Missão da Igreja e Relativismo

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Registra-se em nossos dias a tendência a apagar a unicidade de Jesus Cristo como Salvador de todos os homens em prol de teorias que relativizam o valor e a veracidade dos artigos da fé católica. Tais teorias são impugnadas pelo magistério da Igreja, que fielmente proclama a singularidade de Jesus Cristo sem negar a possibilidade de salvação fora da Igreja Católica visível para aqueles que candidamente estão no erro, mas vivem conforme a sua consciência firme e sinceramente lhes propõe.

O Pe. Nicola Bux, teólogo do Papa, fez um pronunciamento sobre a missão da Igreja, que merece aprofundamento. Via Internet recebemos o teor de tal pronunciamento:

A missão da Igreja

Cidade do Vaticano (02/10/06) – “Antes é preciso encher a barriga e depois se poderá falar de Cristo”. Este é mais ou menos o slogan que circula há algumas décadas no ambiente missionário e que levou não poucos agentes a considerar que os fundos coletados devem amparar as obras sociais, antes e mais do que a obra de propagação da fé.

Por isso, fazer com que o homem encontre Jesus Cristo é a razão fundamental da missão da Igreja no mundo. Se os agentes missionários, principalmente aqueles que nas nações regulam a distribuição dos recursos materiais, que os bons fiéis do povo de Deus concedem generosamente, não colocam isso em primeiro lugar, não são diferentes dos agentes sociais e, Deus não o queira, dos lobos fantasiados de ovelhas no ovil do Senhor.

A oração e a adoração: um missionário ajoelhado diante do tabernáculo obtém muito mais conversões ao Senhor do que todas as obras sociais e caritativas. Mas tocamos um ponto delicado: a conversão. Estamos certos de que as obras missionárias têm esta intenção? Ou querem tacitamente deixar as coisas como estão? Que os pagãos ou, como for, os homens que permaneçam em sua religião, se salvam igualmente? Mas a missão serve justamente para não os deixar na ignorância de Cristo. Senão, para que deixar casa, irmãos e pátria para perder a própria vida? O Senhor pediu no início da sua missão justamente a conversão: “Arrependei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1,15).

O relativismo religioso nesses anos, sabe-se, introduziu entre os missionários a dúvida sobre a fé cristã: se serve realmente à salvação. Tal dúvida, lá onde não conduziu muitos a abandonar a missão, induziu outros a continuá-la, mas atenuando-a em favor da obra social. Deus não queira que sejam usados recursos financeiros para tal abnormidade. Não citaremos todo o magistério conciliar e pontifício, da Ad Gentes à redemptoris missio e à Dominus lesus, que exortam a impostar a missão da difusão do Evangelho para a salvação da humanidade. Eis a outra palavra: salvação, ou seja, ajudar a reencontrar o sentido da existência, que o homem frequentemente busca sem o saber. E que um pedaço de pão material não basta.

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O perigo do relativismo moral e religioso

Jesus Cristo, o único Salvador!

Em Cracóvia Bento XVI advertiu:

“Dos sacerdotes, os fiéis aguardam somente uma coisa: que sejam especialistas em promover o encontro do homem com Deus. Ao sacerdote não se pede que seja especializado em economia, em edilícia ou em política. Dele se espera que seja especialista na vida espiritual” (25 de maio de 2006).

Pergunta-se: quais as causas desse esmorecimento da pregação missionária? – É o que passamos a examinar:

Relativismo

Nos últimos decênios acentuou-se fortemente o diálogo inter-religioso, visando a aproximar os homens entre si e derrubar preconceitos e outras barreiras. Um dos efeitos deste fato foi à tendência a diminuir as diferenças religiosas, abrandando certas afirmações categóricas do Catolicismo, principalmente frente às religiões orientais, que têm sua longa tradição. Daí a revisão de certas atitudes e concepções teológicas, como vais abaixo demonstrado.

Certo agnosticismo

Deus não pode ser conhecido como tal, dizem, mas apenas em conceitos diversos que detêm cada qual uma certa faceta da verdade. Assim não haveria uma Verdade religiosa única, mas diversas verdades religiosas. Por isto os dogmas católicos estão sujeitos a revisão e reformulação desde que confrontados com outras crenças.

