Carta Encíclica Laborem Exercens: Sobre o Trabalho Humano (Parte 6)

Importa salientar também que a justiça de um sistema socioeconômico e, em qualquer hipótese, o seu justo funcionamento, devem ser apreciados, no fim de contas, segundo a maneira como é equitativamente remunerado o trabalho nesse sistema. Quanto a este ponto, nós chegamos de novo ao primeiro princípio de toda a ordem ético-social, ou seja, ao princípio do uso comum dos bens. Em todo e qualquer sistema, independentemente das relações fundamentais existentes entre o capital e o trabalho, o salário, isto é, a remuneração do trabalho, permanece um meio concreto pelo qual a grande maioria dos homens pode ter acesso àqueles bens que estão destinados ao uso comum, quer se trate dos bens da natureza, quer dos bens que são fruto da produção. Uns e outros tornam-se acessíveis ao homem do trabalho graças ao salário, que ele recebe como remuneração do seu trabalho. Daqui vem que o justo salário se torna em todos os casos a verificação concreta da justiça de cada sistema socioeconômico e, em qualquer hipótese, do seu justo funcionamento.

Não é o único meio de verificação, mas é particularmente importante, ele é mesmo, num certo sentido, a verificação-chave. Esta verificação diz respeito sobretudo à família. Uma justa remuneração do trabalho das pessoas adultas, que tenham responsabilidades de família, é aquela que for suficiente para fundar e manter dignamente uma família e para assegurar o seu futuro. Tal remuneração poderá efetuar-se ou por meio do chamado salário familiar, isto é, um salário único atribuído ao chefe de família pelo seu trabalho, e que seja suficiente para as necessidades da sua família, sem que a sua esposa seja obrigada a assumir um trabalho retribuído fora do lar; ou então por meio de outras medidas sociais, como sejam abonos familiares ou os subsídios para as mães que se dedicam exclusivamente à família, subsídios estes que devem corresponder às necessidades efetivas, quer dizer, ao número de pessoas a seu cargo e durante todo o tempo em que elas não estejam em condições de as sumir dignamente a responsabilidade da sua própria vida.
A experiência confirma que é necessário aplicar-se em prol da revalorização social das funções maternas, dos trabalhos que a elas andam ligados e da necessidade de cuidados, de amor e de carinho que têm os filhos, para se poderem desenvolver como pessoas responsáveis, moral e religiosamente amadurecidas e psicologicamente equilibradas. Reverterá em honra para a sociedade o tornar possível à mãe – sem pôr obstáculos à sua liberdade, sem discriminação psicológica ou prática e sem que ela fique numa situação de desdouro em relação às outras mulheres – cuidar dos seus filhos e dedicar-se à educação deles, segundo as diferentes necessidades da sua idade.

O abandono forçoso de tais tarefas, por ter de arranjar um trabalho retribuído fora de casa, é algo não correto sob o ponto de vista do bem da sociedade e da família, se isso estiver em contradição ou tornar difíceis tais objetivos primários da missão materna. (26) Nesta ordem de ideias, deve realçar-se que, numa visão mais geral, é necessário organizar e adaptar todo o processo do trabalho, de tal sorte que sejam respeitadas as exigências da pessoa e as suas formas de vida, antes de mais nada da sua vida doméstica, tendo em conta a idade e o sexo de cada uma delas. É um fato que, em muitas sociedades, as mulheres trabalham em quase todos os sectores da vida. Convém, no entanto, que elas possam desempenhar plenamente as suas funções, segundo a índole que lhes é própria, sem discriminações e sem exclusão dos empregos para que tenham capacidade, como também sem faltar ao respeito pelas suas aspirações familiares e pelo papel específico que lhes cabe no contribuir para o bem comum da sociedade juntamente com o homem.
A verdadeira promoção da mulher exige que o trabalho seja estruturado de tal maneira que ela não se veja obrigada a pagar a própria promoção com o ter de abandonar a sua especificidade e com detrimento da sua família, na qual ela, como mãe, tem um papel insubstituível. Ao lado do salário, entram em jogo aqui neste ponto ainda outras subvenções sociais que têm como finalidade assegurar a vida e a saúde dos trabalhadores e a das suas famílias. As despesas relacionadas com as necessidades de cuidar da saúde, especialmente em caso de acidentes no trabalho, exigem que o trabalhador tenha facilmente acesso à assistência sanitária; e isto, na medida do possível, a preços reduzidos ou mesmo gratuitamente. Um outro sector respeitante às subvenções é o daquilo que anda ligado ao direito ao repouso; trata-se aqui, antes de mais nada, do repouso semanal regular, compreendendo pelo menos o domingo, e além disso de um repouso mais longo, as chamadas férias, uma vez por ano ou, eventualmente, algumas vezes durante o ano, divididas por períodos mais breves. E trata-se, ainda, do direito à pensão de aposentadoria ou reforma, ao seguro para a velhice e ao seguro para os casos de acidentes de trabalho. E no âmbito destes direitos principais desdobra-se todo um sistema de direitos particulares: juntamente com a remuneração do trabalho, eles são o índice de uma correta ordenação das relações entre o trabalhador e o doador de trabalho. Entre estes direitos, há que ter sempre presente o direito a dispor de ambientes de trabalho e de processos de laboração que não causem dano à saúde física dos trabalhadores nem lesem a sua integridade moral.

