Carta Apostólica – Duodecim Saeculum do Papa João Paulo II

Sobre a Veneração das Imagens por ocasião do XII Centenário
do II Concílio de Nicéia

     Veneráveis
Irmãos, saúde e Bênção Apostólica!

 

1. O décimo
segundo centenário do II Concilio de Nicéia (a. 787) foi objeto de numerosas
comemorações eclesiais e acadêmicas, as quais também esta Sé Apostólica se
associou (1). O acontecimento foi celebrado igualmente com a publicação de uma
Encíclica de Sua Santidade o Patriarca de Constantinopla e do Santo Sínodo (2),
iniciativa que evidencia a importância teológica e o alcance ecumênico, ainda
atuais, do sétimo e último Concílio plenamente reconhecido pela Igreja católica
e pela Igreja ortodoxa. A doutrina definida por este Concílio quanto a
legitimidade da veneração dos ícones (imagens) na Igreja merece também ela uma
atenção especial, não só pela  riqueza
das suas implicações espirituais, mas também pelas exigências que ela impõe em
todo o âmbito da arte sacra.

O relevo dado
pelo II Concílio de Nicéia ao assunto da Tradição, e mais precisamente da
tradição não-escrita, constitui para nós católicos, assim como para os nossos
irmãos ortodoxos, um convite a percorrermos de novo juntos o caminho da
Tradição da Igreja não dividida, para reexaminar à sua luz as divergências, que
os longos séculos de separação acentuaram entre nós, e para reencontrar; conforme o que
Jesus pediu ao Pai (cf. Jo 17,11.20-21), a 
comunhão plena na unidade visível.

2. O Patriarca de
Constantinopla São Tarásio, moderador do II Concílio Niceno, ao apresentar ao
Papa Adriano I o relatório do desenrolar do Concílio, escrevia: “Depois de
termos todos ocupado o  próprio lugar,
nós estabelecemos ter Cristo como (nosso) chefe. Com efeito, o Santo Evangelho
foi colocado em cima dum trono, como convite a todos os presentes a julgarem
segundo a justiça” (3).O fato de se ter constituído Cristo como presidente
da assembléia conciliar, que se reunia no seu nome e sob a sua autoridade, foi
um gesto eloqüente para afirmar que a unidade da Igreja não pode realizar-se a
não ser na obediência ao seu único Senhor.

3. Os imperadores
que tinham convocado o Concílio, Irene e Constantino VI, tinham convidado o meu
Predecessor Adriano I, “enquanto verdadeiro primeiro Pontífice, que
preside no lugar e na sede do santo e muito venerável Apóstolo Pedro” (4).
Ele fez-se representar pelo Arcebispo da Igreja romana e pelo Hegúmeno (Abade)
do mosteiro grego de São Sabas em
Roma. Para assegurar a representatividade universal da
Igreja, era requerida também a presença dos Patriarcas orientais (5).

Uma vez que os
seus territórios se encontravam já sob o domínio muçulmano, os Patriarcas de Alexandria
e de Antioquia enviaram conjuntamente uma carta comum a São Tarásio; e o
Patriarca de Jerusalém enviou uma carta sinodal. Uma e outra foram lidas no
Concílio (6).

Admitia-se então comumente que as decisões
de um Concílio ecumênico eram válidas somente se o Bispo de Roma nelas tivesse
colaborado e se os Patriarcas orientais tivessem manifestado o seu acordo (7).
Neste processo o papel da Igreja de Roma era reconhecido como insubstituível
(8).

Assim o II
Concílio Niceno aprovou a explicação do Diácono João, segundo a qual a
assembléia dos iconoclastas, realizada em Hiéria em 754, não era legítima, porque
“o Papa de Roma e os   Bispos que
estão à sua volta não tinham colaborado nela, nem através de legados, nem
mediante uma carta encíclica, segundo a lei dos Concílios”; e “os
Patriarcas do Oriente… e os Bispos que   estão com eles não lhe tinham dado o seu
consenso” (9). Por outro lado os Padres do II Concílio Niceno declararam
que “acolhiam, acatavam e seguiam” a Carta enviada pelo Papa Adriano
aos   imperadores (10) assim como a
dirigida ao Patriarca. Estas Cartas foram lidas, em latim e na sua tradução
grega, e todos foram convidados a dar-lhes individualmente o próprio assenso
(11).