Mais: dizem que a Revelação cristã não pode ser plena e definitiva, pois é impossível que o Eterno e Absoluto se dê a conhecer ao intelecto finito e limitado do homem. Este está sempre evoluindo; só conhecendo a verdade parceladamente.

Historicidade e fidelidade dos Evangelhos

Os próprios Evangelhos não nos comunicam quem foi Jesus na sua realidade histórica, mas só nos dizem o que seus discípulos pensavam a respeito de Jesus.

Jesus Cristo

O Senhor Jesus é considerado um Mestre entre outros mestres enviados por Deus no decorrer da história. Daí a passagem de alguns teólogos do cristocentrismo para o teocentrismo. Cristo ocupa um lugar relativo ao lado de Buda, Confúcio, Maomé… Pode-se reconhecer a Cristo prerrogativa de excelência, mas nunca a dignidade de Deus Filho.

Pecado original

Há quem negue o pecado original cometido pelos primeiros pais – o que empalidece o fundo de cena da obra redentora de Cristo. Pode ocorrer que assim se apregoe um novo pelagianismo ou a salvação do homem não por graça do Salvador, mas pelos próprios esforços da criatura.

Escatologia

Não se vê como possa haver um inferno póstumo, incompatível com o amor de Deus. Consequentemente todos os homens se salvam. – A propósito dizemos: Deus quer que todos os homens se salvem (1Tm2, 4), mas nem todos aceitam o dom de Deus; voluntariamente se afastam e se condenam a ficar privados do encontro com Deus face-a-face: Deus respeita tal opção, mas não deixa de amar tais criaturas – o que concorre para atormentá-las; o amor de Deus é Sim, Sim para sempre.

Revelações

Se há outras revelações de Deus além da Revelação cristã, como dizem, também há outras religiões válidas, tão válidas quanto o Cristianismo. Por isto todas as religiões são equivalentes entre si e não há que procurar a conversão dos pagãos para a fé católica. Daí o esmorecimento das missões entre os fiéis católicos; aos missionários caberia apenas um papel de promoção social e cultural dos povos primitivos. – O que é falso.

Moral

Além de tais concepções errôneas de teor dogmático, contam-se vários desvios em Teologia Moral, que redundam em relativismo ético e que a encíclica Veritatis Splendor de João Paulo II põe em foco.

Em suma, a bibliografia a respeito de tais questões de fé e Moral é vasta. As novas proposições têm o aparente valor de tornar o Cristianismo e, de modo especial, o Catolicismo, mais simpático e atraente. O diálogo inter-religioso vem a ser mais fácil e as exigências éticas mais suaves. Os missionários poderão dispensar-se de ir para terras longínquas e de apregoar uma cosmovisão diferente daquela que povos não cristãos professam.

Os principais arautos do relativismo

Mais minuciosas informações a respeito das novas concepções teológicas podem ser encontras em PR 9/1958, p. 351 e 89/1967, p. 191: Teilhard de Chardin S. J. (1955).

Uma Admoestação do Santo Ofício assinalou nas obras deste autor “ambiguidades e erros tão graves que ofendem a doutrina católica”. Estavam em causa as noções de criação, pecado original, distinção, entre matéria e espírito. Esta censura encontrou resistência por parte de grupos de amigos do autor que não a aceitavam, de modo que o Sto. Ofício a reiterou aos 11/7/81.

PR 294/1986, p. 498: Charles Curran. Trata-se das posições do autor em matéria de Moral.

PR 433/1998, p. 256: Tissa Balasurya, teólogo asiático, que corre o risco de destruir por completo a mensagem cristã.

PR 439/1998, p. 363: Anthony de Mello S. J., outro escritor asiático, de cuja doutrina eis alguns traços que se espalharam entre fiéis católicos:

Substitua-se a revelação ocorrida em Cristo por uma intuição de Deus sem forma nem imagens; é preciso falar de Deus como se fosse um Vazio puro. Para ver a Deus, basta contemplar o universo. Nada se pode dizer sobre Deus, pois Ele não pode ser conhecido. Não tem sentido o problema da existência de Deus, que os teólogos querem provar mediante o raciocínio. Nem na Bíblia se encontram afirmações válidas sobre Deus. Aliás, os livros sagrados das diversas religiões impedem que as pessoas sigam o seu senso comum; as religiões, inclusive o Cristianismo, vêm a ser um obstáculo parta se descobrir à verdade. Pensar que o Deus da religião de cada um é o único verdadeiro Deus é fanatismo. Deus é uma realidade cósmica, vaga e onipresente; donde se segue que não se pode admitir personalidade em Deus.

