A Perseguição de Valeriano

emperadorvaleriano

De 253 a 260 o ancião imperador Valeriano começou seu reinado sem perseguir os cristãos e até os protegia. Sua nora Salonina, parece ter se tornado cristã e a corte estava tão cheia de cristãos que São Dionísio de Alexandria disse: “O palácio imperial assemelha-se a uma igreja”. Mas depois de três anos tudo mudou; e Valeriano retomou a perseguição. Por quê?

Macriano, seu ministro das finanças, adepto dos cultos secretos orientais, junto com um grupo de mágicos do Egito, convenceu o imperador de que a invasão dos bárbaros francos, alamanos, godos e germanos, que se acentuava, além da agitação dos berberes da África e a invasão dos persas do rei Sapor, era devido à sua tolerância com os cristãos, que neutralizavam seus “poderes” mágicos contra os invasores, anulando os seus “trabalhos”. Como hoje ainda, muitos poderosos se apoiavam nas magias e ocultismos. Além disso, a Igreja já tinha muitos bens e Macriano sugeriu a Valeriano que os confiscasse, tendo em vista a crise financeira do Império.

Esta atitude deste imperador – motivada pela superstição e pela sede financeira – mostra como o Império já experimentava o caos. Valeriano, então, decidiu dar um golpe fatal na Igreja; tomou medidas contra o clero e proibiu reuniões nas catacumbas, através do edito imperial de agosto de 257 proibiu o culto público e interditou a visita aos cemitérios cristãos. O objetivo era abolir a sociedade cristã; como hoje também pretende certo laicismo anticatólico.

Principalmente os bispos foram obrigados a sacrificar aos deuses do Império, senão seriam exilados. Como a medida não foi eficaz para barrar o Cristianismo, em 258 foi emitido um novo edito que definia morte aos bispos que não sacrificassem aos deuses do Império. Morreram mártires muitos bispos, entre eles São Cipriano de Cartago (†258), o Papa Sixto II (257-258), executado na cadeira episcopal, no cemitério de Pretextato; o Papa Estêvão (254-257), o diácono São Lourenço, assado em fogo lento, o bispo espanhol São Frutuoso, bispo de Tarragona, com os seus diáconos, foram queimados vivos; o Papa Estêvão I (254-257), degolado; São Tarcísio e outros.

São Marciano era leitor na comunidade de Circé, Argélia; foi preso com muitos outros cristãos. Foram levados a um vale alinhados na vertente da colina e todos decapitados à espada (Leite, 1993, p. 37).

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Todas as comunidades cristãs foram atingidas; as multidões deram vasão à sua fúria contra os cristãos, especialmente na África onde muitos foram trucidados. Prudêncio afirmou que cerca de trezentos fiéis, com o bispo Quadrato foram atirados a um depósito de cal virgem. Muitos sacerdotes e leigos foram confinados nos trabalhos miseráveis das minas, e muitos foram mortos nas catacumbas, vigiadas pelos soldados. Os cristãos da alta sociedade tinham seus bens confiscados e perdiam seus cargos e privilégios. Foram martirizadas as mulheres Rufina e Secunda, filhas do senador Astério.

O diácono São Lourenço, durante a perseguição de Valeriano, repartia os bens da Cúria romana, e tendo ordenado ao prefeito de Roma que entregasse ao fisco as riquezas que cuidava, o santo apresentou ao magistrado os pobres socorridos pela Santa Sé, dizendo-lhe que “estes eram os tesouros da Igreja”. A fim de fazê-lo confessar onde teria escondido os bens, lhe puseram sobre uma grelha para ser queimado pelo fogo, morrendo lentamente. Estando muito queimado de um lado, disse ao magistrado que presenciava o suplício: “Deixe-me do outro lado que não está queimado”, e quando se sentiu morrer, disse-lhe: “Agora prova”.

