Mensagem de Dom Carmo Rohden, Bispo de Taubaté, à plenária do Brasil sem Aborto

29 DE JUNHO DE 2008

Caríssimos irmãos e irmãs em em Cristo,

Estamos aqui reunidos para definir estratégias de ação em vista das  ameaças que surgiram contra a vida depois do julgamento da ADIN 3510 pelo Supremo Tribunal Federal.

Creio que é importante contextualizar a magnitude destas ameaças antes de definirmos nossas ações.

O que estamos enfrentando não é uma tendência natural da opinião pública a favor da cultura da morte, que inclusive no Brasil cresce visivelmente em sentido contrário, mas uma nova forma de terrorrismo  internacional, em que dezenas de milhares de profissionais de alto nível, entre pesquisadores, cientistas sociais, médicos, administradores, juristas, politicos e comunicadores executam um trabalho coordenado e financiado a nível mundial para a execução de um meticuloso plano de longo prazo para impor à sociedade uma nova estrutura impregnada pelo que o Santo Padre veio cunhar como a cultura  da morte: o permissivismo sexual, a educação sexual liberal, o homossexualismo, a introdução de modelos aternativos de família, a
desagregação da família tradicional, o aborto, a eutanásia, o suicídio assistido e, por último, o pior de todos estes males, a clonagem humana, de que a experimentação com embriões é apenas o primeiro passo para sua introdução na sociedade.

Até o momento a América Latina tem sido um bastião de resistência contra este novo terrorrismo, mais pela sua formação predominantemente cristã, do que por ter tomado clara consciência das causas que estão patrocinando tais mudanças em todo o mundo.

Em todos os países de nosso continente estão sendo introduzidos no sistema escolar novos livros de texto sobre educação sexual que ensinam em detalhes todas as técnicas pelas quais os jovens podem manter relações sexuais entre si mas que, estranhamente, em nenhum lugar menciona-se sequer a existência do que chamamos de família e matrimônio. Estranho que os educadores altamente gabaritados de toda
a América Latina tenham-se esquecido, quando pretendem ensinar de caso pensado sexualidade a toda uma nação, de mencio origens destes textos tem mostrado repetidamente que quando se introduz um livro de um determinado tipo em um país latino americano, logo em seguida o mesmo tipo de livro é introduzido no mesmo ano escolar ou no seguinte em quase todos os demais países de nosso continente e que
estas obras são elaborados por uma rede de organizações não governamentais que são financiadas pelas mesmas fundações americanas que, com o apoio de nossos governos, financiam a promoção do aborto em todo o continente. Não é possível esconder a existência de uma perversa orquestração por trás destes fatos.

No México a Suprema Corte local acaba de realizar esta semana a última audiência pública antes que os juízes decidam sobre a constitucionalidade da legalização do aborto em todo o país. De acordo com a decisão, o aborto poderá tornar-se legal em toda a nação, e daí estender-se a toda a América Latina. Os promotores do aborto, ouvidos na última sexta feira, alegaram, tal como já fizeram no Brasil, que o México assinou compromissos internacionais com a ONU pelo qual se obrigou a implantar o aborto em seu país. O mesmo foi alegado na Colômbia pela Suprema Corte local quando legalizou o aborto em 2005 e abriu as portas para a total despenalização da prática. Neste mesmo ano de 2005 nosso governo assinou compromissos similares neste sentido, mas mais explícitos, com as Nações Unidas. Desde 1996 a ONU tem
reiterado, praticamente todos os anos, em documentos oficiais, que a defesa dos direitos humanos e do direito à vida obriga os países da América Latina à despenalização do aborto.

