A perfeição cristã

“O Caminho da Perfeição”; esse é o título de um dos livros escritos por Santa Teresa de Jesus, a reformadora do Carmelo. Também o seu amigo São João da Cruz escreveu bastante sobre o mesmo tema, esmiuçando a peregrinação em busca da perfeição cristã. Na verdade, todos os santos nos legaram, em seus escritos, preciosos ensinamentos sobre esse caminhar para Deus, dia a dia, buscando ser melhor.

Este caminho é, sobretudo, percorrido com o desejo de fazer a vontade de Deus, como Ele mesmo disse a seu povo: “Se obedeceres fielmente à voz do Senhor, teu Deus, praticando cuidadosamente todos os seus mandamentos que hoje te prescrevo, o Senhor, teu Deus, elevar-te-á acima de todas as nações da terra” (Dt 28,1).

O caminho da perfeição também será sempre de lutas contra nós mesmos e contra as forças dos instintos que combatem em nossos membros. Jesus alertou: “Entrai pela porta estreita, porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduzem à perdição (…). Estreita, porém, é a porta e apertado o caminho da vida e raros são os que o encontram” (Mt 7, 13-14).

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Sim. Há um caminho mais inteligente e mais suave!

A mais bela profissão do homem é rezar e amar

De fato, poucos são os que o encontram, já que o mundo oferece insistentemente a “porta larga” da satisfação dos desejos sensíveis do corpo e do espírito, fazendo disso a razão quase única de ser da própria vida. Não é à toa que Jesus disse que são os “violentos” que conquistam o reino de Deus; não os violentos com os outros, mas os violentos consigo mesmos.

A perfeição cristã pode muito bem ser expressa pelo canto de São Francisco, especialmente quando diz que “é morrendo que se vive para a vida eterna”. A morte do próprio eu é o início do caminho da vida cristã perfeita. Não há outro. “Se o grão de trigo, caído na terra, não morrer; fica só; se morrer, produz muito fruto” (Jo 12,24). Esse grão de trigo a que Jesus se referiu é cada um de nós. E Ele advertiu em seguida: “Quem se apega à sua vida perde-a; mas quem não faz conta de sua vida neste mundo, há de guardá-la para a vida eterna” (Jo 12,25). Mas é preciso entender que esse “morrer para si mesmo” nada tem de desprezar-se ou desprezar a vida; ao contrário, é libertar-se de todo mal para servir perfeitamente a Deus e aos outros gratuitamente.

É muito interessante notar que Jesus colocou como condição para ganharmos a vida eterna o “morrer para nós mesmos” e não se apegar a esta vida terrena. Essa é uma linguagem dura, especialmente para os tempos atuais, extremamente materialista e hedonista, em que o prazer, o poder e o orgulho são incentivados sistematicamente contra todas as leis da moral e da ética.

Mais do que nunca, hoje é preciso que essa bela proposta de Jesus seja reapresentada aos homens, a fim de dar-lhes, como dizia Bérgson, um “suplemento de alma”. O homem só atingirá o fim para o qual foi criado, isto é, Deus, se aceitar morrer para si mesmo para dar o coração a Deus. Então “Deus será tudo em todos” (1 Cor 15,28), como disse São Paulo. Se não aceitarmos morrer para o orgulho, para a vaidade, para o prazer e para tudo o mais que é a nossa vontade própria, Deus não poderá ser tudo em nós.

Muitos desanimam na caminhada em busca da perfeição, pois julgam ser impossível atingi-la. De fato o é, se ficarmos olhando apenas para a miséria e para a fraqueza de cada um de nós. Mas, se essa é à vontade de Deus para todos, então certamente Ele dará as graças de que precisamos para alcançá-la. A grande diferença entre os santos e nós é que eles confiaram perfeitamente na graça de Deus e fizeram a sua parte. A perfeição cristã é uma conquista árdua na luta diária contra as nossas más inclinações. Mas, nessa luta, Deus vem em auxílio à nossa fraqueza, como disse São Paulo: “Quando me sinto fraco, então é que sou forte” (II Cor 12,10).

Os instrumentos para a construção dessa obra pessoal e perfeita são bem conhecidos: a oração constante, a meditação da Palavra, a vida sacramental (especialmente a penitência e a Eucaristia), a aceitação da vontade de Deus em tudo o que acontece, a paciência, a reta intenção em fazer tudo para Deus e a persistência em prosseguir sempre, sem nunca desanimar. Na verdade, essas são as grandes graças que devemos pedir sempre ao Senhor. Suportar nossa própria miséria e as decepções que temos com nós mesmos será sempre um grande meio de crescimento. Segundo São Tiago, “a paciência produz uma obra perfeita” (Tg 1,4). O querer atingir a perfeição cristã é o mais importante. Querer é poder; e todos nós podemos, basta querer e contar com a graça de Deus que nunca nos faltará!

Prof. Felipe Aquino

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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