Uma superstição moderna

Por Rodrigo R. Pedroso

    Já é um lugar comum dizer-se que o homem moderno tem a mais entranhada desconfiança para com as verdades escritas no Evangelho e aceita com a mais passiva credulidade o que vem publicado no jornal. Entretanto, ainda que tenha virado lugar comum tal julgamento, não deixa de ser salutar uma tentativa de aprofundá-lo, pois muitas vezes a verdade contida nos lugares comuns nos passa despercebida.
    Se hoje tudo o que vem da Igreja é encarado por pessoas supostamente cultas com uma injustificada e preconceituosa suspeita, para o comum dos humanos as matérias dos jornais parecem caídas do céu. E com a maior beatice há quem tome pelos fatos mesmos aquilo que não passa de uma versão jornalística, construída sabe-se lá de que maneira e para atender a sabe-se quais interesses. Ainda que no geral e na teoria haja quem reclame da mídia, no particular e na prática é raríssimo encontrar quem veja as matérias jornalísticas com o indispensável olhar crítico. A fetichização do jornal é o resultado correspondente da alienação do leitor.
    Esquece-se, ou melhor, oculta-se que o jornal é feito por homens, com seus defeitos, vícios e interesses; que o jornal é o produto de uma indústria que precisa dar lucro e está sujeita às mesmas contingências que outra empresa qualquer. Aliás, pouco se comenta sobre as dificuldades econômicas das empresas jornalísticas e como isso torna vulnerável a sua imparcialidade e capacidade de informação, sujeitando-as a pressões políticas e financeiras, de dentro e de fora do país.
    É interessante notar que as matérias jornalísticas, salvo no que toca aos editoriais e artigos de opinião, são apresentadas num tom de absoluta neutralidade e impessoalidade, como se fossem os fatos a falar por si. Porém, tal linguagem, aparentemente neutra e impessoal, mascara sutil e insidiosamente a manipulação dos fatos na construção da versão. A ostensiva neutralidade da linguagem jornalística oculta que os fatos que viram notícia estão sujeitos a uma seleção prévia dos aspectos que devem ser publicados, seleção que pode deformá-los seriamente. Além disso, a apresentação dos aspectos previamente selecionados dos fatos ainda pode carregar embutida uma interpretação, feita a partir de pontos de vista que podem não ser os nossos e que serve a determinados interesses.
    Caso exemplar é o da cobertura jornalística que a imprensa concede, no Brasil, à questão do aborto e de outras ligadas à defesa da vida humana, como a do emprego de células-tronco embrionárias. Apesar de ser a legalização do aborto repudiada por mais de dois terços da população brasileira, o viés abortista das matérias publicadas pela mídia secular é facilmente constatável por qualquer um que leia os jornais fazendo uso de suas prerrogativas de animal racional. A posição pró-cultura da vida é relegada a poucos artigos de opinião, menos para causar verdadeiro impacto e mais para legitimar a aparente “imparcialidade” do órgão de imprensa, que supostamente permitiria a expressão do “outro lado” – enquanto o abortismo é veiculado subliminarmente e sem contestação nas matérias aparentemente neutras do noticiário. Manifestações pró-cultura da vida, por exemplo, muitas vezes não são sequer noticiadas e, quando são, procura-se minimizar a sua repercussão. A questão mais específica do aborto em caso de anencefalia foi uma vergonha: aproveitando-se da natural dificuldade de uma questão que envolve complicados conhecimentos científicos, a mídia manipulou a massa a ponto de fazer crer que os bebês anencéfalos estariam em “morte cerebral” – quando, na verdade, apesar de privados de parte do cérebro, eles possuem tronco encefálico funcionando.
    Tudo isso avulta a grande importância e responsabilidade dos órgãos de comunicação social católicos, como a Canção Nova. Neste sentido, não podemos deixar de citar um trecho da emblemática e pioneira Pastoral Coletiva dos Bispos do Brasil, de 19 de março de 1890: «Há, porém, uma forma de que quiséramos ver-vos revestir hoje mais particularmente o vosso amor para com a Igreja: quiséramos ver-vos todos empenhados na difusão da imprensa católica como um meio de atalhar quanto possível os estragos da imprensa ímpia».
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Rodrigo R. Pedroso, com 32 anos de nascido, é brasileiro, casado, advogado graduado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (FD/USP), mestrando em filosofia política pela FFLCH/USP e procurador da Universidade de São Paulo. Críticas, dúvidas e sugestões podem ser enviadas para o correio eletrônico rpedroso01@terra.com.br.

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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