20. A importância dos sindicatos
Com base em todos estes direitos, juntamente com a necessidade de os garantir por parte dos mesmos trabalhadores, surge ainda um outro direito: o direito de se associar, quer dizer, o direito de formar associações ou uniões, com a finalidade de defender os interesses vitais dos homens empregados nas diferentes profissões. Estas uniões têm o nome de sindicatos. Os interesses vitais dos homens do trabalho são até certo ponto comuns a todos; ao mesmo tempo, porém, cada espécie de trabalho, cada profissão, possui uma sua especificidade, que deveria encontrar nestas organizações de maneira particular o seu reflexo próprio. Os sindicatos têm os seus ascendentes, num certo sentido, já nas corporações artesanais da Idade Média, na medida em que tais organizações uniam entre si os homens que pertenciam ao mesmo ofício, isto é, agremiavam-nos em base ao trabalho que eles faziam. No entanto, os sindicatos também diferem dessas corporações neste ponto essencial: os modernos sindicatos cresceram a partir da luta dos trabalhadores, do mundo do trabalho e, sobretudo, dos trabalhadores da indústria, pela tutela dos seus justos direitos, em confronto com os empresários e os proprietários dos meios de produção. Constitui sua tarefa a defesa dos interesses existenciais dos trabalhadores em todos os sectores em que entram em causa os seus direitos. A experiência histórica ensina que as organizações deste tipo são um elemento indispensável da vida social, especialmente nas modernas sociedades industrializadas. Isto, evidentemente, não significa que somente os trabalhadores da indústria possam constituir associações deste gênero. Os representantes de todas as profissões podem servir-se delas para garantir os seus respectivos direitos. Existem, com efeito, os sindicatos dos agricultores e dos trabalhadores intelectuais; come existem também as organizações dos doadores de trabalho. Todos, como já foi dito acima, se subdividem em grupos e subgrupos segundo as particulares especializações profissionais. A doutrina social católica não pensa que os sindicatos sejam somente o reflexo de uma estrutura « de classe » da sociedade, como não pensa que eles sejam o expoente de uma luta de classe, que inevitavelmente governe a vida social. Eles são, sim, um expoente da luta pela justiça social, pelos justos direitos dos homens do trabalho segundo as suas diversas profissões. No entanto, esta « luta » deve ser compreendida como um empenhamento normal das pessoas « em prol » do justo bem: no caso, em prol do bem que corresponde às necessidades e aos méritos dos homens do trabalho, associados segundo as suas profissões; mas não é uma luta « contra » os outros. Se ela assume um caráter de oposição aos outros, nas questões controvertidas, isso sucede por se ter em consideração o bem que é a justiça social, e não por se visar a « luta » pela luta, ou então para eliminar o antagonista. O trabalho tem como sua característica, antes de mais nada, unir os homens entre si; e nisto consiste a sua força social: a força para construir uma comunidade. E no fim de contas, nessa comunidade devem unir-se tanto aqueles que trabalham como aqueles que dispõem dos meios de produção ou que dos mesmos são proprietários. A luz desta estrutura fundamental de todo o trabalho – à luz do fato de que, afinal, o « trabalho » e o « capital » são as componentes indispensáveis do processo de produção em todo e qualquer sistema social – a união dos homens para se assegurarem os direitos que lhes cabem, nascida das exigências do trabalho, permanece um fator construtivo de ordem social e de solidariedade, fator do qual não é possível prescindir. Os justos esforços para garantir os direitos dos trabalhadores, que se acham unidos pela mesma
