A Cientologia

Entre as
novas correntes religiosas de nossos dias está a cientologia, que conta com
cerca de sete milhões de adeptos esparsos por 30 países. Trata-se de uma escola
muito singular, porque funde numa só mensagem concepções religiosas, exercícios
de psicotécnica e busca de dinheiro e poder. Examinemos suas idéias.

O fundador
da cientologia foi o norte-americano Lafayette Ron Hubbard (1911-1986). Desse
personagem não se tem biografia muito fidedigna, alguns de seus familiares
romperam com a cientologia e emitiram depoimentos sobre Hubbard que não são
verídicos.

Sabe-se,
porém, que era filho de um oficial da Marinha, tendo viajado pelo Oriente e
estudado a dianética, ciência que explica como funciona o intelecto humano.
Publicou, em 1950, alguns escritos sobre o assunto, e 1954 fundou a Igreja da Cientologia, baseada na dianética.

Suas
idéias lhe suscitaram o antagonismo da classe médica, que o denunciava por
charlatanismo e exploração da credulidade pública. Por isso, durante algum
tempo viveu a bordo da nave Apolo, de onde dirigia sua organização, que veio a
se tornar uma espécie de congregação religiosa. Passou em retiro os últimos
anos de sua vida, que terminou em 1986. 

     

      Cicatrizes
de vidas pregressas

 

Hubbard
concebe o ser humano como uma máquina que necessita de conserto. Segundo ele, a
mente humana, limitada como é, não permite ao indivíduo tomar consciência de
que seu destino é sobreviver após a morte. O homem traz em si muitas
cicatrizes, decorrentes de ferimentos psíquicos que sofreu em encarnações
anteriores. Assim, sempre que o cansaço ou um ba­que toca numa dessas
cicatrizes, a mente traz à tona os acontecimentos desagradáveis que a afetaram
em existências pregressas.

                      É preciso
apagar tais cicatrizes e comunicar ao sujeito o otimismo derivado da
perspectiva de feliz imortalidade. A cientologia tem precisamente em vista
libertar o homem dos seus “engramas” (cicatrizes) e o levar às
condições de “clear”, que
implicam no aumento do QI, na melhora da saúde física e no sucesso dos negócios.
A dianética realiza essa terapia em sessões chamadas “auditing”, nas quais a pessoa, através da regressão no tempo,
considera os ferimentos que recebeu outrora e se dispõe a apagá-los
definitivamente da memória.

O mais
importante engrama é o primeiro de todos, o “basic-basic”,
que pode ter sido uma tentativa de aborto que sacrificaria o interessado,
uma enfermidade da mãe ou mesmo uma relação sexual da genitora durante a
gravidez. No decorrer da sessão psicoterapêutica é utilizado um aparelho
chamado “E-meter”, eletrômetro inventado por Hubbard para permitir ao “preclear” se recordar mais
rapidamente dos traumas psíquicos de outrora e averiguar o apagamento dos
mesmos. Quando todos os engramas tiverem sido apagados, o indivíduo terá não
mais uma mente reativa, mas uma mente analítica, atingindo então as condições
de clear.

O caminho da dianética até o estado de clear resulta caro. Os dirigentes da cientologia observam, no
entanto, que os outros tipos de psicoterapia também não são baratos; além do
que, seriam inúteis, pois não atinariam com o essencial (os engramas).
Observe-se ainda que os remédios psicotró­picos e as intervenções cirúrgicas
são tidos pela cientologia como violações dos direitos humanos.

 

 

A ética como “rolo compressor”

 

Pode-se
dizer que as concepções éticas da cientologia são contraditórias. De um lado,
esta escola propõe finalidades transcendentais; de outro, tem os olhos voltados
para a conquista de dinheiro e poder. São palavras de Hubbard: “A única razão
em virtude da qual existem organizações é oferecer bens materiais e serviços
aos seus membros em troca de uma contribuição, e procurar pessoas famosas às
quais esses bens possam ser oferecidos… Todas as organizações da Igreja da
Cientologia foram fundadas unicamente em vista deste objetivo”. Assim,
pode-se dizer que, conforme os cientólogos, a promoção da humanidade e a venda
de benefícios (como livros e cursos) são coisas inseparáveis umas das outras.

