Maria e a ressurreição de Cristo

1. Depois da deposição de Jesus no sepulcro, Maria “é a única que permanece a ter viva a chama da fé, preparando-se para acolher o anúncio jubiloso e surpreendente da ressurreição” (Alocução da Audiência geral, L’Osserv. Rom. ed. port., 6/4/96, pág. 12). A espera vivida no Sábado Santo constitui um dos momentos mais altos da fé da Mãe do Senhor: na obscuridade que envolve o universo, Ela entrega-se plenamente ao Deus da vida e, recordando as palavras do Filho, espera a realização plena das promessas divinas.

Os Evangelhos narram diversas aparições do Ressuscitado, mas não o encontro de Jesus com a sua Mãe. Este silêncio não deve levar a concluir que, depois da Ressurreição, Cristo não tenha aparecido a Maria; convida-nos, ao contrário, a procurar os motivos dessa escolha por parte dos evangelistas.

Supondo uma “omissão”, ela poderia ser atribuída ao fato que tudo o que é necessário para o nosso conhecimento salvífico é confiado à palavra de “testemunhas anteriormente designadas por Deus” (At. 10, 41), isto é, aos Apóstolos que “com grande poder” deram testemunho da ressurreição do Senhor Jesus (cf. At. 4,33). Antes que a eles, o Ressuscitado apareceu a algumas mulheres fiéis, por causa da sua função eclesial: “Ide dizer a Meus irmãos que partam para a Galileia, e lá Me verão” (Mt. 28,10).

Se os autores do Novo Testamento não falam do encontro da Mãe com o Filho ressuscitado, isto talvez seja atribuível ao fato que semelhante testemunho poderia ser considerado, por parte daqueles que negavam a ressurreição do Senhor, muito interessado, e portanto não digno de fé.

2. Os Evangelhos, além disso, referem um pequeno número de aparições de Jesus ressuscitado, e não certamente o relatório completo de quanto aconteceu nos 40 dias após a Páscoa. São Paulo recorda uma aparição “a mais de quinhentos irmãos, de uma só vez” (1 Cor. 15, 6). Como justificar que um fato conhecido por muitos não seja referido pelos Evangelistas, apesar do seu caráter excepcional? É sinal evidente de que outras aparições do Ressuscitado, embora estivessem no elenco dos notórios fatos ocorridos, não tenham sido mencionadas.

Como poderia a Virgem, presente na primeira comunidade dos discípulos (cf. At. 1, 14), ter sido excluída do número daqueles que se encontraram com o seu divino Filho, ressuscitado dos mortos?

3. É antes legítimo pensar que, de modo semelhante a Mãe tenha sido a primeira pessoa a quem Jesus ressuscitado apareceu. A ausência de Maria do grupo das mulheres que ao alvorecer se dirige ao sepulcro (cf. Mc. 16, 1; Mt. 28, 1), não poderia talvez constituir um indício do fato de Ela já se ter encontrado com Jesus? Esta dedução encontraria confirmação no dado que as primeiras testemunhas da ressurreição, por vontade de Jesus, foram as mulheres, que tinham permanecido fiéis ao pé da Cruz, e portanto mais firmes na fé.

Com efeito, a uma delas, Maria de Mágdala, o Ressuscitado, confia a mensagem a ser transmitida aos Apóstolos ( cf. Jo. 20,17-18). Também este elemento consente talvez pensar em Jesus que aparece em primeiro lugar à sua Mãe, Aquela que permaneceu a mais fiel e, na prova, conservou íntegra a fé.

Por fim, o caráter único e especial da presença da Virgem no Calvário e a sua perfeita união com o Filho no sofrimento da Cruz, parecem postular uma sua particularíssima participação no mistério da ressurreição.

Um autor do século quinto, Sedúlio, afirma que Cristo Se mostrou no esplendor da vida ressuscitada, antes de tudo, à própria Mãe. Com efeito, Aquela que na anunciação tinha sido a via do Seu ingresso no mundo, era chamada a difundir a maravilhosa notícia da ressurreição, para se fazer anunciadora da Sua vinda gloriosa. Inundada assim pela glória do Ressuscitado, Ela antecipa o “resplendor” da Igreja (cf. Sedúlio, Carmen Pascale, 5, 357-364, CSEL 10, 140 s.).

4. Sendo imagem e modelo da Igreja, que espera o Ressuscitado e que no grupo dos discípulos O encontra durante as aparições pascais, parece razoável pensar que Maria tenha tido um contato pessoal com o Filho ressuscitado, para gozar também ela da plenitude da alegria pascal.

Presente no Calvário durante a Sexta-Feira Santa (cf. Jo. 19, 25) e no cenáculo, no Pentecostes (cf. At. 1, 14), a Virgem Santíssima foi provavelmente testemunha privilegiada da ressurreição de Cristo, completando desse modo a sua participação em todos os momentos essenciais do Mistério pascal. Acolhendo Jesus ressuscitado, Maria é além disso sinal e antecipação da humanidade, que espera obter a sua plena realização mediante a ressurreição dentre os mortos.

No tempo pascal a comunidade cristã, ao dirigir-se à Mãe do Senhor, convida-a a alegrar-se: “Regina caeli, laetare. Aleluja!”, “Rainha do céu, alegra-te. Aleluia!”. Recorda assim a alegria de Maria pela ressurreição de Jesus, prolongando no tempo o “alegra-te” que lhe fora dirigido pelo Anjo na anunciação, para que se tornasse “causa de júbilo” para a humanidade inteira.


Fonte: L’Osservatore Romano, ed. port. n.21, 24/05/1997, pag. 12(240)
Do Livro: A VIRGEM MARIA – 58 Catequeses Do Papa João Paulo II

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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