Adolescentes recebem mais incentivos para abstinência sexual nos EUA

Os médicos dos Estados Unidos estão aderindo ao movimento em defesa da
abstinência sexual. A seguir, saiba por que eles estão orientando os
adolescentes para aderirem à política do “Basta dizer não”.



Jodie Morse Time

A projeção de slides foi arrepiante. No começo, chamaram a atenção um colo do
útero com lesões pré-cancerosas e trompas de Falópio enrugadas. Mas, o que
levou o jovem Seth Claude e seus amigos a ficarem completamente lívidos foi um
pênis coberto de feridas, inteiramente distendido e deformado, e parecido com
uma bexiga murcha. “Antes, eu achava que se você tivesse verrugas
genitais, talvez aparecessem uma ou duas, não mais. Mas então, eu vi aquela
pessoa com um montão delas e realmente fiquei de queixo caído”, conta Seth,
13 anos. “As fotos são o bastante para qualquer um ter uma boa quantidade
de pesadelos”.

Mas será que essas fotos foram convincentes o suficiente para que ele decida
evitar ter relações sexuais? Essas imagens constituem a espinha vertebral de um
curso curricular de educação sexual intitulado Worth The Wait (“Vale a
pena esperar”), o qual é lecionado na escola que freqüenta Seth, a Escola
de Ensino Médio Caldwell, na cidade de Caldwell, no Texas, e em 31 outros
distritos em todo o Estado.

Concebidas pela médica Patricia Sulak, uma ginecologista, obstetrícia e também
professora da matéria no colégio de medicina da universidade A&M, no Texas,
as aulas apresentam as consequências clínicas possíveis do sexo entre
adolescentes, por meio de fotos e de estatísticas apavorantes, organizadas em
forma de gráficos, detalhando e explicando os números de jovens adolescentes
infectados por doenças sexualmente transmissíveis. A mensagem a ser levada para
casa: abstenha-se de ter relações sexuais ou senão você estará exposto a correr
um grave risco medical.

Uma tremenda batalha envolvendo a educação sexual vem sendo travada há muito
tempo neste país – e a cada ano que passa, os adversários estão ficando cada
vez mais entrincheirados nas suas posições. De um lado, estão os conservadores
religiosos que defendem a idéia segundo a qual o sexo fora do casamento é um
ato ímpio. Eles obtiveram milhões de dólares em créditos do governo federal
para implantar programas educativos que defendem a abstinência e alertam para
os perigos que representa o uso de contraceptivos.

O outro campo, por sua vez, integrado por praticamente todas as organizações
medicais mais importantes que operam no país, afirma que seria uma
irresponsabilidade negar às crianças informações sobre o uso de preservativos.
Agora, no momento em que o Congresso está avaliando a proposta do presidente
Bush que visa reforçar em 33% o financiamento dos cursos que preconizam a
abstinência, os quais passariam a receber US$ 135 milhões (cerca de R$ 513
milhões), o equilíbrio das forças presentes está mudando.

Um batalhão reduzido mas barulhento de médicos bandeou-se para o lado da
abstinência. “Eu costumava acreditar que tudo o que tínhamos a fazer era
lotar as escolas com preservativos e que isso resolvia o problema”, conta
Patricia Sulak. “Mas, após ter analisado as estatísticas, fui obrigada a
operar uma mudança radical nas minhas concepções em relação aos adolescentes e
a sua vida sexual”.

Os fatos estão provando que esse tipo de reviravolta é contagioso. Patricia
Sulak vendeu os seus kits de slides para funcionários de serviços medicais em
44 Estados. De maneira mais significativa ainda, o Colégio Americano de
Obstetrícios e Ginecologistas, que esteve por muito tempo no campo adversário
no que diz respeito à educação sexual, está se preparando para honrar Sulak com
um prêmio presidencial, que lhe será entregue na próxima primavera.

Enquanto isso, um grupo de mais de 400 médicos deu a sua colaboração na
realização de um CD-ROM sobre abstinência sexual, intitulado: “Prescrições
para os pais: um guia dos médicos sobre a adolescência e o sexo”, o qual
foi lançado no mês passado pelo National Physicians Center for Family Resources
(Centro Nacional de Médicos em prol do Desenvolvimento da Família). “Pais
e filhos querem ser informados sobre fatos medicais, e não ser alvos de uma
abordagem moralista unilateral e tendenciosa”, afirma Dianna Lightfoot, a
presidenta do centro.

