O médico e a objeção de consciência

Objeção de consciência significa que ninguém legalmente pode ser obrigado a fazer algo contra a consciência, especialmente ferindo seus valores morais e espirituais. O Concílio Vaticano II, afirmou: “Na intimidade da consciência, o homem descobre uma lei. Ele não a dá a si mesmo. Mas a ela deve obedecer. Chamando-o sempre a amar e fazer o bem e a evitar o mal, no momento oportuno a voz desta lei ressoa no íntimo de seu coração… É uma lei inscrita por Deus no coração do homem… A consciência é o núcleo secretíssimo e o sacrário do homem, onde ele está sozinho com Deus e onde ressoa sua voz.” (Gaudium et Spes, 16).

Se a pessoa viola a sua consciência e a esmaga, perde a dignidade. Dizia o cardeal Newman que a “A consciência é o primeiro de todos os vigários de Cristo”. (Carta ao Duque de Norfolk). E Santo Agostinho pedia: “Volta à tua consciência, interroga-a… Voltai, irmãos, ao interior e em tudo o que fizerdes atentai para a testemunha, Deus” (Comentário Ep. São João 8,9).

A ministra Eleonora Menicucci, da Secretaria de Políticas para Mulheres, criticou a falta de médicos nos serviços que fazem aborto legal no País, noticiou o Jornal “O Estado de São Paulo”, em 15/3/2012. A ministra constatou que em muitos centros alguns médicos não realizam o “aborto legal” por objeção de consciência. Disse a ministra que: “É preciso que esses serviços coloquem outra pessoa no lugar”. Atualmente, existem no país 63 centros cadastrados para realização desse tipo de atendimento, outros 30 estão sendo capacitados para também fazer o aborto nos casos permitidos pela lei.

Que “se coloque outra pessoa no lugar”, mas que o médico que não aceite fazer o aborto não seja punido ou prejudicado. A ministra foi elogiada pelos grupos feministas, mas foi contestada pelo representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) no conselho, Clóvis Bonfleur. “Religião é um direito que tem de ser respeitado. É preciso pensar em alternativas”.

Ora, é um direito e dever do médico católico não praticar qualquer tipo de aborto, pois a Igreja ensina que se o fizer é excomungado, mesmo nos casos de gravidez provocada por estupro ou risco de vida da mãe, algo hoje muito raro. Quando há um estupro quem deve ser punido é o estuprador, e não criança levada a pena de morte pelo aborto. Matar o feto seria aplicar o Direito às avessas.

O Código de Direito Canônico da Igreja diz no cânon 1398:“Quem provoca aborto, seguindo-se o efeito, incorre em excomunhão “latae sententiae”. É a excomunhão automática, que não precisa ser aplicada pela autoridade eclesiástica. Isto mostra a gravidade do aborto em qualquer caso.  A nota de roda pé, do Pe. Jesus Hortal, diz o seguinte:“Advirta-se que o cânon não faz nenhuma exceção quanto ao tipo de aborto. A excomunhão atinge por igual a todos que intervém no processo abortivo, quer com a cooperação material (médicos, enfermeiras, parteiras, etc.) quer com a cooperação moral verdadeiramente eficaz (como o marido, o amante ou o pai que ameaçam a mulher obrigando-a a submeter-se ao procedimento abortivo). A mulher, não raramente não incorrerá na excomunhão por encontrar-se dentro das circunstâncias atenuantes do cânon 1324, §1,3 e 5”.

No caso de risco da mãe, a Igreja ensina que o médico deve dar todo tratamento necessário a ela, mesmo que isso possa causar, sem desejar, indiretamente,  a morte do feto; mas, jamais o aborto pode ser usado como método terapêutico neste caso. Não se pode matar o feto deliberadamente com a intenção de ajudar a mãe.

“Desde o século I, a Igreja afirmou a maldade moral de todo aborto provocado. Este ensinamento não mudou. Continua invariável. O aborto direto, quer dizer, querido como um fim ou como um meio, é gravemente contrário à lei moral. Deus, senhor da vida, confiou aos homens o nobre encargo de preservar a vida, para ser exercido de maneira condigna ao homem Por isso a vida deve ser protegida com o máximo cuidado desde a concepção. O aborto e o infanticídio são crimes nefandos” (Catecismo, §2271). “Não matarás o embrião por aborto e não farás perecer o recém-nascido.” (Didaquè 2,2)

O médico é formado para salvar a vida e não para matar. Portanto, diante de sua consciência e de sua fé, o médico católico, tem o direito e o dever de não aceitar praticar o aborto, em qualquer caso. É um direito inalienável da pessoa humana.

Me lembro que quando era diretor do campus da USP em Lorena (antiga FAENQUIL), éramos obrigados, por lei, a aplicar provas de Vestibular em dia que não fosse o sábado, para os fiéis “Adventistas de Sétimo Dia”, cuja fé não lhes permite realizar exames no sábado. Com todo respeito atendíamos a essa exigência da consciência dos vestibulandos. Outros exemplos semelhantes podem ser citados.

Desrespeitar a consciência de uma pessoa é retirar a sua dignidade e faltar com o respeito a ela. Portanto, exigir que profissionais de saúde realizem aborto, eutanásia, vasectomia, laqueaduras, etc., contra seus princípios morais e espirituais é desrespeito profundo ao ser humano. Jamais a objeção de consciência pode ser desrespeitada, sob pena de fazermos naufragar a civilização.

Prof. Felipe Aquino

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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