PR 427/1997, p. 546: Juan Luís Segundo, autor da obra “A história perdida e recuperada”, e teólogo da libertação, que tenciona utilizar o marxismo na confecção do seu sistema; donde resulta o esvaziamento dos artigos de fé cristã. Segue-lhe as pegadas o brasileiro Leonardo Boff; ver PR 280/1985, p. 257; PR 249/1980, p. 365.

PR 470/2001, p. 240 Jacques Dupuis, impreciso em temática delicada.

PR 516/2005, p. 280: Rober Halght S. H., do qual se pode destacar o seguinte trecho: “Não é possível continuar afirmando… que o Cristianismo é a religião superior e que Cristo é o centro absoluto, ao qual se subordinam todas as mediações históricas”. Jesus de Nazaré seria o símbolo concreto que exprime a presença de Deus na história; é “pessoa finita”, que nunca se terá considerado “Salvador de todos os homens”; a sua morte não pode ser tida como “Morte expiatória e redentora”.

O dogma da SS. Trindade seria incompatível com o fato de que “Deus é uno e único”.

É necessário reconhecer as outras religiões como medianeiras da salvação no mesmo nível que o Catolicismo.

Perante tais correntes de pensamento, que tocam de perto o relacionamento do Catolicismo com outras crenças religiosas, pergunta-se

Qual a posição da Igreja?

A atitude da Igreja estritamente justa e equilibrada, evita o fanatismo cego e agressivo como também o laxismo relativista. Ei-la:

Deus se revela aos homens de duas maneiras:

– por via natural, mediante o espelho das criaturas e a voz da consciência, e

– por via sobrenatural, mediante a revelação feita através dos Patriarcas e Profetas bíblicos e, por excelência, por Jesus Cristo. Quem não conhece a revelação trazida por Cristo, encontra Deus no seu senso religioso inato que olha para o belo mundo e ouve a voz da consciência.

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Jesus Cristo é o único Salvador da humanidade. É inseparável de sua Igreja, que Ele constituiu sacramento de salvação. Toda salvação vem por Cristo q pela Igreja.

Há duas maneiras de pertencer à Igreja:

– a visível, que é a dos que professam o mesmo Credo, recebem os mesmos sacramentos e obedecem à mesma hierarquia;

– a invisível, que é a de quem não conhece o Evangelho sem culpa própria, mas vive de acordo com sua consciência cândida e sincera; Deus não lhe revelou o Cristo e sua Igreja; por isto não arguirá tal pessoa a respeito, mas pedir-lhe-á contas da sua fidelidade a Deus, que fala por vias naturais a todo homem; para tais pessoas existe salvação não por causa do erro que professam, mas por causa da candura e sinceridade com que o professam, julgando ser a verdade; salvam-se, porém, pó Cristo e a Igreja. É o que a Constituição Lúmen Gentium professa no seu nº 16:

“Aqueles, portanto, que, sem culpa, ignoram o Evangelho de Cristo e sua Igreja, mas, com coração sincero, buscam a Deus e se esforçam, sob o influxo da graça, por cumprir com obras a Sua vontade, conhecida pela voz da consciência, também esses podem alcançar a salvação eterna. Nem a Divina Providência nega os meios, necessários para a salvação, àqueles que, sem culpa, ainda não chegaram ao conhecimento explícito [expressam agnitionem] de Deus, mas procuram, com a graça divina, viver retamente. De fato, tudo o que neles há de bom e verdadeiro, considera-o a Igreja como preparação evangélica e dom Daquele que ilumina todo homem para que venha afinal a ter vida”.

D. Estevão Bettencourt, osb
Revista: PERGUNTE E RESPONDEREMOS

Nº 535 – Ano: 2007 – p.15

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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