profissão, devem ter sempre em conta limitações que impõe a situação econômica geral do país. As exigências sindicais não podem transformar-se numa espécie de « egoísmo » de grupo ou de classe, embora possam e devam também tender para corrigir – no que respeita ao bem comum da inteira sociedade – tudo aquilo que é defeituoso no sistema de propriedade dos meios de produção, ou no modo de os gerir e de dispor deles. A vida social e económico-social é certamente como um sistema de « vasos comunicantes », e todas e cada uma das atividades sociais, que tenham como finalidade salvaguardar os direitos dos grupos particulares, devem adaptar-se a tal sistema. Neste sentido, a atividade dos sindicatos entra indubitavelmente no campo da « política », entendida como uma prudente solicitude pelo bem comum. Ao mesmo tempo, porém, o papel dos sindicatos não é o de « fazer política » no sentido que hoje comummente se vai dando a esta expressão. Os sindicatos não têm o caráter de « partidos políticos » que lutam pelo poder, e também não deveriam nunca estar submetidos às decisões dos partidos políticos, nem manter com eles ligações muito estreitas. Com efeito, se for esta a situação, eles perdem facilmente o contacto com aquilo que é o seu papel específico, que é o de garantirem os justos direitos dos homens do trabalho no quadro do bem comum de toda a sociedade, e, ao contrário, tornam-se um instrumento da luta para outros fins. Ao falar da tutela dos justos direitos dos homens do trabalho segundo as suas diversas profissões, é preciso naturalmente ter sempre diante dos olhos aquilo de que depende o caráter subjectivo do trabalho em cada profissão; mas, ao mesmo tempo, ou primeiro que tudo, aquilo que condiciona a dignidade própria do sujeito do trabalho. E aqui apresentam-se múltiplas possibilidades para a ação das organizações sindicais, inclusive também para um seu empenhamento por coisas de caráter instrutivo, educativo e de promoção da auto-educação. A ação das escolas, das chamadas « universidades operárias » e « populares », dos programas e dos cursos de formação, que desenvolveram e continuam ainda a desenvolver atividades neste campo, é uma ação benemérita. Deve sempre desejar-se que, graças à ação dos seus sindicatos, o trabalhador não só possa « ter » mais, mas também e sobretudo possa « ser » mais; o que equivale a dizer, possa realizar mais plenamente a sua humanidade sob todos os aspectos. Ao agirem em prol dos justos direitos dos seus membros, os sindicatos lançam mão também do método da « greve », ou seja, da suspensão do trabalho, como de uma espécie de « ultimatum » dirigido aos órgãos competentes e, sobretudo, aos doadores de trabalho. É um modo de proceder que a doutrina social católica reconhece como legítimo, observadas as devidas condições e nos justos limites. Em relação a isto os trabalhadores deveriam ter assegurado o direito à greve, sem terem de sofrer sanções penais pessoais por nela participarem. Admitindo que se trata de um meio legítimo, deve simultaneamente relevar-se que a greve continua a ser, num certo sentido, um meio extremo. Não se pode abusar dele; e não se pode abusar dele especialmente para fazer o jogo da política. Além disso, não se pode esquecer nunca que, quando se trata de serviços essenciais para a vida da sociedade, estes devem ficar sempre assegurados, inclusive, se isso for necessário, mediante apropriadas medidas legais. O abuso da greve pode conduzir à paralisação da vida sócioeconômica; ora isto é contrário às exigências do bem comum da sociedade, o ual também corresponde à natureza, entendida retamente, do mesmo trabalho.