4. O Concílio
saudou unanimemente nas pessoas dos legados pontifícios “a santíssíma
Igreja de Roma, ou seja, do Apóstolo São Pedro” (12) e da “Cátedra
apostólica” (13), adotando a fórmula    romana (14); e o Patriarca Tarásio,
escrevendo ao meu predecessor em nome do Concílio, reconhecia nele aquele que
“herdou a Cátedra do Apóstolo São Pedro”, e que, “revestido do
Sumo Pontificado, tem a subida honra de presidir, legitimamente e por vontade
de Deus, à sagrada Hierarquia” (15).Um dos momentos
decisivos no decorrer do Concílio parece ter sido aquele em que ele se pronunciou
a favor do restabelecimento do culto das imagens, quando os participantes acolheram,
em unanimidade, a proposta dos legados romanos de fazer colocar no meio da
assembléia um venerável ícone, para que os Padres pudessem prestar-lhes a sua
veneração (16).

O último Concílio ecumênico reconhecido
quer pela Igreja católica quer pela Igreja ortodoxa é um exemplo notável de
“sinergia” entre a sede de Roma e uma assembléia conciliar. Ele
inscreve-se na perspectiva da eclesiologia patrística de comunhão, fundamentada
na Tradição, como o Concílio Ecumênico Vaticano II, justamente, uma vez mais
pôs em evidência

 

     5. O Concílio
Niceno II afirmou solenemente a existência da “tradição eclesiástica
escrita e não-escrita” (17), como referência normativa para a fé e para a
disciplina da Igreja. Os Padres      manifestaram o seu desejo de “conservar
intactas todas as tradições da Igreja, que lhes foram confiadas, sejam elas
escritas ou não-escritas. Uma delas consiste precisamente na pintura dos ícones,
em conformidade com a carta da pregação apostólica” (18). Contra a
corrente iconoclasta, que também tinha apelado para a Escritura e para a
Tradição dos Padres, especialmente para o      pseudo-sínodo de Hiéria de 754, o II
Concílio de Nicéía sanciona a legitimidade da veneração das imagens,
confirmando “o ensino divinamente inspirado dos santos Padres e da
Tradição da Igreja     católica”
(19).

Os Padres do II
Concílio Niceno entendiam a “tradição eclesiástica” como tradição dos
seis Concílios ecumênicos precedentes e dos Padres ortodoxos, cujo ensino era
acolhido comumente na Igreja. O Concílio, deste modo, definiu como sendo de fé
aquela verdade essencial, segundo a qual a mensagem cristã é
“tradição”, “paràdosis”. A medida que a Igreja se foi desenvolvendo,
no tempo e no espaço, a sua inteligência da Tradição, da qual é portadora,
conheceu também ela as fases de um desenvolvimento, cuja investigação
constitui, para o diálogo ecumênico e para toda a reflexão teológica autêntica,
um percurso obrigatório.

 6. Já São Paulo
nos ensina que, para a primeira geração cristã, a “paràdosis” consiste na
proclamação do Acontecimento de Cristo e do seu significado atual, que realiza
a Salvação mediante a ação do Espírito Santo (cf. 1Cor 15,3-8; 11,2). A
tradição das palavras e dos atos do Senhor foi recolhida nos quatro Evangelhos,
mas sem se exaurir neles (cf. Lc 1,1; Jo 20,30; 21,25). Esta tradição      primigênia é tradição
“apostólica” (cf. 2Ts 2,14-15; Jd 17; 2Pd 3,2). Ela diz respeito não
apenas ao “depósito” da “sã doutrina” (cf. 2Tm 1,6-12; Tt
1,9), mas também às normas de comportamento e às      regras da vida comunitária (cf. lTs 4,1-7;
1Cor 4,17; 7,17; 11,16; 14,33). A Igreja lê a Escritura à luz da “regra da
fé” (20), quer dizer, da sua fé viva mantida coerente com o ensino dos
Apóstolos.Aquilo que a
Igreja sempre acreditou e praticou, ela considera-o justamente como
“Tradição apostólica”. Santo Agostinho dizia: “Uma observância
mantida pela Igreja inteira e conservada  sempre, que não tenha sido instituída pelos
Concílios, acaba por não ser outra coisa, com pleno direito, senão uma tradição
que emana da autoridade dos Apóstolos” (21).

