Palavras de João Paulo II sobre o Concílio Vaticano II

A propósito da celebração dos 40 anos do Concilio Vaticano II (1962-65) a Editora Cléofas publica importantes palavras de João Paulo II sobre o Concílio.

Oração do Papa João XXIII no Concílio Vaticano II

Repita-se no povo cristão o espetáculo dos Apóstolos reunidos em Jerusalém, depois da Ascensão de Jesus ao céu, quando a Igreja nascente se encontrou reunida em comunhão de pensamento e de oração com Pedro e em torno de Pedro, pastor dos cordeiros e das ovelhas.
Digne-se o divino Espírito escutar da forma mais consoladora a oração que sobe a Ele de todas as partes da terra. Que Ele renove em nosso tempo os prodígios como de um novo Pentecostes e conceda que a santa Igreja, permanecendo unânime na oração, com Maria, a Mãe de Jesus, e sob a direção de Pedro, dilate o reino do divino Salvador, reino de verdade e de justiça, reino de amor e de paz. Amém.

A Importância do Concílio Vaticano II
Papa João Paulo II – L’Osservatore Romano, 15/10/95

“Na história dos Concílios, ele reveste uma fisionomia muito singular. Nos Concílios precedentes, com efeito, o tema e a ocasião da celebração tinham sido dados por particulares problemas doutrinais ou pastorais. O Concílio Ecumênico Vaticano II quis ser um momento de reflexão global da Igreja sobre si mesma e sobre as suas relações com o mundo.

A essa reflexão impelia-a a necessidade de uma fidelidade cada vez maior ao seu Senhor. Mas o impulso vinha também das grandes mudanças do mundo contemporâneo, que, como “sinais dos tempos”, exigiam ser decifradas à luz da Palavra de Deus.

Foi mérito de João XXIII não só ter convocado o Concílio, mas também ter-lhe dado o tom da esperança, tomando as distâncias dos “profetas de desventura” e confirmando a própria e indômita confiança na ação de Deus.

Graças ao sopro do Espírito Santo, o Concílio lançou as bases de uma nova primavera da Igreja. Ele não marcou a ruptura com o passado, mas soube valorizar o patrimônio da inteira tradição eclesial, para orientar os fiéis na resposta aos desafios da nossa época.

À distância de trinta anos, é mais do que nunca necessário retornar àquele momento de graça. Como pedi na Carta Apostólica “Tertio milennio adveniente” (n.36) entre os pontos de um irrenunciável exame de consciência, que deve envolver todas as componentes da Igreja, não pode deixar de haver a pergunta: quanto da mensagem conciliar passou para a vida, as instituições e o estilo da Igreja?

Já no Sínodo dos Bispos de 1985 [sobre o Concílio] foi posto um análogo interrogativo. Ele continua válido ainda hoje, e obriga antes de mais a reler o Concílio, para dele recolher integralmente as indicações e assimilar o seu espírito… A história testemunha que os Concílios tiveram necessidade de tempo para produzir os seus frutos. Contudo, muito depende de nós, com a ajuda da graça de Deus. ” (L’Osservatore Romano, 15/10/95)

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II NO ENCERRAMENTO DO CONGRESSO INTERNACIONAL SOBRE A ATUAÇÃO DOS ENSINAMENTOS CONCILIARES – 27 de Fevereiro de 2000

1. O Concílio Vaticano II constituiu uma dádiva do Espírito à sua Igreja. É por este motivo que permanece como um evento fundamental não só para compreender a história da Igreja no fim do século mas também, e sobretudo, para verificar a presença permanente do Ressuscitado ao lado da sua Esposa no meio das vicissitudes do mundo. Mediante a Assembléia conciliar, que viu chegar à Sé de Pedro Bispos de todas as partes do mundo, pôde-se constatar que o patrimônio de dois mil anos de fé se conservou na sua originalidade autêntica.

2. Juntamente com o Concílio, a Igreja fez sobretudo uma experiência de fé, abandonando-se a Deus sem reservas, na atitude de quem confia e tem a certeza de ser amado. É precisamente este ato de abandono a Deus que, segundo um sereno exame das Atas, emerge com força. Quem desejasse aproximar-se do Concílio prescindindo desta chave de leitura, privar-se-ia da possibilidade de penetrar na sua alma mais profunda. É só numa perspectiva de fé que o evento conciliar se abre aos nossos olhos como um dom, do qual é necessário saber captar a riqueza ainda escondida.

Entretanto, voltam à mente as significativas palavras de São Vicente de Lérin:
“A Igreja de Cristo, cuidadosa e cauta guardiã dos dogmas que lhe foram confiados, jamais os altera; em nada os diminui e nada lhes adiciona; não a priva do que é necessário, nem lhe acrescenta o que é supérfluo; não perde o que é seu, nem se apropria do que pertence aos outros, mas com todo o zelo, recorrendo com fidelidade e sabedoria aos antigos dogmas, tem como único desejo aperfeiçoar e purificar aqueles que antigamente receberam uma primeira forma e esboço, consolidar e reforçar aqueles que já foram evidenciados e desenvolvidos, salvaguardar aqueles que já foram confirmados e definidos” (Commonitorium, XXIII).

