Orientações pastorais sobre a Renovação Carismática Católica – CNBB (Parte 2)

C) Liturgia

38. “Na Liturgia,
especialmente na Eucaristia, celebra-se a realidade fundamental da Páscoa:
morte e ressurreição de Jesus Cristo, morte e ressurreição do batizado com
Cristo. Na ação litúrgica, devem encontrar espaço todas as realidades da vida
quotidiana do cristão, pois é com todos os aspectos da sua pessoa que ele tem
de passar deste mundo ao Pai. Ao participar na celebração, o cristão terá
presente suas aspirações, alegrias, sofrimentos, projetos, bem como os de todos
os seus irmãos. E colocará todas estas intenções na oração que sua comunidade,
com toda a Igreja, dirige ao Pai, com Cristo Salvador, na unidade do Espírito
Santo” (João Paulo II, Diretrizes aos Bispos do Brasil, Loyola, 1991, p.
44).

39. “A dimensão
litúrgica exprime, pois, o caráter celebrativo da Igreja. Constitui, na terra,
a expressão mais significativa da comunhão eclesial. Na Liturgia, o povo de
Deus encontra seu maior momento de festa e de comunhão eclesial” (CNBB,
Doc. 45 , n 92). Por isso, seja dada especial atenção à formação litúrgica de
todos os membros da RCC para maior compreensão e vivência do mistério e de sua
expressão simbólico-ritual e ministerial, visando uma autêntica prática
celebrativa, que leve em conta o espaço e o tempo litúrgico.

40. Nas celebrações,
observe-se a legislação litúrgica que, embora estabeleça normas precisas para
certos momento, abre amplo espaço para a criatividade. Não se introduzam
elementos estranhos à tradição litúrgica da Igreja ou que estejam em desacordo
com o que estabelece o Magistério ou aquilo que é exigido pela própria índole
da celebração.

41. Na celebração da Missa,
não se deve salientar de modo inadequado as palavras da Instituição, nem se
interrompa a Oração Eucarística para momentos de louvor a Cristo presente na
Eucaristia com aplausos, vivas, procissões, hinos de louvor eucarístico e
outras manifestações que exaltem de tal maneira o sentido da presença real que
acabem esvaziando as várias dimensões da celebração eucarística.

42. Os cantos e os gestos
sejam adequados ao momento celebrativo e de acordo com os critérios exigidos
para a celebração litúrgica. São preciosas e oportunas as orientações do
documento nº 43 da CNBB sobre “Animação da vida litúrgica no Brasil”.
Procure-se distinguir cantos para uso litúrgico e cantos para encontros.
Valorizem-se os Hinários Litúrgicos publicados pela CNBB, os Livros de Cantos
das Igrejas Particulares e outros Hinários difundidos entre o povo.

43. A Celebração Eucarística, a distribuição da Sagrada
Comunhão fora da Missa e o Culto Eucarístico realizem-se dentro das normas
litúgicas, as diretrizes da CNBB e as orientações do Bispo Diocesano.

44. Cuide-se para que não
haja coincidência de reuniões de grupos ou outras iniciativas da RCC com a
celebração da Santa Missa ou outras celebrações da comunidade eclesial.

D) Dimensões da vivência da

45. “Pela vivência do
mistério de Cristo na vida quotidiana, o Povo de Deus aprofunda constantemente
o sentido da fé” (CNBB, Doc. 45, 86). A própria dinâmica da fé comporta
tanto a dimensão pessoal e subjetiva, como a comunitária. “A fé nasce do
anúncio e cada comunidade eclesial consolida-se e vive da resposta pessoal de
cada fiel a esse anúncio” (RMi, 44).

46. “A experiência religioso-cristã
não se realiza em mera experiência subjetiva, mas no encontro com a Palavra de
Deus confiada ao Magistério e à Tradição da Igreja, nos sacramentos e na
comunhão eclesial” (CNBB, Doc. 45, nº 175). Isso faz parte do desígnio de
Deus a quem aprouve “chamar os homens a participar da sua própria vida,
não um a um, mas constituídos como povo, no qual seus filhos dispersos fossem
reconduzidos à unidade” ( AG 2)

47. A fé não pode ser reduzida a uma busca de satisfação
de exigências íntimas e de resposta às necessidades imediatas. Nem se pode
propor a fé cristã sem a dimensão da cruz, inerente ao seguimento de Jesus
Cristo (Cf. Lc 14, 25-35), caminho para a vida plena na ressurreição.