O historiador Eusébio foi testemunha ocular de fatos semelhantes. Observa em sua História Eclesiástica que as feras por vezes pareciam respeitar as testemunhas de Cristo. Assim, relata ele a respeito do anfiteatro de Tiro:

Pelas narrativas os mártires não lutavam contra as feras. Não se conhece caso algum. Deixavam ser atacados sem se defender. A crucificação era considerada pelos romanos como infame, mas foi aplicada com grande frequência aos cristãos. Orígenes relata que São Pedro foi crucificado de cabeça para baixo, pois pediu, por humildade, que fosse assim fixado à cruz.

Escreve Sêneca, filósofo estoico, observando a frequência deste tipo de morte: “Vejo cruzes de diversos modos; alguns são levantados na cruz com a cabeça para baixo” (Consolatio ad Marciam, 20; Apud Revista PR, nº 475 – Ano 2001).

No entanto, a Igreja saía cada vez mais forte de cada perseguição. No século III a perseguição se tornou ainda pior porque resultou de uma lei do Estado que com sua máquina esmagava os cristãos em toda parte. Houve períodos de paz, como vimos, mas como os imperadores mudavam constantemente, cada um agia de forma diferente dos outros. Houve vítimas em todos os países, em todas as classes sociais, em todas as idades e condições, tanto na Europa quanto na África e Ásia. Há que se destacar o grande número de mulheres heroicas.

Pouco tempo depois Valeriano foi preso e humilhado pelos persas do rei Sapor e assim morreu.

De 260 a 278, Galieno, filho de Valeriano, foi tolerante com os cristãos, como já citamos; sua esposa Salonina era cristã. Publicou um edito de tolerância que obrigava devolver à Igreja os bens confiscados; mas, Eusébio de Cesareia conta a história de São Marino, afirmando que a Igreja estava em paz em todos os lugares.

Marino era um bravo e nobre oficial do exército imperial em Cesareia da Palestina. Foi condenado por um juiz, um certo Aqueu. Ao sair do tribunal encontrou o bispo Teotecno que conversou com ele e o levou a uma igreja. Aos pés do altar o bispo colocou-o entre uma espada e uma Bíblia e mandou que escolhesse. Não titubeou, escolheu a Bíblia. O bispo o abençoou e ele saiu todo feliz e pronto ao sacrifício. No martírio do jovem estava presente o velho senador Astério, para estimulá-lo ao sacrifício. Ele tomou o corpo do mártir e lhe deu uma digna sepultura e estava ciente de que ia se comprometer. Logo após foi a vez dele ser martirizado. Dividiu assim com Marino a honra do martírio.

De 278 a 280 reinou Claudio II; parece que a perseguição não foi forte; mas as Atas de Santa Prisca (Priscila), dão como certo o seu martírio sob Cláudio II e sua sepultura na via Ostiense. De lá seu corpo foi transladado para o Aventino. No século oitavo começaram a identificar a mártir romana com Prisca, mulher de Áquila, de que fala São Paulo (Rm 16,3). Os Martirológios colocam nesses dois anos o martírio de Mário, Marta, Audifax e Ábaco.

De 270 a 275, Aureliano foi imperador, construiu vinte quilômetros de muralhas para proteger Roma; não há certeza de que tenha perseguido os cristãos. Eusébio registra que este imperador não assinou qualquer edito contra os cristãos. Mas a paz para a Igreja era ainda precária, embora já houvesse grandes basílicas e muitos cristãos ocupavam altos cargos.

Depois de Aureliano houve uma série de imperadores e usurpadores do trono, que uns mais, outros menos, perseguiram os cristãos: Tácito (275-276), Floriano (276); Probo (276-282); Caro (282-283); Carino e Numerandio (283-284). Mas a Igreja viveu um período de paz (275-284).

Retirado do livro: “História da Igreja – Idade Antiga”. Prof. Felipe Aquino. Ed. Cléofas.

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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