3. Aos Padres conciliares apresentou-se um verdadeiro desafio, que consistia no compromisso de compreender mais intimamente, num período de rápidas transformações, a natureza da Igreja e a sua relação com o mundo para prover à oportuna “atualização”.
Enfrentamos este desafio também eu me encontrava entre os Padres conciliares e demos-lhe uma resposta, procurando uma compreensão mais coerente da fé.

4. Anunciar o Evangelho ao mundo é uma tarefa que os cristãos não podem delegar a outrem. Trata-se de uma missão que os identifica na responsabilidade própria da fé e da seqüela de Cristo! O Concílio quis restituir esta verdade fundamental a todos os fiéis.

… é necessário que não se perca de vista a intenção genuína dos Padres conciliares; pelo contrário, esta deve ser recuperada superando as interpretações desconfiadas e parciais que impediram de exprimir da melhor forma a novidade do Magistério conciliar.

Interpretar o Concílio pensando que ele comporta uma ruptura com o passado, enquanto na realidade ele se põe na linha da fé de sempre, é decididamente desviar-se do caminho.
Aquilo que foi acreditado por “todos, sempre e em cada lugar” é a autêntica novidade que permite a cada época sentir-se iluminada pela palavra da Revelação de Deus em Jesus Cristo.

5. O Concílio constitui um ato de amor: “Um grande e tríplice ato de amor” como disse Paulo VI no Discurso de abertura do IV período do Concílio um ato de amor “a Deus, à Igreja e à humanidade” (Insegnamenti, Vol. III [1965], pág. 475). A eficácia deste ato não se esgotou de forma alguma: ela continua a atuar através da rica dinâmica dos seus ensinamentos.

A Constituição dogmática Dei Verbum colocou com renovada consciência a Palavra de Deus no âmago da vida da Igreja. Esta centralidade deve-se à mais viva percepção da unidade da Sagrada Escritura e da Santa Tradição.

6. Aquilo em que a Igreja acredita é o que ela assume como objeto da sua oração. A Constituição “Sacrosanctum concilium” explicou quais são as premissas para uma vida litúrgica que preste a Deus o verdadeiro culto que Lhe é devido por parte do povo, chamado a exercer o sacerdócio na nova Aliança. A ação litúrgica deve permitir a cada fiel entrar no íntimo do mistério para captar a beleza do louvor ao Deus uno e trino. Com efeito, na terra ela constitui uma antecipação do louvor que as plêiades dos Beatos prestam a Deus no céu.

7. “Cremos ter chegado a hora em que a verdade acerca da Igreja de Cristo há-de ser aprofundada, ordenada e expressa”, afirmou o Papa Paulo VI no Discurso de abertura do II período do Concílio (Insegnamenti, Vol. I [1963], pp. 173-174). O inolvidável Pontífice identificou a principal tarefa do Concílio nesta expressão. A Constituição dogmática “Lúmen gentium” foi um genuíno cântico de exaltação da beleza da Esposa de Cristo. Naquelas páginas, completamos a doutrina expressa pelo Concílio Vaticano I e imprimimos o selo para um renovado estudo do mistério da Igreja.

A ninguém passará despercebido o fato de que, com grande impulso, o Concílio Vaticano II fez seu o anélito “ecuménico”. O movimento de encontro e clarificação, que se atuou com todos os irmãos batizados, é irreversível. É a força do Espírito que chama os fiéis à obediência, para que a unidade seja um eficaz manancial de evangelização.

8. “O Concílio, que nos ofereceu uma rica doutrina eclesiológica, uniu organicamente o seu ensinamento acerca da Igreja àquele sobre a vocação do homem em Cristo”: é quanto eu disse na Homilia para a abertura do Sínodo dos Bispos, no dia 24 de Novembro de 1985 (Insegnamenti, Vol. VIII, 2, pág. 1371). A Constituição pastoral Gaudium et spes, que levantava os interrogativos fundamentais aos quais cada pessoa é chamada a dar uma resposta, dirige hoje também a nós palavras que nada perderam da própria atualidade: “O mistério do homem só se esclarece verdadeiramente no mistério do Verbo encarnado” (n. 22).

9. A “pequena semente” que João XXIII lançou “com a alma e a mão trepidantes” (Constituição Apostólica Humanae salutis, 25 de Dezembro de 1961), na Basílica de São Paulo fora dos Muros no dia 25 de Janeiro de 1959, anunciando a intenção de convocar o XXI Concílio Ecumênico na história da Igreja, cresceu e deu vida a uma árvore que já alarga os seus ramos majestosos e frondosos na Vinha do Senhor. Ele já deu numerosos frutos nestes 35 anos de vida e ainda dará muitos outros nos anos vindouros. Uma nova estação abre-se diante dos nossos olhos: trata-se do tempo do aprofundamento dos ensinamentos conciliares, o período da colheita daquilo que os Padres conciliares semearam e a geração destes anos cuidou e esperou.

O Concílio Ecumênico Vaticano II constitui uma verdadeira profecia para a vida da Igreja; e continuará a sê-lo por muitos anos do terceiro milênio há pouco iniciado. A Igreja, enriquecida com as verdades eternas que lhe foram confiadas, ainda falará ao mundo, anunciando que Jesus Cristo é o único verdadeiro Salvador do mundo: ontem, hoje e sempre!

Prof Felipe Aquino

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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