Carta Apostólica Sobre a Celebração do Mistério Pascal

SOBRE
A CELEBRAÇÃO DO MISTÉRIO PASCAL DADA POR MOTU PROPRIO APROVANDO AS  NORMAS UNIVERSAIS DO ANO LITÚRGICO E O NOVO CALENDÁRIO ROMANO GERAL

A
celebração do mistério pascal, conforme nos ensinou claramente o sacrossanto Concílio
Vaticano II, constitui o cerne do culto religioso do cristão no seu
desenvolvimento cotidiano, semanal e anual. Por isso, era necessário que a
restauração do ano litúrgico, cujas normas foram dadas pelo Santo Sínodo (1),
colocasse numa luz mais clara o mistério pascal de Cristo, tanto na organização
do Próprio do Tempo e dos Santos, como na revisão do Calendário Romano.

1. Na
verdade, no decorrer dos séculos, a multiplicação das festas, das vigílias e
das oitavas, bem como a complexidade crescente das várias partes do ano
litúrgico, encaminharam os fiéis às devoções particulares, desviando-os um
pouco dos mistérios fundamentais da nossa Redenção.

Ninguém
ignora que os nossos predecessores São Pio X e João XXIII, de venerável
memória, deram normas para que os domingos, restaurados em sua dignidade
primitiva, fossem verdadeira e propriamente tidos por todos como o “dia de
festa primordial” (2) e para que restaurasse a celebração litúrgica da
Sagrada Quaresma. E sobretudo o nosso predecessor Pio XII, de venerável
memória, ordenou (3) que na Igreja Ocidental, durante a Noite da Páscoa, fosse
restaurada a solene vigília pascal para que o Povo de Deus, celebrando então os
Sacramentos de iniciação cristã, renovasse a aliança espiritual com o Cristo
Senhor ressuscitado.

Estes Sumos
Pontífices, seguindo o ensinamento dos Santos Padres e a doutrina firmemente
transmitida pela Igreja Católica, julgaram com razão que no curso anual da
liturgia não se recordam apenas as ações pelas quais Jesus Cristo por sua morte
nos trouxe a salvação, nem se renova somente a lembrança de ações passadas,
para instruir e nutrir a meditação dos fiéis, mesmo os mais simples; ensinavam
também que a celebração do ano litúrgico “goza de força sacramental e
especial eficácia para alimentar a vida cristã” (4). Nós também pensamos e
afirmamos o mesmo.

Portanto, é
com razão que, ao celebrar o “sacramento do Natal do Cristo” (5) e
sua manifestação ao mundo, pedimos que, “reconhecendo sua humanidade
semelhante à nossa, sejamos interiormente transformados por Ele” (6) e, ao
renovarmos a Páscoa do Senhor, suplicamos ao sumo Deus pelos que renasceram com
Cristo “para que sejam fiéis por toda a vida ao sacramento do Batismo, que
receberam professando a fé” (7). Pois, para usarmos as palavras do Concílio
Ecumênico Vaticano II, “celebrando os mistérios da Redenção, a Igreja abre
aos fiéis as riquezas do poder e dos méritos de seu Senhor; de tal modo que os
fiéis entram em contato com estes mistérios, tornados de certa forma presentes
em todo o tempo e lugar, e se tornam repletos da graça da salvação” (8).

Por isso, a
revisão do ano litúrgico e as normas que decorrem de sua reforma não têm outro
objetivo senão levar os fiéis a participarem mais ardentemente pela fé, pela
esperança e pela caridade, de “todo o mistério de Cristo, desenvolvido no
decurso de um ano”.

2. Cremos
que as festas da Virgem Maria, “unida por laço indissolúvel à obra de seu
Filho” (10), bem como as memórias dos Santos, entre as quais brilham com
particular fulgor os aniversários de “nossos senhores mártires e
vencedores”(11), não se opõem de modo algum à celebração do mistério de
Cristo. Na verdade, “as festas dos Santos proclamam as maravilhas do
Cristo nos seus servos e oferecem aos fiéis oportunos exemplos a serem imitados”
(12). A Igreja Católica sempre afirmou que nas festas dos Santos se anuncia e
renova o mistério pascal do Cristo (13).

Entretanto,
não se pode negar que no correr dos séculos surgiram mais festas de Santos do
que seria conveniente. Por isso, o Santo Sínodo ordenou: “Que as festas de
Santos não prevaleçam sobre as que recordam os mistérios da salvação. Muitas
destas festas sejam deixadas à celebração de cada Igreja local, nação ou
família religiosa, estendendo-se somente à Igreja universal as festas que comemoram
Santos de importância verdadeiramente universal” (14).

Pondo em
prática esta decisão do Concílio Ecumênico, os nomes de alguns Santos foram
retirados do Calendário Geral e permitiu-se que a memória de outros fosse
celebrada facultativamente e se lhes prestasse o devido culto somente nas
regiões em que viveram. A supressão dos nomes de alguns santos universalmente
conhecidos permitiu introduzir-se no Calendário Romano o nome de alguns
Mártires daquelas regiões onde o anúncio do Evangelho chegou mais tarde. Assim,
no mesmo catálogo, gozam de igual dignidade representantes de todos os povos,
ilustres por terem derramado o sangue pelo Cristo ou praticado as mais altas
virtudes.

Por estes
motivos, julgamos o novo Calendário Geral, preparado para o uso do rito latino,
mais adaptado à mentalidade e à sensibilidade religiosa do nosso tempo, e mais
condizente com o espírito universal da Igreja. Com efeito, ele propõe a todo o
Povo de Deus os Santos mais importantes como notáveis exemplos de santidade
vivida de vários modos. Não é necessário dizer o quanto isto contribuirá para o
bem espiritual de todo o povo cristão.

Tendo
atentamente considerado diante de Deus todos estes motivos, aprovamos com a
nossa autoridade apostólica o novo Calendário Romano Geral, composto pelo
Conselho encarregado de executar a Constituição sobre a Sagrada Liturgia, como
aprovamos também as normas universais relativas à disposição do ano litúrgico.
Determinamos que entrem em vigor a partir do dia 1º de janeiro do práximo ano,
1970, conforme os decretos a serem publicados conjuntamente pela Sagrada
Congregação dos Ritos e pelo referido Conselho, válidos até a edição do Missal
e do Breviário restaurados.

Tudo o que
estabelecemos nesta nossa carta, escrita motu proprio, seja confirmado e
executado não obstante as disposições em contrário constantes das Constituições
e Ordenações Apostólicas de nossos antecessores, como também de outras
prescrições, mesmo dignas de menção e derrogação.

Dado em
Roma, junto de São Pedro, dia 14 de fevereiro de 1969, sexto ano do nosso
pontificado.

Paulo VI,
papa

Referências

(1) Cf. Conc. Vaticano II, Const. sobre a Sagrada Liturgia, Sacrosanctum
Concilium, nnº 102-111, AAS 56 (1964), pp. 125-128.
(2) Cf. Conc. Vaticano II, Const. sobre a Sagrada Liturgia, SC, nº 106, AAS 56
(1964), p. 126.
(3) Cf. Sagrada Congregação dos Ritos, Decr. “Dominicae
Ressurrectionis”, de 09.02.1951, AAS 43 (1951), pp. 128-129.
(4) Cf. Sagrada Congregação dos Ritos, Decr. geral “Maxima Redemptionis
Nostrae Mysteria”, de 16.11.1955, AAS 47 (1955), p. 839.
(5) São Leão Magno, Sermão XXVII do Natal do Senhor 7,1, PL 54,216.

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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