Células-tronco: Verdadeiras e falsas esperanças

Está em tramitação no Congresso Nacional o Projeto de Lei de Biossegurança (PL 9/2004), que foi recentemente votado no Senado Federal e que voltará à apreciação da Câmara dos Deputados.

Um dos pontos que mais polêmica tem causado é o da permissão, dentro de certas condições, da utilização de células tronco embrionárias para pesquisas objetivando a cura de doenças graves, para as quais a suposta terapia com as células tronco embrionárias humanas seria a única ou a última esperança. Em razão desse pressuposto, que é falso e sem nenhuma base científica, como se demonstrará adiante, busca-se afastar os gravíssimos empecilhos éticos de se matar, destruir um ser humano para fins de pesquisas. Os obstáculos éticos e jurídicos são insuperáveis, pois não é lícito nem admissível matar alguém para valer-se de seu corpo, ainda que com finalidade boa. Objetivando encobrir tal realidade, tem havido grave falseamento da verdade quanto ao atual estágio das pesquisas com as células tronco embrionárias humanas, com as quais não se tem obtido qualquer êxito que aponte para a cura de doenças, nem mesmo com ratos e camundongos. Ao contrário, nesses animais, que são imunodeprimidos induzidamente para que possa ocorrer a pega dos transplantes, são produzidos, em 50% dos casos,  teratomas, ou seja, tumores, quando neles são implantadas células tronco embrionárias humanas.

O que existe de concreto do ponto de vista estritamente científico são progressos altamente promissores nas pesquisas com as células tronco adultas humanas (aí incluídas as células tronco encontradas no cordão umbilical), com as quais  já se obteve resultados efetivos de curas parciais e totais com seres humanos, e isso em, escala crescente e cada vez mais abrangente.

Todavia, por desinformação e/ou em razão de interesses não revelados não tem sido divulgado, no mais das vezes, de modo adequado e preciso,  essas informações, mas, ao invés, tem se veiculado informações confusas, em que se atribui a cura de doenças decorrentes da utilização de tratamento células tronco adultas a células tronco embrionárias humanas.    

Exemplo muito claro disso foi o editorial de 11 de outubro de 2004 de um dos jornais de maior circulação em nosso país, em que se manifestava a favor da votação do Projeto de Lei nº 9/2004, no Senado Federal, no sentido da liberação das pesquisas com células tronco embrionárias humanas, afirmando que:
“…os deputados certamente serão sensíveis aos argumentos a favor da liberação das pesquisas com células tronco embrionárias, que se tornam particularmente convincentes na medida em que a terapia vai se tornando realidade, como no caso do menino italiano que foi curado de uma forma grave de anemia.
( . . .)
 …é uma dura realidade o sofrimento das vítimas de tantas doenças para quem essa terapia é a última esperança.”

Cabe aqui referir que a notícia disponível no meio médico especializado é no sentido de que a anemia, designada por “anemia de Fanconi”, vem sendo tratada, desde 2001 pelo Dr. Pasquini, com células tronco de cordão umbelical, que são células tronco adultas. Não se conhece, repita-se, qualquer relato científico de cura com células tronco embrionárias humanas.
   
O mesmo argumento de uma cura supostamente próxima ou à vista, embora com menos ênfase é utilizado pelo Jornal do Senado, edição do dia 11 de outubro de 2004, disponível no site do Senado Federal:

 “Depois de longo debate, o Senado aprovou o projeto da Lei de Biossegurança que autoriza o uso de células-tronco de embriões congelados há mais de três anos e que não seriam utilizados em processo de fertilização. Essas células têm a propriedade de transformar-se em diferentes tecidos do corpo humano e representam a esperança de cura para muitas doenças.”

As manifestações dos Senadores sobre o assunto, sinteticamente reproduzidas na p. 4 do Jornal do Senado, edição de 11 de outubro de 2004, demonstram que os Srs. Senadores fundamentaram seus votos sobre a matéria na suposição de cura para doenças degenerativas graves a partir da pesquisa com as células tronco embrionárias humanas, o que, como visto, não corresponde à realidade dos trabalhos científicos correspondentes, certo, ao invés, que as pesquisas com as células tronco adultas têm demonstrado evidência científica quanto a cura de várias doenças graves.

