Crise de fé, crise de moral

Um dos grandes desafios da Igreja atualmente é a questão ética: manipulação de embriões, aborto, casamento homossexual e canonização do comportamento gay, aviltamento da família, culto do consumismo e do bem-estar, eutanásia, etc.

Para o Papa Bento XVI, a crise ética atual nasce da crise de fé. Nossa civilização nasceu da fé cristã; nela e a partir dela seus valores desenvolveram-se. Sendo assim, a questão fundamental é a fé em Jesus Cristo, o encontro com a sua Pessoa – daí a preocupação do Papa em publicar um livro sobre Jesus. Ora, a fé no Salvador é um dom, uma graça, mas deve tornar-se um constante permanecer no Senhor, viver nele, até transformar-se num modo de ser, de viver e de compreender a realidade.

Como Bento XVI tantas vezes tem recordado, a fé nos faz ver e avaliar a partir de Deus – de Deus como se revelou em Jesus Cristo e é anunciado pela Igreja. Assim sendo, crer nos dá uma nova percepção da realidade e da vida, uma percepção mais global, mais profunda, mais verdadeira que qualquer outra percepção, gerada por qualquer outro ponto de vista, por válido e positivo que seja. O conhecimento provindo da fé nos ajuda a compreender Deus, nós mesmos e o próprio mundo. Tem-se, então, um conhecimento mais profundo que aquele filosófico e científico. Não que esses três modos de perceber a realidade se contraponham, mas, certamente, a fé abre novas possibilidades à ciência e à filosofia, pois, sem em nada forçar ou desfigurar os métodos dessas áreas de saber, no entanto, oferece-lhes uma possibilidade mais profunda para interpretar a realidade.

É somente como resposta do homem livre a Deus que se nos revelou e se nos deu em Jesus Cristo que se pode compreender a moral cristã. Não se trata de algo imposto de fora, mas das conseqüências de um sim livre, responsável e amoroso dado a Deus em Cristo. É importante recordar que todo amor é conseqüente, é exigente! É daqui que brota uma ética da fé: um modo de viver inspirado, fundado e alimentado pela fé em Cristo, que nasce do encontro vivo com ele. Bento XVI quis exprimir isso de modo muito belo na sua Encíclica Deus caritas est. Tal encontro, no entanto, porquanto seja pessoal, dá-se sempre no “nós” da Igreja. É na Comunidade dos crentes que ouve a Palavra, celebra os sacramentos e procura viver no Senhor, que o encontro pessoal com Cristo torna-se sempre objetivo, real e não fruto de uma ilusão ou de um delírio subjetivo. Um Jesus que não seja o Jesus da Igreja e presente na Igreja é um Jesus ilusório, fruto de nossos preconceitos.

Por isso, a moral tal como a Igreja apresenta, não é algo que nos vem de fora para impor, mas, na experiência de fé, torna-se expressão exigente de um amor radical: o de Deus que tanto amou a ponto de entregar o Filho, obediente em amor por nós até a morte de cruz, por um lado; e, por outro lado, o nosso amor, que deve concretizar-se na resposta concreta de dizer “sim” aos apelos do Senhor com um modo de pensar, julgar e agir próprios do Evangelho.

O pensamento do Santo Padre nos ajuda a perceber que a espiritualidade e a moral devem caminhar juntas. Uma moral sem espiritualidade seria um moralismo asfixiante e desumanizador. Se o mundo percebe a moral cristã assim, é exatamente porque falta a experiência viva e pessoal do encontro espiritual com Jesus Cristo! Por outro lado a espiritualidade verdadeira exige a moral: seguir a Cristo compreende não somente a intimidade com ele, mas também a resposta concreta aos seus apelos. Daqui nasce a moral cristã! Assim, o Papa nos quer fazer compreender que o liame que garante a nossa liberdade, por um lado, e a verdade cristã, por outro, é a fé-adesão-amor a Jesus Cristo, que, naturalmente, inclui a espiritualidade e a moral, dando um verdadeiro e global sentido à vida e à realidade.

A crise atual é gerada, sem dúvida, pela falta de tal experiência viva de Jesus! A solução? Reevangelizar a nossa cultura e a nossa sociedade. Mas, atenção: sem discursos ideológico, sem projetos pastorais mirabolantes, mas com a força e o entusiasmo simples, nascidos do amor provocado pela experiência de ter encontrado Jesus e por ele se encantado apaixonadamente!

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por D. Henrique Soares da Costa

Fonte:
http://costa_hs.blog.uol.com.br/arch2011-09-04_2011-09-10.html
 


 

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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