A Ciência desafia e sufoca a Religião? – Parte 2

Milagres e “Milagres”

O autor do panfleto rejeita
e ridiculariza os milagres nos termos seguintes :

“É a ciência que opera
verdadeiros milagres.  Quem tem dor de
cabeça, não precisa de invocar os Santos; tome um Doril e a dor passa.

No caso de doenças mais
graves, a participação da ciência é hoje muito mais importante.  Já morreu muita gente de influência, de
apendicite, de tuberculose, de tifo, de peste bubônica, de cólera-morbo, de
lepra, de doença-de-chagas, de paralisia infantil, de sífilis, de
doença-do-sono, de febre amarela, de câncer, de Aids, etc.  Mas milhões de pessoas foram salvas pela
ciência com terapêutica, remédios químicos, cirurgias e transplantes.  Nunca ninguém melhorou (comprovadamente) com
rezas, a não ser no caso de distúrbios psíquicos, que o psiquiatra também
resolve”.

Que é Milagre?

A propósito é de notar que a
Igreja se mostra muito cautelosa ao falar de milagres.  Tem consciência de que muitos fenômenos
maravilhosos são explicáveis pelas ciências da natureza e pela
parapsicologia.  A Igreja submete cada
caso tido como portentoso a séria investigação e, apesar do crivo científico
(apoiado por um “Advogado do Diabo”), os próprios cientistas verificam haver
fenômenos que a ciência de hoje não explica nem vê como explicar no
futuro.  Mais precisamente, três são os
requisitos para que a Igreja reconheça a autenticidade de um milagre.

1)  Trate-se de um fato histórico ou realmente
ocorrido (pois muitas vezes os casos apresentados como milagres não
correspondem, em parte ou de modo nenhum, à realidade histórica).  O exame da historicidade já elimina muitos
portentos.  Tal exame é efetuado no local
mesmo onde o possível portento ocorreu; os peritos civis e eclesiásticos há de
ter todo interesse em não trabalhar sobre logros e ilusões.

2) O fato comprovado como
histórico seja absolutamente inexplicável pela ciência nem se veja alguma
possibilidade de que venha a ser explicada futuramente.

3) O fato cientificamente
inexplicável deve ter ocorrido em contexto digno de Deus, de modo que possa ser
tido como genuíno sinal ou resposta de Deus aos fiéis que o imploravam.

Lourdes

Um dos espécimens típicos do
rigor com que a Igreja procede na apuração dos fatos tidos como portentosos, é
o que se dá em Lourdes (França).

Existe nesta cidade o Bureau
des Constatations Médicates (Centro das Averiguações Médicas), que examina as
pessoas que se dizem curadas por ocasião de peregrinações à Gruta de
Massabielle1 , são trinta a cinqüenta casos por anos.  Após verificar a cura real e duradoura de
algum paciente, esse Comitê envia o caso a Paris, onde uma Comissão Médica
Internacional, composta de grandes especialistas de qualquer orientação
religiosa ou filosófica, se reúne anualmente para estudar os casos que os
médicos de Lourdes tenham julgado inexplicáveis pela ciência.  Tais casos são então minuciosamente
analisados, discutidos e submetidos a votação para se  definir se realmente podem ser considerados
fora do alcance da Medicina.  Dado que os
médicos cheguem  a esta conclusão, a
autoridade eclesiástica iniciará o processo religioso propriamente dito para
averiguar se realmente tal ou tal portento pode ser tido como resposta ou sinal
de Deus aos homens.

É de notar que, dentre 5.000
curas averiguadas em Lourdes, nem mesmo cem foram pela Igreja proclamadas
milagrosas: sete entre 1858 e 1862;  23
entre 1907 e 1913; 24, de 1946
a 1970 …

O Santo Sudário de Turim

O autor das folhas
panfletárias se refere ironicamente ao Santo Sudário de Turim, recentemente
salvo de um incêndio. – Eis o que a propósito se pode dizer:

De 10 a 12 de junho de 1993
realizou-se em Roma o II Congresso Internacional sobre o Santo Sudário
promovido pela Sociedade francesa intitulada “Centre International d’Etudes sur
le Linceuil de Turin” (CIELT). 
Participaram do certame cerca de duzentos peritos, aos quais se
dirigiram cinqüenta conferencistas em clima estritamente científico e aconfessional.  Entre as conclusões apresentadas, destaca-se
a rejeição do teste do Carbono 14, efetuado em 1988, como metodologicamente
impreciso.  Novas descobertas após tal
data vieram confirmar a antigüidade do Sudário e fizeram progredir o estudo da
imagem e do homem de tal mortalha: 
confirma-se a impressão de que tal homem foi realmente Jesus;
pesquisadores judeus que participaram da assembléia, levaram sua contribuição,
comparando traços do Sudário com os costumes judeus de sepultamento, com os
traços étnicos dos israelitas e com a tecelagem judaica de outrora.