São muitos e crescentes os estudos demonstrando o êxito de pesquisas com células tronco adultas (dentre as quais se classificam as células tronco do cordão umbilical e da placenta), na cura de diversas doenças graves, recuperando tecidos ou órgãos lesados, dentre os quais tecido muscular, restauração de determinadas capacidades regenerativas de tecidos. A norte-americana Nadia Rosenthal,  coordenadora do Programa de Camundongos do Laboratório Europeu de Biologia Molecular – EMBL, em Monterotondo, na Itália, comunicou a existência de estudo demonstrando que as células tronco adultas podem ser utilizadas para atingir a regeneração em grande escala de um tecido danificado. O trabalho foi desenvolvido em colaboração com a equipe do italiano Antonio Musarò, professor de Histologia e Embriologia da Universidade de Roma. Ao investigar tecidos musculares em camundongos, os cientistas já haviam descoberto que as células tronco adultas percorrem grandes distâncias até alcançar uma determinada área lesionada. O trabalho dos pesquisadores europeus, porém, chegou a uma nova constatação: “As células que observamos passaram por todas as etapas típicas de especialização antes de se tornarem totalmente integradas ao novo tecido”, disse Nadia Rosenthal.

Isso afasta as principais críticas dos que pretendem usar células tronco embrionárias humanas em razão de supostas limitações nas utilizações de células tronco adultas, que proliferam adequadamente.
Além disso, deve ser mencionado um outro caminho de cura, recentemente descoberto, por meio do aprofundamento do conhecimento das células, como demonstra o relato publicado na Revista Science de 8 de outubro de 2004, vol. 306: 239-240, em que se utilizou hormônios/fatores responsáveis pela proliferação e plasticidade celulares para resolver a distrofia genética cardíaca.
 Quanto às células tronco embrionárias humanas, repita-se, não há nenhum estudo comprovando qualquer cura com a sua utilização ! Ao invés, os estudos disponíveis demonstram claramente que a implantação de CÉLULAS TRONCO EMBRIONÁRIAS HUMANAS, geram TERATOMAS, ou seja, TUMORES, podendo levar à morte. São tantos os problemas graves e  não solucionados com as pesquisas de células tronco embrionárias humanas, que elas se restringem a RATOS e ROEDORES e estão muitíssimos estágios atrás das pesquisas com células tronco adultas, NÃO TENDO, MESMO EM EXPERIÊNCIAS COM RATOS E CAMUNDONGOS, ALCANÇADO QUALQUER RESULTADO RELATADO E COMPROVADO QUE APONTE PARA EFETIVIDADE DE CURA, pois mesmo quando se consegue obter linhagem de células, elas vêm inseridas em teratomas, ou seja, tumores (vide por exemplo, o artigo “Evidence of a Pluripotent Human Embryonic Stem Cell   Line Derived from a Cloned Blastocyst”, publicado na Revista Science vol. 303, de 12 de março de 2004) e mesmo os defensores de sua utilização projetam eventuais resultados positivos (no momento não há nenhum, mas tão somente expectativas, sem evidência científica) para longo prazo, “na melhor das hipóteses” (vide a propósito a reportagem publicada na Revista “Nature”, vol. 430, de 19 de agosto de 2004, p. 817). 
   
De tudo isso, pode se afirmar que não correspondem à realidade as afirmações relativas a existência de curas, ou mesmo perspectiva ou esperança de cura com base em evidência científica, a partir da utilização de células tronco embrionárias humanas. Ademais sempre será inadmissível matar um ser humano para aproveitar-se seu corpo ou parte dele, que é o que ocorre com a utilização das células tronco embrionárias, mesmo que com a finalidade de pesquisa objetivando suposto futuro benefício para a saúde de outrem, para a qual, aliás, os especialistas supõe um longo prazo, “na melhor das hipóteses”. Por outro lado, são muitos e crescentes os artigos relatando e comprovando experiências de curas com as células tronco adultas humanas (aí incluídas as células tronco do cordão umbilical e placenta) em variadas aplicações, estando o Brasil adiantado em tais pesquisas, que devem ser incentivadas pois apontam para efetivos e expressivos benefícios para a população. 


______________________
São Paulo e Rio de Janeiro, em outubro de 2004.

Alice Teixeira Ferreira
Profª Associada de Biofísica, da
UNIFESP/EPM, na área de Biologia Celular -Sinalização Celular

Paulo Silveira Martins Leão Junior
Presidente da União dos Juristas Católicos RJ

 

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
Adicionar a favoritos link permanente.