48. É fundamental para a
realização da vida cristã e da ação pastoral o sentido comunitário da fé. A
formação de pessoas e de comunidades vivas e maduras na fé é resposta aos
desafios da Nova Evangelização e da ação missionária. A Missão nasce da Fé em Jesus Cristo e
fortifica-se quando partilhada (cf. RMi, 4 e 2).

49. A espiritualidade cristã integra o social e o
espiritual, o humano e o religioso. Não está, porém, isenta das ambigüidades e
mesmo distorções que podem caracterizar as reações do psiquismo humano, seja
individual, seja grupal. Por isso, evite-se alimentar um clima de exaltação da
emoção e do sentimento, que enfatiza apenas a dimensão subjetiva da experiência
da fé.

50. Para expandir o projeto
de Deus, o cristão deve comprometer-se com a criação de uma sociedade justa e
solidária, eliminando o pecado como gerador de divisão com Deus e os irmãos. A
dimensão social da fé, à luz da Doutrina Social da Igreja, requer a luta para
debelar as estruturas de pecado: pessoal, comunitário, social e estrutural, e
assim estabelecer o Reino de Cristo e de Deus (cfr. LG, 5). Recomenda-se, pois,
que membros dos grupos de oração sejam animados a assumir projetos de promoção
humana e social, especialmente dos pobres e marginalizados.

51. A evangélica opção preferencial pelos pobres é um dom
do Espírito Santo à Igreja, que é também concedido, como carisma especial, a
alguns grupos de cristãos leigos, a certas famílias religiosas e a muitos
fiéis. Segundo a recomendação do apóstolo: “aspirai aos carismas
melhores” (1 Cor 12,31), a vivência da opção pelos pobres deve ser
desejada e implorada por todos como carisma precioso, a ser vivido em nossos
dias, como sinal da presença do Reino.

53. A falta de coerência entre a fé que se professa e a
vida quotidiana é uma das várias causas que geram pobreza em nosso país. Os
cristãos nem sempre souberam encontrar na fé a força necessária para penetrar
os critérios e as decisões dos setores responsáveis pela organização social,
econômica e política de nosso povo (cf. DSD 161).

E) Questões Particulares

54. Alguns temas necessitam
de maior aprofundamento teológico, diálogo eclesial e orientação pastoral, tais
como: Batismo no Espírito Santo, dons e carismas, dom da cura, orar e falar em
línguas, profecia, repouso no Espírito, poder do mal e exorcismo.

55. A palavra “Batismo” significa tradicionalmente
o sacramento da iniciação cristã. Por isso, será melhor evitar o uso da
expressão “Batismo no Espírito”, ambígua, por sugerir uma espécie de
sacramento. Poderão ser usados termos como “efusão do Espírito
Santo”, “derramamento do Espírito Santo”. Do mesmo modo, não se
utilize o termo “confirmação” para não confundir com o sacramento da
crisma (Cf. Comissão Episcopal de Doutrina, Comunicado Mensal, Dez de 1993,
2217).

56. Dons e Carismas: O
grande dom, que deve ser por todos desejado, é o da caridade: “Aspirai aos
dons mais altos. Aliás, passo a indicar-vos um caminho que ultrapassa a
todos…” (1 Cor 12, 31-13,13). “A caridade é o primeiro dom e o mais
necessário, pelo qual amamos a Deus acima de tudo e o próximo por causa
dele” (LG, 42).

57. “O Espírito Santo
unifica a Igreja na comunhão e no ministério. Dota-a e dirige-a mediante os
diversos dons hierárquicos e carismáticos” (LG, 4). O Espírito opera
“pelas múltiplas graças especiais, chamadas de carismas, através das quais
torna os fiéis aptos e prontos a tomarem sobre si os vários trabalhos e ofícios
que contribuem para a renovação e maior incremento da Igreja” (Catecismo
da Igreja Católica, 798). Os carismas devem ser recebidos com gratidão e
consolação. E não devem ser temerariamente pedidos nem se ter a presunção de
possui-los (cf. LG 12).

58. Haja muito discernimento
na identificação de carismas e dons extraordinários. Diante das pessoas que
teriam carismas especiais, o juízo sobre sua autenticidade e seu ordenado
exercício compete aos pastores da Igreja. A eles em especial cabe não extinguir
o Espírito, mas provar as coisas para ficar com o que é bom (cfr. 1 Tes
5,12.19.21). Assim, também no que se refere aos carismas, a RCC se atenha
rigorosamente às orientações do Bispo Diocesano.

