A Doutrina das Indulgências – Parte 2

É usando desse poder “das
chaves”, que a Igreja aprovou as indulgências. E, se ela ligou na Terra, Cristo
ligou também no céu. O dogma da infalibilidade da Igreja e do Papa, nos ensina
que Jesus não pode ligar nada errado no céu; logo, não permite à Sua Igreja
ligar nada errado na Terra, em termos de doutrina (fé e moral), como ensina o Catecismo
da Igreja:

“Para manter a Igreja na
pureza da fé transmitida pelos apóstolos, Cristo quis conferir à sua Igreja uma
participação na sua própria infalibilidade, ele que é a Verdade.  Pelo “sentido sobrenatural da fé”, o Povo de Deus
“se atém indefectivelmente à fé”, sob a guia do Magistério vivo da Igreja (LG,
12; DV, 10)”. (CIC, §889)

“O ofício pastoral  do Magistério está assim ordenado ao cuidado
para que o povo de Deus permaneça na verdade que liberta. Para executar esse
serviço, Cristo dotou os pastores do carisma 
da infalibilidade em matéria de fé e de costumes.” (CIC,§ 890) 

Afirma o nosso Catecismo,
sobre as indulgências que:

“A indulgência se obtém pela
Igreja que, em virtude do poder de ligar e desligar que Cristo Jesus lhe
concedeu, intervém em favor do cristão, abrindo-lhe o tesouro dos méritos de
Cristo e dos santos para obter do Pai das misericórdias as remissões das penas
temporais devidas aos seus pecados. Assim a Igreja não só vem em auxílio do
cristão, mas também o incita a obras de piedade, de penitência e de
caridade”(CIC, 1478).

O Papa Sixto IV (1471-1484),
na encíclica Romani Pontificis, assim se expressou:

“… Nós, a quem foi do alto
atribuída a plenitude do poder, desejando levar do tesouro da igreja Universal
constante dos méritos de Cristo e de seus Santos, auxílio e sufrágio às almas
do purgatório…”(DS 1406; DI, ref. 20).

O Papa Clemente VI (1342-1352),
na bula jubilar Unigenitus Dei Filius, afirmou:

“O Filho unigênito de Deus
adquiriu um grande tesouro para a Igreja Militante… Esse tesouro… quis ele
fosse distribuído aos fiéis para sua salvação por são Pedro, portador das
chaves do céu, e por seus sucessores, seus vigários na terra, e fosse, por
motivos particulares e razoáveis, a fim de remir ora completamente a pena
temporal devida ao pecado, misericordiosamente aplicado, em geral ou em
particular, como diante de Deus se julgasse mais útil, aos que, verdadeiramente
penitentes se tivessem confessado. Sabe-se que os méritos da Bem-aventurada Mãe
de Deus e de todos os eleitos contribuem para a riqueza desse tesouro”. (DI,
ref. 36)

Paulo VI  confirma o papel ímpar da Igreja, ao
administrar as indulgências, pelo poder que Cristo lhe deu:

“Com efeito, na indulgência,
usando de seu poder de administradora da redenção de Cristo Senhor, a Igreja
não se contenta com rezar, mas por sua autoridade abre ao fiel convenientemente
disposto o tesouro das satisfações de Cristo e dos Santos pela remissão da pena
temporal.” (DI,8)

Na  epístola Sacrosancta Portiunculae, ele ensina
que:

“A indulgência, concedida
pela Igreja aos que fazem penitência, é uma manifestação desta maravilhosa
comunhão dos santos, que misticamente une, pelo único laço da caridade de
Cristo, a Bem-aventurada Virgem Maria, os cristãos triunfantes no céu, os que
estão no purgatório e os que ainda não terminaram sua peregrinação pela terra.
A indulgência, dada por intermédio da igreja, diminui pois e até suprime a pena
que impede de algum modo a mais íntima união do homem com Deus. Aquele que faz
penitência acha portanto nessa forma singular da caridade eclesial, auxílio
para lançar fora o velho homem e revestir o novo “que foi renovado no
conhecimento conforme a imagem daquele que o criou” (Cl 3, 10)” (AAS 59 [1966],
pp. 633-634; DI, ref. 38).

A  COMUNHÃO DOS 
SANTOS  E O ” TESOURO DA IGREJA ”      

Com a sua Encarnação e
Paixão, Jesus adquiriu um Tesouro infinito de graças para a humanidade, diante
de Deus, e confiou este Tesouro à Sua Igreja. A chave deste Tesouro foi dada a
Pedro e seus sucessores. Santa Catarina de Sena, nos “Diálogos”, escreveu esta
palavra do Pai:

“Foi na dispensa da
hierarquia da Igreja que eu guardei  o
Corpo e o Sangue do meu Filho”.

Não só o tesouro da
Eucaristia, mas todos os méritos de Cristo foram confiados à Igreja.  