Os educadores que defendem a abstinência sexual também querem pôr em evidência
a história dessa evolução medical. De 1999 a 2001, o Instituto Medical em prol da
Saúde Sexual, em Austin, no Texas, que comercializa material pedagógico para
educadores que defendem a abstinência sexual, registrou um aumento de 150% nas
vendas dos seus produtos. Até mesmo os Centros de Prevenção e Controle das
Doenças (CDC), cujos programas educacionais costumavam estimular o uso de
preservativos, operaram em silêncio uma revisão drástica de sua posição em
relação à abstinência sexual.

Com efeito, este organismo retirou de seu site na Internet, neste verão, um
capítulo inteiro chamado “Programas que funcionam”, o qual cantava as
glórias de oito cursos de educação sexual baseados no incentivo do uso de
preservativos. Agora, esta agência se concentra exclusivamente nos cursos que preconizam
a abstinência. Para Lloyd Kolbe, o diretor da divisão do CDC que cuida da saúde
dos adolescentes nas escolas, e que fora inicialmente um dos autores do
capítulo dedicado ao uso de preservativos, “aquela era uma abordagem muito
limitada”.

Mas, o que há de diferente agora? Os anos 90 apresentaram um balanço dividido
entre positivo e negativo no que diz respeito à saúde sexual dos adolescentes.
Houve um declínio consistente, de 20%, na taxa de nascimentos de filhos de pais
adolescentes, e, segundo um relatório divulgado pelo CDC na semana passada, a
atividade sexual nessa faixa etária diminuiu de 15%. No entanto, a incidência
de determinadas doenças transmitidas sexualmente aumentou sensivelmente nos
adolescentes. Um quarto de todos os novos casos de infecção pelo vírus HIV
registrados atualmente ocorrem em indivíduos de 21 anos ou menos.

Além disso, os médicos estão registrando um número cada vez maior de
ocorrências em que são diagnosticados casos de herpes e de vírus do papiloma
humano, ou HPV, o qual está ligado a casos de câncer cervical e do qual
estima-se que ele infecta mais de 15% dos adolescentes sexualmente ativos. É
justamente esta última estatística que está deixando alguns médicos mais
angustiados. Embora as especificidades do vírus HPV continuem a representar um
mistério para a classe medical, fomos informados de pelo menos uma
característica assustadora desta doença: o HPV é transmitido pelo contato da
pele com os órgãos genitais e suas regiões adjacentes, o que significa portanto
que nem sempre os preservativos protegem os indivíduos do seu contágio. Isso
também significa, assim como Patricia Sulak não se cansa de dizer, que não
existe nada melhor do que relações sexuais seguras.

O fato de Patricia Sulak estar liderando esta campanha não é nenhuma surpresa.
Ela é uma especialista muito respeitada no campo da contracepção que se dedicou
ao longo da década passada a pesquisas sobre a pílula do controle de
natalidade. Ela também se destacou ao defender uma de suas causas mais
importantes, sete anos atrás, quando lhe pediram para ajudar a escolher um
programa de educação sexual para a escola de ensino médio de seu filho. Os
programas de estudos que ela examinou então eram todos deformados por
tendências ideológicas, e repletos de erros medicais. Diante disso, ela decidiu
criar o seu próprio programa, inspirando-se amplamente em dados fornecidos
pelos Institutos Nacionais de Saúde e pelo CDC. “Tudo o que fizemos foi
apurar e estabelecer fatos”, diz, “e ninguém pode discutir contra os
fatos”.

No entanto, a maneira com que esses fatos são apresentados está suscitando
rajadas de críticas dos dois lados. Alguns conservadores da linha dura, que
vêem a educação sexual como a principal guerra cultural entre todas na qual
eles obtiveram sucessos consistentes, afirmam que Patricia Sulak não faz o
suficiente para promover a santidade do casamento, o que é uma condição
requerida para se receber o financiamento federal destinado a apoiar os
programas de estudos sobre abstinência sexual. Além disso, eles não se mostram
particularmente satisfeitos diante de perspectiva de ver os seus jovens filhos
passarem uma parte de seu tempo escolar vendo imagens de colos do útero.
Conforme argumenta Leslee Unruh, o presidente do Escritório Central da
Abstinência Nacional, “criei cinco crianças abstêmias sem lhe mostrar
sequer uma imagem de órgãos genitais infectados”.

Por sua vez, os que defendem uma educação sexual clara e abrangente dizem temer
os pecados por omissão. O programa curricular Worth the Wait permanece em
silêncio sobre assuntos tais como a masturbação e a homossexualidade e, além
disso, visando adequar-se às instruções gerais fornecidas pelo governo federal,
este curso menciona os preservativos apenas para destacar as suas inúmeras
imperfeições.