21. Dignidade do trabalho agrícola
Tudo o que foi dito em precedência sobre a dignidade do trabalho e sobre a dimensão objetiva e subjetiva do trabalho do homem, tem aplicação direta ao problema do trabalho agrícola e à situação do homem que cultiva a terra no duro trabalho dos campos. Trata-se, efetivamente, de um sector muito vasto do âmbito do trabalho do nosso planeta, não circunscrito a um ou a outro dos continentes e não limitado àquelas sociedades que já atingiram um certo nível de desenvolvimento e de progresso. O mundo agrícola, que proporciona à sociedade os bens necessários para a sua sustentação quotidiana, reveste-se de uma importância fundamental. As condições do mundo rural e do trabalho agrícola não são iguais em toda a parte e as situações sociais dos trabalhadores agrícolas são diferentes nos diversos países. E isso não depende somente do grau de desenvolvimento da técnica agrícola, mas também, e talvez mais ainda, do reconhecimento dos justos direitos dos trabalhadores agrícolas e, enfim, do nível de consciência daquilo que concerne a toda a ética social do trabalho.

O trabalho dos campos reveste-se de não leves dificuldades, como sejam o esforço físico contínuo e por vezes extenuante, o pouco apreço em que é tido socialmente, a ponto de criar nos homens que se dedicam à agricultura a sensação de serem socialmente marginalizados e de incentivar no seu meio o fenômeno da fuga em massa do campo para as cidades e, infelizmente, para condições de vida ainda mais desumanizantes. A isto acrescente-se a falta de formação profissional adequada, a falta de utensílios apropriados, um certo individualismo rastejante e, ainda situações objetivamente injustas. Em certos países em vias de desenvolvimento, há milhões de homens que se vêem obrigados a cultivar as terras de outros e que são explorados pelos latifundiários, sem esperança de alguma vez poderem chegar à posse nem sequer de um pedaço mínimo de terra « como sua propriedade ». Não existem formas de proteção legal para a pessoa do trabalhador agrícola e para a sua família, no caso de velhice, de doença ou de falta de trabalho. Longas jornadas de duro trabalho físico são pagadas miseramente. Terras cultiváveis são deixadas ao abandono pelos proprietários; títulos legais para a posse de um pequeno pedaço de terra, cultivado por conta própria de há anos, são preteridos ou ficam sem defesa diante da « fome da terra » de indivíduos ou de grupos mais potentes. E mesmo nos países economicamente desenvolvidos, onde a investigação científica, as conquistas tecnológicas ou a política do Estado levaram a agricultura a atingir um nível muito avançado, o direito ao trabalho pode ser lesado quando se nega ao camponês a faculdade de participar nas opções decisionais respeitantes ao trabalho em que presta os seus serviços, ou quando é negado o direito à livre associação visando a justa promoção social, cultural e econômica do trabalhador agrícola.

Em muitas situações, portanto, são necessárias mudanças radicais e urgentes, para restituir à agricultura – e aos homens dos campos – o seu justo valor como base de uma sã economia, no conjunto do desenvolvimento da comunidade social. É por isso que se impõe proclamar e promover a dignidade do trabalho, de todo o trabalho, especialmente do trabalho agrícola, no qual o homem de maneira tão expressiva « submete a terra », recebida de Deus como dom, e afirma o seu « domínio » no mundo visível.

22. A pessoa deficiente e o trabalho
Em tempos recentes, as comunidades nacionais e as organizações internacionais tem voltado a sua atenção para um outro problema relacionado com o trabalho e que é bem denso de reflexos: o problema das pessoas deficientes. Também elas são sujeitos plenamente humanos, dotados dos correspondentes direitos inatos, sagrados e invioláveis, que, apesar das limitações e dos sofrimentos inscritos no seu corpo e nas suas faculdades, põem mais em relevo a dignidade e a grandeza do homem. E uma vez que a pessoa que tem quaisquer « deficiências » é um sujeito dotado de todos os seus direitos, deve facilitar-se-lhe a participação na vida da sociedade em todas as dimensões e a todos os níveis que sejam acessíveis para as suas possibilidades. A pessoa deficiente é um de nós e participa plenamente da mesma humanidade que nós. Seria algo radicalmente indigno do homem e seria uma negação da humanidade comum admitir à vida da sociedade, e portanto ao trabalho, só os membros na plena posse das funções do seu ser, porque, procedendo desse modo, recair-se-ia numa forma grave de discriminação, a dos fortes e sãos contra os fracos e doentes. O trabalho no sentido objectivo deve ser subordinado, também neste caso, à dignidade do homem, ao sujeito do trabalho e não às vantagens econômicas. Compete, pois, às diversas entidades implicadas no mundo do trabalho, ao doador direto bem como ao doador indireto de trabalho, promover com medidas eficazes e apropriadas o direito da pessoa deficiente à preparação profissional e ao trabalho, de modo que ela possa ser inserida numa atividade produtiva para a qual seja idônea. Aqui apresentam-se muitos problemas de ordem prática, legal e também econômica; mas cabe à comunidade, quer dizer, às autoridades públicas, às associações e aos grupos intermédios, às empresas e aos mesmos deficientes pôr em comum ideias e recursos para se alcançar esta finalidade inabdicável: que seja proporcionado um trabalho às pessoas deficientes, segundo as suas possibilidades, porque o requer a sua dignidade de homens e de sujeitos do trabalho. Cada comunidade há-de procurar munir-se das estruturas adaptadas para se encontrarem ou para se criarem lugares de trabalho para tais pessoas, quer nas comuns empresas públicas ou privadas – que lhes proporcionem um lugar de trabalho ordinário ou então adaptado para o seu caso – quer nas empresas e nos meios de trabalho chamados « de proteção ». Uma grande atenção deverá ser dedicada, como para todos os outros trabalhadores, às condições físicas e psicológicas de trabalho dos deficientes, à sua justa remuneração, à sua possibilidade de promoção e à eliminação dos diversos obstáculos. Sem querer esconder que se trata de uma tarefa complexa e não fácil, é para desejar que uma concepção exata do trabalho no sentido subjetivo permita chegar-se a uma situação que dê à pessoa deficiente a possibilidade de sentir-se não já à margem do mundo e do trabalho ou a viver na dependência da sociedade, mas sim como um sujeito do trabalho de pleno direito, útil, respeitado na sua dignidade humana e chamado a contribuir para o progresso e para o bem da sua família e da comunidade, segundo as próprias capacidades.

