Revista: “PERGUNTE E
RESPONDEREMOS”
D. Estevão Bettencourt, osb
Nº 346 – Ano 1991 – p. 97
O mês de março é o mês de
Quaresma e Páscoa, durante o qual o cristão procura aprofundar o sentido dos
tempos que ele celebra. Para ajudá-lo, a
Tradição cristã propõe historietas certamente lendárias, aptas, porém, a
ilustrar as grandes verdades da fé.
Entre outras, narra-se que,
quando o pai Adão estava para morrer, enviou seu filho Sete (cf. Gn 4, 25) à
porta do paraíso, a fim de pedir ao Querubim que o guardava (cf. Gn 3, 24), um
fruto da árvore da vida; seria o antídoto da morte que o ameaçava. O anjo
respondeu ao menino que não lhe podia dar o fruto desejado, pois Adão incorrera
na sentença de morte e era justo que a
sofresse. Todavia dar-lhe-ia um raminho da árvore da vida; quando o pai
morresse, o menino o plantaria sobre o
túmulo do falecido; estivesse certo – acrescentava o anjo – de que, quando tal raminho crescesse e desse fruto, o pai
Adão reviveria! Assim fez o menino. E a predição do anjo se cumpriu!
Que significa esta estória?
– O Evangelho afirma que
Jesus foi crucificado no Gólgota – o que em hebraico quer dizer: “Lugar da
Caveira” (cf. Jo 19,17). Que caveira era essa? – A lenda diz que era a do pai
Adão… A Cruz de Cristo plantada sobre o monte da Caveira é simbolizada pelo
ramo da árvore da vida, que Sete terá plantado sobre o túmulo de seu pai.
Quando esse ramo (= a Cruz) deu seu fruto (= o sangue de Cristo derramado sobre
o túmulo e a caveira de Adão), o Homem reviveu, isto é, recuperou a estrada da
vida eterna; Cristo é o novo ou o segundo Adão (Rm 5, 12-19; 1Cor 15, 45-49),
que restitui ao gênero humano a vida perdida pelo primeiro Adão.
O significado positivo da
lenda em foco consiste em ilustrar a recapitulação realizada na plenitude dos
tempos (cf. Ef 1,9s). Com efeito; a história da salvação decorrer entre dois
eixos homens compendiosos: o primeiro e o segundo Adão. O primeiro é pai para a
morte; o segundo é pai para a vida; a árvore da vida perdida no paraíso é
resgatada pela Cruz de Cristo, nova árvore da vida; a primeira Eva, que
acompanhava Adão, é recuperada pela Segunda Eva; o nome desta “Mãe da Vida” só
se realiza plenamente em
Maria Santíssima, pela qual o Senhor da vida entrou no mundo.
Ora a existência do cristão
é a miniatura da história universal ou a passagem do primeiro para o segundo
Adão. Nasceu de seus genitores, descendentes do primeiro, e renasceu, pelo
Batismo, do segundo Adão. Importa-lhe, durante a sua peregrinação terrestre,
morrer para a desordem herdada do primeiro Adão e dar espaço crescente à vida
do segundo, recebida no batismo. – A Quaresma é o tempo forte em que esta
ascese (exercício) se efetua, a fim de que no Domingo de Páscoa o fiel cristão
possa celebrar a vitória do segundo Adão sobre o pecado e a morte não só na
Liturgia, mas também em sua existência pessoal!