempo; só se tinha conhecimento de sua existência
através de alguns fragmentos (como um que foi encontrado num túmulo do Alto
Egito) ou por ter sido citado nas obras de Clemente de Alexandria. Porém, em
1910, foi descoberto o texto completo em uma tradução etíope, que foi
pesquisado por mons. Sylvain Grebaut e publicado na íntegra vários anos depois.

Possui
uma parte que pode ser considerada, de certa forma, paralela a Mt 24: “Muitos
virão em meu nome e dirão: ‘Eu sou o Cristo’. Não confieis neles e nem vos
aproximeis. Na realidade, a época da vinda do Filho do Senhor não é conhecida.
Mas, como o raio que surge do oriente até o poente, assim chegarei nas nuvens
do céu, com um exército numeroso para minha glória e minha cruz virá na frente.
Virei em minha glória resplandecendo sete vezes mais que o sol. Virei em minha
glória com todos os meus santos e os meus anjos, e meu Pai me colocará, então,
uma coroa sobre a cabeça para que eu julgue os vivos e os mortos e pague a cada
um de acordo com seus atos. […] Não sabes que a árvore do figo é a casa de
Israel? […] Certo eu te digo que, quando os seus ramos tiverem esverdeado no
último dia, virão falsos messias. E eles dirão nas suas promessas: ‘Eu sou o
Cristo que vim ao mundo’. E, quando tiverem visto a malícia de suas obras, irão
atrás deles e renegarão o primeiro Cristo, aquele que foi crucificado e ao qual
nossos pais deram glória. Esse mentiroso não é o Cristo. E quantos se lhe
opuserem, ele os matará a todos com a espada. Haverá então muitos
mártires”.

Mas
talvez a passagem mais interessante seja sobre como deverá acabar o mundo…
Provavelmente teria feito muito “sucesso” no último dia 11 de agosto
de 1999, dia previsto por alguns falsos profetas como final dos tempos… 🙂
Trata-se da passagem – que muitos talvez já tenham escutado e até acreditam que
será verdade (mas não será!) – que afirma que o mundo irá ser destruído pelo
fogo: “Serão escancaradas as cataratas de fogo. Sobrevirá escuridão e
trevas que revestirão e cobrirão com véu o mundo todo. As águas serão mudadas e
transformadas em carvões de fogo. Tudo o que está nelas queimará. Também o mar
se tornará fogo. Sob o céu haverá um fogo cruel que não se apagará jamais. E
escorrerá para o julgamento da ira. Também as estrelas serão fundidas pelas
chamas e ficarão como se não tivessem sido criadas. […] Os espíritos dos cadáveres
se assemelharão ao fogo e se tornarão fogo por ordem do Senhor. Então todas as
criaturas serão liquefeitas. Em todo lugar a ira do fogo pavoroso alcançará os
filhos do homem. E, empurrando-os, as chamas que não se apagarão os obrigarão a
ir para o julgamento da ira, em um rio de fogo que não se apagará e que correrá
queimando. […] E me vereis chegar sobre uma nuvem luminosa e eterna. […] E
suas ações se apresentarão perante cada um deles. E cada um será retribuído
segundo seus atos.”

Assustador??
Talvez, afinal faz parte do gênero literário classificado como
“Apocalipse” (v. livro de Daniel, Apocalipse de João)… Mas o
Apocalipse de “Pedro” não tem valor nenhum para nós, cristãos, por
dois motivos:

Primeiro,
porque é um livro *apócrifo*, escrito por alguém que não sabemos quem é, mas
que, para dar “autoridade” à sua obra, resolveu atribuir a
“autoria” a São Pedro (mesmo este estando morto há pelo menos 60 anos
naquela época!). Além disso, a análise do conteúdo da obra demonstra várias
discordâncias com o resto do Novo Testamento… uma delas é o fato de que tal
Apocalipse se diz ser “revelação secreta de Jesus a Pedro”; contudo,
o próprio Jesus deixou bem claro que o Reino está aberto a todos os homens de
boa vontade, sendo esta a Boa Nova a ser pregada para todas as nações;
percebemos, assim, que não há espaço para “revelação secreta”…
Devemos, ainda, observar que qualquer “revelação secreta” só serve
para beneficiar a pessoa que a recebeu e não as demais!

Segundo,
porque o cristão não deve temer o final do mundo e pouco lhe interessa saber
como e quando isto se dará. Ora, tendo recebido a salvação por Cristo e
perseverado como cristãos, reconhecemos que devemos estar sempre preparados
para o segundo advento de Cristo, uma vez que não sabemos nem o dia e nem a
hora em que Ele
virá para nos julgar… O próprio Jesus, aliás, já alertara: “Orai e
vigiai…”. Portanto, estando sempre “rigorosamente em dia” com
as nossas obrigações como cristãos, ficamos apenas fazendo eco ao penúltimo
versículo da Bíblia – que, por sinal, pertence ao Apocalipse de São João (este
sim divinamente inspirado e de revelação pública e geral): “Vem, Senhor
Jesus!” (Ap 22,20).

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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