59. Dom da cura: O Senhor dá
a algumas pessoas um carisma especial de cura, para manifestar a força da graça
do Ressuscitado. No entanto, as orações mais intensas não conseguem obter a
cura de todas as doenças. São Paulo aprende do Senhor que “basta minha
graça, pois é na fraqueza que minha força manifesta todo seu poder” (2 Cor
12, 9), e que os sofrimentos que temos que superar podem ter como sentido
“completar na minha carne o que falta às tribulações de Cristo pelo seu
corpo, que é a Igreja” (Cl 1,24).

60. Ao implorar a cura, nos
encontros da RCC ou em outras celebrações, não se adote qualquer atitude que
possa resvalar para um espírito milagreiro e mágico, estranho à prática da
Igreja Católica (cf. Eclo 38, 11-12).

61. Nas celebrações com
doentes, não se usem gestos que dão a falsa impressão de um gesto sacramental
coletivo ou que uma espécie de “fluido espiritual” viesse a operar
curas.

62. O Óleo dos Enfermos não
deve ser usado fora da celebração do Sacramento. Para não criar confusão na
mente dos fiéis, quem não é sacerdote não faça uso do óleo em bênção de
doentes, mas use apenas o Ritual de Bênçãos oficial da Igreja.

63. Orar e falar em línguas:
O destinatário da oração em línguas é o próprio Deus, por ser uma atitude da
pessoa absorvida em conversa particular com Deus. E o destinatário do falar em
línguas é a comunidade. O apóstolo Paulo ensina: “Numa assembléia prefiro
dizer cinco palavras com a minha inteligência para instruir também aos outros,
a dizer dez mil palavras em línguas” (1 Cor 14,19). Como é difícil
discernir, na prática, entre inspiração do Espírito Santo e os apelos do
animador do grupo reunido, não se incentive a chamada oração em línguas e nunca
se fale em línguas sem que haja interprete.

64. Dom da profecia: Na
Bíblia, profeta é o que fala em nome de Deus. Significa, pois, um
evangelizador. É a comunicação de assuntos espirituais aos participantes de
reuniões comunitárias, aos quais se dirigem palavras de exortação e
encorajamento. “Aquele que profetiza, fala aos homens: edifica, consola, exorta”
(1 Cor 14,3). É um dom para o bem da comunidade e não tem em vista adivinhações
futuras.

65. Haja grande
discernimento quanto ao dom da profecia, eliminando qualquer dependência mágica
e até supersticiosa.

66. Em Assembléias, grupos
de oração, retiros e outras reuniões evite-se a prática do assim chamado
“repouso no Espírito”. Essa prática exige maior aprofundamento,
estudo e discernimento.

67. Poder do mal e
exorcismo: Cristo venceu o demônio e todo o espírito do mal. Nem tudo se pode
atribuir ao demônio, esquecendo-se o jogo das causas segundas e outros fatores
psicológicos e até patológicos.

68. Quanto ao “poder do
mal”, não se exagere a sua importância. E não se presuma ter o poder de
“expulsar” demônios. O exorcismo só pode ser exercido de acordo com o
que estabelece o Código de Direito Canônico (Cân. 1172). Por isso, seja
afastada a prática, onde houver, do Exorcismo exercido por conta própria.

69. Procure-se ainda formar
adequadamente as lideranças e os membros da RCC para superar uma preocupação
exagerada com o demônio, que cria ou reforça uma mentalidade feitichista,
infelizmente presente em muitos ambientes.

CONCLUSÃO

70. As orientações aqui
oferecidas são expressão da solicitude pastoral com que o episcopado brasileiro
acompanha a RCC seu carisma próprio dentro do legítimo pluralismo, mas também
mostrando sua preocupação com desvios ocorridos, que são prejudiciais para a
RCC e para toda a Igreja.

71. Seja este um ponto de
partida para uma nova e mais fecunda etapa em que a RCC há de buscar sua maior
integração nas Igrejas Particulares, em conformidade com as Diretrizes da CNBB
na fidelidade à missão da Igreja.

72. Pedimos a Deus que
abençoe os membros da RCC e a todos que se empenham, nos dias de hoje, com
humildade e confiança a viver a vocação à santidade e o compromisso
missionário. Maria, Mãe da Igreja, interceda para que todos, no seguimento de
Jesus Cristo, aspirando aos diversos dons do Espírito, procurem sempre o amor
que permanece (1 Cor 14,1).

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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