Falando deste “tesouro da
Igreja”,  o Catecismo ensina que eles são
os bens espirituais da comunhão dos santos, “que não é uma soma de bens
comparáveis às riquezas materiais acumuladas no decorrer dos séculos, mas é o
valor infinito e inesgotável que tem junto a Deus as expiações e os méritos de
Cristo nosso Senhor, oferecidos para que a humanidade toda seja libertada do
pecado e chegue à comunhão com o Pai. É em Cristo, nosso redentor, que se
encontram em abundância as satisfações e os méritos de sua redenção”. (cf. Hb
9, 11-22; 7, 23-25)

Paulo VI nos ensina também
que:

“Pertence além disso a esse
tesouro o valor verdadeiramente imenso e incomensurável e sempre novo que tem
junto a Deus as preces e as boas obras da Bem-aventurada Virgem Maria e de todos
os santos que, segundo as pegadas de Cristo Senhor, por sua graça se
santificaram e totalmente acabaram a obra que o Pai lhes confiara; de sorte que
operando a própria salvação, também contribuíram para a salvação de seus irmãos
na unidade do corpo místico”. (ID, 5)

O fundamento da doutrina das
indulgências está portanto baseado no dogma da Comunhão dos Santos.

Ainda o nosso Catecismo
ensina que:

“A união dos que estão na
terra com os irmãos que descansam na paz de Cristo, de maneira alguma se
interrompe; pelo contrário, segundo a fé perene da Igreja, vê-se fortalecida
pela comunicação dos bens espirituais” (CIC, §955;  LG, 49)

Na Constituição Apostólica
sobre as Indulgências, o Papa Paulo VI ensina que:

“Por insondável e gratuito
mistério da divina disposição, acham-se os homens unidos entre si por uma
relação sobrenatural. Esta faz com que o pecado de um prejudique também os
outros, assim como a santidade de um traga benefícios aos outros.  Assim se prestam os fiéis socorros mútuos
para atingirem o seu fim eterno. O testemunho desta união é evidente no próprio
Adão, pois seu pecado passa a todos os homens por propagação hereditária. Mas o
mais alto e mais perfeito princípio, o fundamento e o modelo dessa relação
sobrenatural, é o próprio Cristo, no qual Deus nos chamou a ser inseridos” (DI,
4)

Jesus deixou esta verdade
bem clara ao dizer:

“Eu sou a videira, vós sois
os ramos. Quem permanece em mim e eu nele, esse dá muito fruto”(Jo 15,5).

São Paulo ensina a verdade
da comunhão dos santos:

“Ora, vós sois o corpo de
Cristo e cada um de sua parte é um de seus membros”(1Cor 12,27).

“Nós, embora sejamos muitos,
formamos em Cristo um só corpo, e cada um de nós somos membros uns dos
outros”.(Rm 12,5)

Todas essas passagens, e
muitas outras (1 Cor 1,9 e 10,17; Ef 1, 20-23 e 4,40), confirmam a realidade da
união dos batizados no único Corpo de Cristo.

Na Encíclica Mystici
Corporis, o Papa Pio XII (1939-58), ensinou claramente que:

“Desta mesma comunicação do
Espírito de Cristo segue-se que …  a
Igreja vem a ser como o complemento e plenitude do Redentor; e Cristo como se
completa na Igreja… que é na terra como outro Cristo e faz as suas vezes”.

” A vida de cada um dos
filhos de Deus em Cristo se acha unida por admirável laço à vida de todos os
outros  irmãos cristãos na sobrenatural
unidade do corpo místico de Cristo, como uma única pessoa mística.” (ID, 5)

Ensina Paulo VI, que na
comunhão dos santos: “existe certamente entre os fiéis já admitidos na pátria
celeste, os que expiam as faltas no purgatório e os que ainda peregrinam na
terra, um laço de caridade e um amplo intercâmbio de todos os bens”. ( idem)

Desta forma, ensina o
Catecismo que:

“O cristão que procura
purificar-se de seu pecado e santificar-se com o auxílio da graça de Deus não
está só.”(CIC,1474)

A realidade e a beleza da
comunhão dos fiéis no corpo místico de Cristo, garante que “cada um se
beneficia da santidade dos outros, bem para além do prejuízo que o pecado de um
possa ter causado aos outros. Assim, o recurso à comunhão dos santos permite ao
pecador contrito ser purificado, mais cedo e mais eficazmente, das penas do
pecado”. (CIC, §1475)

Portanto, garante a Igreja
que podemos auxíliar os nossos irmãos falecidos:

“Uma vez que os fiéis
defuntos em vias de purificação também são membros da mesma comunhão dos
santos, podemos ajudá-los obtendo para eles indulgências, para libertação das
penas temporais devidas por seus pecados.”(CIC, §1479)

Ao falar do dogma da
comunhão dos santos, o Papa Leão XIII (1878-1903) disse, na encíclica Mirae
Caritatis:

“A comunhão dos santos não é
outra coisa senão a comunhão de auxílio, de expiação, de preces,  de benefícios entre os fiéis já na pátria
celeste ou ainda entregues ao fogo purificador ou peregrinando ainda na terra, construindo
todos uma só cidade, cuja cabeça é Cristo, cuja forma é a caridade”. (DI, ref.
18)

Pio XII, na Mystici Corporis
ensina que:

“De tal maneira Cristo
sustenta a Igreja que ela é como uma segunda personificação de Cristo”. (DI,
ref. 19)

Lembra o mesmo Papa que, de tal
forma Cristo se identificou com a Igreja, o Seu Corpo, que quando Paulo a
perseguia, Ele gritou do céu: “Saulo, Saulo, por que Me persegues?”(At 9, 4).