No Uruguay, por orientação de médicos brasileiros que trabalham para as  organizações Rockefeller, em 2004 o Ministério da Saúde introduziu um protocolo de aborto seguro, pelo qual os médicos tanto da rede pública como particular são obrigados a ensinar às gestantes que manifestam a intenção de praticar o aborto sobre como realizá-lo do modo mais seguro, inclusive receitando-lhe antibióticos para a fase pré aborto e garantindo-lhe assistência médica para a fase imediatamente pós aborto e apontando-lhe através de quais medicamentos poderão iniciá-lo em suas próprias residências do modo mais seguro. Já que os médicos não estão fazendo eles mesmos o aborto, o Ministério alega que estes profissionais não incorrem no crime de aborto. Poderiam incorrer no artigo do Código Penal que tipifica a indução ao crime, mas neste ponto o Ministério defende-se afirmando que não há indução, já que a gestante iria fazer o aborto de qualquer maneira, mas apenas redução de danos, para que pelo menos ela não se mate a si mesma ao praticar o aborto. Na prática o protocolo é aplicado diversamente que na teoria. Embora todos os médicos sejam obrigados pelo protocolo a ensinar em detalhes às gestantes sobre como abortar, aqueles que não o querem fazer por enquanto não estão sendo molestados. Em
compensação, os que estão de acordo estão abrindo serviços de aconselhamento ao aborto patrocinados pelo poder público. As gestantes que aí comparecem e que são ensinadas não são apenas aquelas decididas a fazer um aborto a qualquer custo, mas qualquer pessoa que deseje aprender como praticar um aborto em sua própria
residência. Tratam-se na verdade de centros de apologia ao crime que estão sendo abertos porque encontrou-se uma brecha no sistema legal.

O sistema está prosperando, no ano passado abriram-se centros em todos os principais bairros de Montevidéu e este ano o sistema está sendo expandido para o interior. Estima-se que cada semana 300 novas mulheres estejam aprendendo a abortar por meio deste sistema no Uruguay. Como consequencia desta iniciativa, em 2006 o governo do Reino Unido instituiu o Fundo de Ação para o Aborto Seguro
(Safe Abortion Action Fund) para expandir a iniciativa uruguaia em toda a América Latina. A este fundo somaram-se a IPPF e os governos da Suécia, Dinamarca, Noruega e Suíça. Em outubro de 2007 foi organizado em Londres um mega congresso para promover a iniciativa a nível internacional. Este ano realizou-se em Montevideu um outro congresso regional com cerca de mil participantes dos principais países da América do Sul para expandir imediatamente, com o apoio dos países da União Européia e da IPPF, a iniciativa aos demais países de nosso continente. Cuba,
onde o aborto está legalizado há décadas, foi convencida a modificar, até o fim deste ano, os procedimentos de aborto de cirúrgicos para químicos, aparentemente para mostrar tanto Cuba como o Uruguay como vitrines bem sucedidas da nova estratégia aos demais países da América Latina. Ao que tudo indica, aproveitando-se de
um vazio legal em nossos códigos, a redução de danos está para tornar-se a mais nova estratégia das organizações transnacionais na grande batalha para impor a cultura da morte aos países da América Latina, Ásia e África. Faz-se necessário introduzir o mais rapidamente possível novas leis que estabeleçam o crime de “divulgar ou anunciar processo, substância ou objeto destinado a provocar aborto, e instruir ou orientar gestante sobre como praticar aborto, ou prestar-lhe qualquer auxílio para que o pratique, ainda que sob o pretexto de redução de danos”.

No Equador a Assembléia Constituinte tem feito ouvidos surdos à população que tem pedido que a nova Constituição do país reconheça o direito à vida desde a concepção. A Conferência Episcopal Ecuatoriana acaba de divulgar uma denúncia segundo a qual, ao contrário, os constituintes determinaram no artigo 8 que “toda pessoa tem direito a decidir quando e quantos filhos ter”. Este direito se oferece como ilimitado e absoluto, sem a cláusula condicionante do respeito aos direitos estabelecidos nos demais artigos. A inviolabilidade genérica à vida, estabelecida no artigo primeiro, dá margem ao direito absoluto dos pais, justamente porque recusou-se a determinar desde quando é inviolável a vida.
“Qualquer pessoa pode entender”, concluem os bispos equatorianos,”que eleva-se à condição de direito a possível decisão de abortar, tomada em qualquer momento da gravidez. O pai e a mãe do nascituro, com seu direito a decidir quando querem ter um filho, poderiam optar por não tê-lo na véspera do parto”.