23. O trabalho e o problema da emigração
É necessário, por fim, dedicar uma palavra, ao menos de maneira sumária, ao problema da emigração por motivos de trabalho. Trata-se de um fenômeno antigo, mas que se repete continuamente e que nos dias de hoje assume mesmo dimensões tão grandes que são de molde a complicar a vida contemporânea. O homem tem sempre o direito de deixar o próprio país de origem por diversos motivos – como também de a ele voltar – e de procurar melhores condições de vida num outro país. Este fato, certamente, não anda disjunto de dificuldades de natureza diversa; primeiro que tudo, ele constitui, em geral, uma perda para o país do qual se emigra. É o afastamento de um homem, que é ao mesmo tempo um membro de uma grande comunidade, unificada pela sua história, pela sua tradição e pela sua cultura, o qual parte para ir recomeçar uma vida no seio de outra sociedade, unificada por uma outra cultura e, muitas vezes, também por uma outra língua. Neste caso, vem a faltar um sujeito de trabalho que, com o esforço do próprio pensamento ou dos seus braços poderia contribuir para o aumento do bem comum no seu país; e eis que tal esforço e tal contribuição vão ser dados a outra sociedade, a qual, num certo sentido, tem a isso menos direito do que a pátria de origem. E no entanto, apesar de a emigração ser sob certos aspectos um mal, em determinadas circunstâncias é, como se costuma dizer, um mal necessário. Devem envidar-se todos os esforços – e certamente muito se faz com tal finalidade – para que este mal no sentido material não comporte danos de maior no sentido moral, e até mesmo para que, na medida em que é possível, ele traga uma melhoria na vida pessoal, familiar e social do emigrado; e isto diz respeito quer ao país de chegada quer à pátria de onde partiu. Neste domínio, muitíssimas coisas dependem de uma justa legislação, em particular quando se trata dos direitos do homem do trabalho. Comprende-se, pois, que tal problema, sobretudo se focado deste ponto de vista, tenha cabimento no contexto das presentes considerações. A coisa mais importante é que o homem que trabalha fora do seu país natal, como emigrado permanente ou como trabalhador ocasional, não venha a encontrar-se desfavorecido pelo que se refere aos direitos relativos ao trabalho, em confronto com os trabalhadores dessa sociedade determinada. A emigração por motivo de trabalho não pode de maneira nenhuma tornar-se uma ocasião de exploração financeira ou social. No que diz respeito à relação de trabalho com o trabalhador imigrado devem ser válidos os mesmos critérios seguidos para todos os outros trabalhadores da mesma sociedade. O valor do trabalho deve ser medido com a mesma medida e não tendo em linha de conta a diferença de nacionalidade, de religião ou de raça. Com mais razão ainda, não pode ser explorada a situação de constrangimento em que se encontre o imigrado. Todas estas circunstâncias devem absolutamente ceder – naturalmente depois de terem sido tomadas em consideração as qualificações específicas – diante do valor fundamental do trabalho, valor que anda ligado com a dignidade da pessoa humana. E uma vez mais vem ao caso repetir o princípio fundamental: a hierarquia dos valores, o sentido profundo do trabalho exigem que o capital esteja em função do trabalho e não o trabalho em função do capital.

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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