O Papa Leão X (1513-1521),
no  decreto Cum Postquam, a Caetano de
Vio, legado papal, fala também de “… dispensar o tesouro dos méritos de Jesus
Cristo e dos Santos… “(DS 1448; cf. DS 1467 e 2641; DI, ref. 20).

O Concílio Vaticano II
também deixou bem claro o mistério da comunhão dos santos:

“Com efeito, todos os que
são de Cristo, por terem recebido seu Espírito, se acham unidos numa só Igreja
e nele aderem uns aos outros (cf. Ef 4, 16). A união dos viajores com os irmãos
adormecidos na paz de Cristo, longe de se romper, pelo contrário, se acha
reforçada pela comunicação dos bens espirituais, conforme a imutável crença
recebida na Igreja. Do fato de sua íntima união com Cristo, mais ainda
confirmam os bem-aventurados na santidade a Igreja inteira… e de várias
maneiras contribuem na crescente obra de sua edificação (cf. 1Cor 12, 12-27).
De fato, uma vez acolhidos na pátria celeste e permanecendo junto ao Senhor
(cf. 2Cor 5, 8), por ele, com ele e nele não cessam de interceder por nós junto
ao Pai, oferecer os méritos que na terra adquiriram, graças a Cristo Jesus,
único Mediador, entre Deus e os homens (cf. 1Tm 2, 5), servindo ao Senhor em
tudo e acabando o que falta às tribulações de Cristo em sua carne a favor de
seu Corpo que é a Igreja (cf. Cl 1, 24). Eis portanto uma ajuda muito preciosa
que sua fraternal solicitude traz à nossa fraqueza”. (LG, 49)

Paulo VI, ao falar da
penitência da Igreja, ensina  que “em
tudo isto, entretanto, não se pensava que cada um dos fiéis operasse apenas com
os próprios recursos pela remissão dos pecados dos outros irmãos; cria-se de
fato que a Igreja, como um corpo, unida a Cristo seu chefe, satisfazia em cada
um de seus membros. (DI, 6)

Tertuliano de Cartago
(?202), no século II,  já registrava este
ensinamento:

“Não pode o corpo se alegrar
com o sofrimento de um só membro; é necessário que todo ele se doa e colabore
para a cura. Num e noutro estão a Igreja, já que a Igreja é Cristo. Portanto
quando te ajoelhas junto ao irmão abraças a Cristo, suplicas a Cristo. De modo
semelhante quando eles choram sobre ti é Cristo que suplica ao Pai. O filho
sempre alcança facilmente o que pede”( DI, ref. 30).

Inspiradas pelo Espírito Santo

A aplicação das
indulgências, foi aos poucos sendo entendida pelos Pastores da Igreja, com a
assistência do Espírito Santo. Afirma Paulo VI que:

“A convicção existente na
Igreja de que os Pastores do rebanho do Senhor podem por meio da aplicação dos
méritos de Cristo e dos Santos libertar cada fiel dos restos de seus pecados
introduziu aos poucos no correr dos séculos, pelo sopro do Espírito Santo que
sempre anima o Povo de Deus, o uso das indulgências; uso pelo qual se efetuou
um progresso, não uma mudança, na doutrina e na disciplina da Igreja, e da raiz
que é a Revelação brotou um novo bem para a unidade dos fiéis e de toda a
Igreja.

Pouco a pouco se propagou o
uso das indulgências e se tornou um fato notório na história da lgreja desde
que os Pontífices Romanos decretaram que certas obras favoráveis ao bem geral
da Igreja “poderiam  ser imputadas
ao  título de  uma 
penitência  total “; e aos fiéis
“verdadeiramente penitentes, que tivessem confessado seus pecados” e
realizassem tais obras esses mesmos Pontífices “pela misericórdia de Deus e…
confiando nos méritos e na autoridade dos apóstolos”, “na plenitude do poder
apostólico” concediam “o perdão não só pleno e abundante, mas até o mais cabal,
de todos os seus pecados”. (DI,7)

O  Concílio de
Clermont (1095), que incentivou as Cruzadas, 
no cânon  2, concedeu indulgências
aos que partissem para a Terra Santa, afim de libertar o santo sepulcro :

“Todo aquele que só por
devoção, não para obter honra ou dinheiro, partir para libertar a Igreja de
Deus em Jerusalém, considerar-se-á essa viagem como uma penitência plena”. (DI,
ref. 34)

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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