No Brasil, várias organizações, com a conivência do governo federal, estão preparando o caminho para que seja possível a legalização do aborto. Entre elas merece atenção especial o IPAS, órgão documentalmente ligado ao assessoramento e
financiamento internacional de clínicas de aborto clandestinas, e que já reconheceu publicamente haver assessorado tecnicamente o Ministério da Saúde do Brasil na elaboração das Normas Técnicas sobre o Aborto Legal publicadas pelo Ministro Humberto Costa. Além de apoiar o aborto clandestino, fato denunciado mundialmente pela literatura especializada, o IPAS no Brasil  promove livremente há mais de uma década cursos regulares de capacitação em técnicas de aborto provocado em maternidades e hospitais escolas de praticamente todas as unidades da federação,
para cerca de mil novos médicos por ano.

No Brasil o STF, ao julgar a constitucionalidade das pesquisas com embriões, laramente assentou jurisprudência pela qual pode abrir-se o caminho para a declaração de inconstitucionalidade da criminalização do aborto. Vários ministros alegaram que não há personalidade legal antes do nascimento e que, portanto, embora possa haver proteção à vida, não se pode falar em direito à vida para o
nascituro. O princípio foi aplicado sofisticamente pelos mesmos ministros aos embriões congelados não implantados, sob a alegação adicional de que estes não seriam viáveis e, portanto, não possuiriam sequer vida em potencial, de onde não faria sentido proteger uma vida que não existe nem potencialmente. Nossa diocese
divulgou um extenso documento mostrando que a ciência mostra, ao contrário, que estes embriões são viáveis. Estes fatos, fartamente conhecidos pelo mundo desenvolvido, foram ocultados de tal maneira pela imprensa que até mesmo em reuniões de médicos, quando foram comentados os dados deste relatório, a reação geral foi de espanto e assombro. Não temos dúvida de que está se abrindo no
Brasil, propositalmente, o caminho judicial para a legalização progressiva do aborto, como ocorreu nos Estados Unidos e na Colômbia.

Todos estes ataques somente poderão cessar a partir do momento em que seja reconhecida na Constituição a personalidade do nascituro desde o momento da fertilização. Até que não se defina o nascituro como pessoa, as leis não poderão protegê-lo. Como poderiam fazê-lo,  se nem sequer o reconhecem como pessoa?

Pouco adianta, neste sentido que, não se reconhecendo explicitamente a personalidade senão após o nascimento, reconheça-se a natureza humana desde a concepção, ou que se reconheça a proteção à vida desde a concepção. Nenhum dos ministros de nosso Supremo Tribunal, inclusive os que durante o julgamento da ADIN 3510 se mostravam a favor do aborto, tiveram dificuldades em reconhecer que
a vida se inicia com a fertilização. Não teriam tido também dificuldades em reconhecer que esta vida, que se inicia na fertilização, seria de natureza humana, já que o que iria nascer do óvulo fecundado seria um homem e não uma tartaruga. O problema todo consiste em saber se este óvulo fecundado, já uma vida, e já uma
vida humana, é pessoa reconhecida como tal pela lei e pela Constituição. Pois, enquanto a Constituição não reconhecer explicitamente a personalidade do nascituro, sua vida poderá ser protegida como um bem valioso, como poderá ser protegida também a vida de um golfinho ou uma tartaruga, mas não como de uma pessoa que
tenha direito inviolável à vida.

Pensamos que o movimento a favor da vida deve seriamente estruturar uma  estratégia planejada para longo prazo pela qual se possa esclarecer e preparar o legislativo para reconhecer a personalidade do nascituro desde a fertilização. Pensamos também que temos uma excelente oportunidade de introduzir, anteriormente a uma emenda constitucional, estes mesmos conceitos em nossa lei ordinária através do recentemente proposto Estatuto do Nascituro, mais fácil de discutir e aprovar do que uma emenda constitucional, o qual pode declarar, entre outras coisas, que a personalidade do nascituro se inicia com a concepção.
O trabalho e o reconhecimento de tal disposição, ainda que através de uma lei ordinária, representará uma grande parte do caminho já aberto e preparado para a finalmente aguardada emenda constitucional.

Deus abençoe a todos os aqui presentes. Que o Senhor da vida ilumine
nossos passos nos ajude a defender a vida.

Cordialmente, em Cristo e Maria!

Dom Carmo João Rhoden, SCJ

Bispo da Diocese de Taubaté

Data Publicação: 07/08/2008

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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