No primeiro semestre de 1996
descobriram-se vestígios de uma Segunda moeda colocada, esta, sobre o olho
esquerdo do homem que estava envolvido nessa peça mortuária.  Tal moeda (lepton) foi reconhecida como
datada dos anos 29/30 d.C., ou seja, dos tempos do Senhor Jesus.  Este achado mais uma vez afasta a hipótese de
se tratar de um pano medieval e corrobora a tese da autenticidade do Sudário.  Os vestígios da outra moeda, colocada sobre o
olho direito do cadáver conforme os costumes de sepultamento dos antigos, já
foram encontrados em 1979.  É de crer,
pois, que o Sudário seja genuíno. 
Todavia deve-se notar que a fé não se baseia na autenticidade de alguma
relíquia ou de alguma descoberta científica.

Sexualidade e Celibato

É tão veemente o ataque do
panfleto ao celibato que se torna inconveniente reproduzir sua linguagem. – Em
resposta observemos:

O homem celibatário não é um
assexuado, mas sim alguém que dirige todo o seu amor (e ele o tem como qualquer
ser humano) a um ideal que ultrapassa os bens corpóreos.  Esta concentração de aspirações e energias
não é exclusiva de religiosos, mas foi (e é) praticada por homens e mulheres
que se dedicam à ciência, à arte, à filantropia …, como aponta a história
universal.  No caso do Cristianismo, a
vivência do celibato é ainda mais fortemente motivada, como se depreende dos
dizeres de São Paulo em 1 Cor 7, 29-35: o Reino de Deus se fez presente sobre a
Terra mediante a Encarnação do Verbo, de modo que há interesse, da parte do
cristão, em se voltar, tanto quanto possível, para os valores definitivos,
deixando de lado o que possa dificultar a inteira dedicação ao Eterno presente
no tempo:

“29 Eis o que vos digo,
irmãos: O tempo se fez breve.  Resta,
pois, que aqueles que têm esposa sejam como se não a tivessem; 30os que choram,
como se não chorassem; os que se alegram como se não se alegrassem; os que
compram, como se não possuíssem; 31  os
que usam deste mundo, como se não usassem, porque é transitória a figura deste
mundo.

32  Desejo que vivais sem preocupações.  Quem não tem esposa, cuida das coisas do
Senhor e do modo de agradar ao Senhor. 33 Quem tem esposa, cuida das coisas do
mundo e do modo de agradar à esposa. 
Fica dividido.

34  A mulher que não é casada e a virgem pensam
nas coisas do Senhor, para serem santas de corpo e de espírito.  A que é casada, pensa nas coisas do mundo e
no modo de agradar ao marido.

35 Digo-vos isto em vosso
interesse, não para vos amar cilada, mas tendo em vista o que é nobre e vos
facilita a permanência junto ao Senhor, sem interrupção”.

O ambiente fortemente
erotizado em que vivem os cidadãos de nossos dias torna incompreensível a
muitos a grandeza da vida una ou indivisa. 
É plenamente humana, dotada dos afetos naturais do ser humano,
orientados para o amor a Deus que não passa, e ao próximo.  Esse amor vem a ser altamente fecundo em
favor dos irmãos, aos quais se dedicam, direta ou indiretamente, aqueles e
aquelas que abraçam a vida una.

1  Semelhante órgão foi criado em Fátima com a
mesma finalidade, conforme notícia divulgada por La Documentation Catholique
nº 1984, 21/05/89, p. 513 :  “No decorrer
de uma entrevista coletiva à imprensa em Fátima aos 11/03/89, foi anunciada a
criação de uma Comissão Médica Nacional encarregada de averiguar eventuais
curas extraordinárias atribuídas à intercessão de Nossa Senhora de Fátima ou
aos videntes Francisco e Jacinta Marto. 
Sob a direção do prof. Daniel Pinto Serrão, ela consta de dez
professores das Universidades de Lisboa, Porto e Coimbra, especialistas em
diversos setores das ciências médicas, como a cardiologia, a pediatria, a
cirurgia, a neurologia, a psiquiatria, a radiologia… Declarou o respectivo
presidente:  A Comissão é estritamente
independente tanto do ponto e vista eclesiástico como do religioso”.

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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