A ética é
explicitamente conceituada como a superação de todo tipo de resistência ao
programa da cientologia. É, como diz Hubbard, “o rolo pressor que aplaina a
estrada”. Nesta perspectiva, não há lugar para a tolerância em relação aos
adversários; não há respeito para com aqueles que pensem diversamente. No livro
Ética da Cientologia são tidos como
meios legítimos para conseguir manter e expandir o poderio da escola “a
corrupção moral, a agressão física, os prejuízos materiais, a perseguição e o
esmagamento de quem professe outra filosofia, a violência contra os
inimigos”. Os que criticam e combatem a cientologia são considerados por
seus membros inimigos do gênero humano, visto que a corrente é tida como a
única via de sobrevivência da humanidade. Por conseguinte, o fim justifica os
meios.

Tais concepções e a
aplicação prática das mesmas estão confiadas ao “inspetor geral da
ética”, que é um dos membros graduados da escola. Compreende-se, então,
que a cientologia vem a ser uma tentativa de criar um grande império, dotado de
poderosa economia, que procura ganhar dinheiro e aumentar seu capital enquanto
apregoa a desencarnação dos seus mem­bros. Num dos folhetos programáticos da
cientologia, por sinal, lê-se: “Make money,
make more money” (Faça dinheiro, faça mais dinheiro).

Todo membro que tenha
contato com indivíduo infenso à cientologia é tido como “Potential-Trouble-Source (PTS)” (Fonte de Potencial de
Perturbações), ao passo que o infenso é chamado de “Suppressive Person (SP)”. A pessoa PTS é munida contra
as críticas e objeções que lhe venham da SP; caso a PTS se mostre influenciada
pelas críticas, é submetida a tratamento especial; ou a castigo, sendo-lhe
sonegados alguns serviços da escola.

A
cientologia quer ser ciência exata, técnica psicoterápica, filosofia e
religião”. Na verdade, porém, é uma mescla de psicotécnicas, teorias reencarnacionistas
e ciência de ficção (“fantaciência”). Em conseqüência, já foi definida
como “um budismo tecnológico”. Por suas promessas de benefícios corpóreos
e espirituais, consegue atrair muitos adeptos, os quais não se recusam a pagar
os altos custos correspondentes à iniciação cientológica. Não poucos destes se
projetam, assim, na ruína financeira, sem conseguir nenhu­ma vantagem de ordem
psíquica ou espiritual; antes, tornam-se mais e mais dependentes dos seus
mestres-orientadores.

Deve-se
também observar que a cientologia incorre no desrespeito à pessoa humana,
submetendo-a a uma estrutura totalitária. Pretende ser a única cosmo visão
aceitável, de modo que aqueles que não compartilham de suas idéias são
considerados inimigos dos seus discípulos e da espécie huma­na em geral. O amor ao próximo
é, pois, algo de estranho a esta corrente, como estranhos lhe são os direitos
humanos e a proteção devida à família.

Em
linguagem religiosa, pode-se dizer que a cientologia ensina a auto-salvação ou
a redenção do indivíduo pelo indivíduo, sem levar em conta a graça ou o auxilio
de Deus. De resto, o conceito de Deus é vago na cientologia, aproximando-se do
panteísmo, já que o âmago (thetan) do
homem é tido como “espírito que existe desde o princípio, onisciente e
imortal”. Donde se vê que é despropositado o nome de “Igreja”
atribuído à cientologia.

Por fim,
resta salientar que muitas famílias norte-americanas e européias lamentam os
males causados pelo fascínio vazio exercido pela cientologia sobre as jovens
gerações.

 

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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