“Ao manipular fatos que dizem respeito aos preservativos, eles recorrem à
tática do medo para tentar convencer as crianças a não serem sexualmente
ativas”, acusa Tamara Kreinin, a presidenta do Conselho de Educação e de
Informação sobre Sexualidade nos Estados Unidos. “Além disso, o fato de
que muitos médicos estejam aderindo atualmente a esse tipo de abordagem lhe
confere um nível mais alto de credibilidade”. O médico David Kaplan, um
professor de pediatria na Escola de Medicina da Universidade do Colorado,
compartilha as suas preocupações: “É revoltante ver programas de educação
sexual que evitam fornecer aos adolescentes as informações necessárias para que
eles possam se proteger”.

Mesmo assim, alguns dos mais ardorosos defensores do método de Patricia Sulak
também são oriundos da profissão medical. “Acabei me rendendo à sua
maneira de pensar”, disse o médico Gerald Joseph Jr., um
obstetrício-ginecologista que exerce em Springfield, no Missouri, e diretor de
departamento no Colégio Americano de Obstetrícios e Ginecologistas. “Não
há dúvida de que o seu programa é totalmente preciso e responsável no plano
medical”.

Com efeito, os médicos contribuíram para todos os aspectos do programa de
estudos Worth the Wait. Não só eles formam e treinam educadores de saúde
enviados por escolas que participam do programa, mas, além disso, médicos ou
estudantes de medicina também dão palestras na qualidade de professores
convidados para estudantes durante o semestre. Se alguns desses estudantes
declararem, em algum momento desse curso, que eles não pretendem se abster até
o casamento, eles são imediatamente encaminhados até um profissional medical
para obter informações sobre contraceptivos.

Talvez a questão mais premente em relação ao programa Worth the Wait seja
aquela que vem infernizando o movimento em prol da abstinência desde o começo:
será que ele funciona? Embora uma avaliação em grande escala de onze desses
programas, conduzida pelas autoridades federais, esteja prevista para ser
divulgada no começo do próximo ano, nenhum estudo confirmou até agora os
méritos da abordagem “Basta dizer não”. Mas há certos indícios de
menor alcance que podem indicar que o programa Worth the Wait está produzindo
alguns resultados. Uma avaliação continuada que vem mobilizando professores da
Universidade A&M, no Texas, apurou que, de 1999 a 2001, a freqüência de
atividade sexual entre os alunos que cursam os sétimo e oitavo graus do
programa caiu para 4% e 2% respectivamente.

Voltando para Caldwell, Seth Claude e a sua namorada Chaille explicam que eles
estão assimilando todas essas informações com cautela. “Costumamos ficar
sentados um na frente do outro no ônibus e durante o almoço”, ele diz. E
quando eles estão finalmente a sós, eles acabam conversando com frequência
sobre verrugas genitais.

Com reportagem de Perry Bacon Jr. em Washington, e Adam Pitluk em Caldwell

O que dizem os adolescentes:

A seguir, conheça as respostas que foram dadas por ocasião da pesquisa
promovida pela Time e a MTV america, realizada online entre 10 e 12 de setembro
passado, junto a 1.061 pessoas com idades entre 13 e 18 anos:

56% dos entrevistados dizem que eles pretendem se abster de ter relações
sexuais até o casamento.

79% tiveram aulas de educação sexual na escola

15% tiveram aulas voltadas exclusivamente para a abstinência sexual

69% são contra a alocação de verbas federais para programas destinados a tratar
exclusivamente de questões ligadas à abstinência

15% dizem que eles não se sentem à vontade ao receberem informações sobre sexo
na escola

58% acham que as suas escolas fizeram um bom ou um excelente trabalho ao
proporcionar-lhes um ensino sobre sexo e sobre questões relacionadas ao sexo,
inclusive sobre o controle de natalidade e doenças sexualmente transmissíveis

59% acham que os seus pais fizeram um bom ou um excelente trabalho ao
transmitir-lhes ensinamentos sobre sexo e sobre questões relacionadas ao sexo,
inclusive o controle de natalidade e as doenças sexualmente transmissíveis

73% acham que os centros de saúde das universidades deveriam disponibilizar
preservativos para os estudantes que os solicitarem

37% acham que os compromissos de se manter virgem são eficazes para convencer
os adolescentes a não terem relações sexuais antes do casamento


Tradução: Jean-Yves de Neufville

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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