De fato, as
tomadas de posição dos Padres no decorrer dos grandes debates teológicos dos
séculos IV e V, a importância crescente da instituição sinodal a nível regional
e universal, fizeram com que, pouco a pouco, a tradição se tornasse a
“tradição dos Padres” ou “tradição eclesiástica”, entendida
como desenvolvimento homogêneo da Tradição apostólica. Foi por isto que São
Basílio Magno fez apelo às “tradições não-escritas”, que são as
“tradições dos Padres” (22), para fundamentar a sua teologia
trinitária, e sublinha a proveniência dupla da doutrina da Igreja “do
ensino escrito, bem como da tradição apostólica” (23).

O próprio
Concilio Niceno II, que cita oportunamente São Basílio a propósito da teologia
das imagens (24), invocou também a autoridade dos grandes doutores ortodoxos,
como São Gregório   Nazianzeno, São
Gregório de Nissa, São Cirilo de Alexandria. São João Damasceno pôs também ele
em relevo a importância para a fé das “tradições não escritas”, isto
é, não contidas na Escritura, ao declarar: “Se alguém se apresentar com um
Evangelho diferente daquele que a Igreja católica recebeu dos Santos Apóstolos,
dos Padres e dos Concílios e que ela conservou até aos nossos dias, não o
escuteis” (25).

7. Mais próximo
de nós, o Concílio Vaticano II apresentou novamente em plena luz a importância
da “tradição que provém dos Apóstolos”. De fato, “a Sagrada
Escritura é a Palavra de Deus, enquanto consignada por escrito sob a inspiração
do Espírito divino; a Sagrada Tradição, por seu lado, é portadora da Palavra de
Deus, confiada por Cristo Senhor e pelo Espírito Santo aos Apóstolos, e transmite-a
integralmente aos seus sucessores” (26).

“Ora, aquilo
que foi transmitido pelos Apóstolos compreende tudo quanto contribui para que o
Povo de Deus viva santamente e para o aumento da sua fé” (27). Juntamente
com a Sagrada Escritura, a Sagrada Tradição constitui “um único depósito
sagrado da Palavra de Deus, confiado à Igreja”. A interpretação autêntica
“da Palavra de Deus escrita ou contida na Tradição foi confiada unicamente
ao Magistério vivo da Igreja, cuja autoridade é exercida em nome de Jesus
Cristo” (28). É mediante uma fidelidade igual ao tesouro comum da Tradição
que remonta aos Apóstolos, que as Igrejas se esforçam hoje por aprofundar os
motivos das suas divergências e as razões que há para as superar.

8. A terrível
“controvérsia sobre as imagens”, que dilacerou o império bizantino
sob os imperadores isáuricos Leão III e Constantino V, entre os anos de 730 e
780, e de novo sob Leão V, de 814
a 843, explica-se principalmente pelo debate teológico
que, desde o início, foi o seu fulcro.

Sem ignorar o
perigo de um ressurgimento sempre possível das praticas idolátricas do
paganismo, a Igreja admitia que o Senhor, a Bem-aventurada Virgem Maria, os
Mártires e os Santos fossem  representados em formas pictóricas ou
plásticas para favorecer a oração e a devoção dos fiéis. Era claro para todos,
segundo a fórmula de São Basílio, recordada pelo Concílio Niceno II, que
“a honra prestada ao ícone é dirigida ao protótipo” (29). No
Ocidente, o Papa São Gregório Magno tinha insistido no caráter didático das
pinturas nas igrejas, úteis para que os analfabetos, “ao    contemplá-las, possam ler, pelo menos nas
paredes, aquilo que não são capazes de ler nos livros”, e acentuava que
esta contemplação devia levar à adoração da “única e onipotente Trindade     Santíssima” (30). Foi neste contexto
que se desenvolveu, de maneira particular em Roma durante o século VIII, o
culto das imagens dos Santos, dando lugar a uma produção artística admirável.

O movimento
iconoclasta, rompendo com a tradição autêntica da Igreja, considerava a
veneração das imagens como um retorno à idolatria. Não sem contradição e
ambigüidade, ele proibia a      representação de Cristo e as imagens
religiosas em geral, enquanto continuava a admitir as imagens profanas, em
particular as imagens do imperador, com os sinais de reverência que a elas
andavam    ligados. A base da argumentação
dos iconoclastas era de natureza cristológica. Como pintar Cristo que unia na
sua Pessoa, sem as confundir nem as separar, a natureza divina e a natureza
humana?

Por outro lado,
seria impossível representar a sua divindade inapreensível; por outro,
representá-l’O na sua humanidade somente seria dívidi-l’O separando n’Ele a
divindade da humanidade. Escolher uma ou outra destas duas vias levaria às duas
heresias cristológicas opostas do monofisismo e do nestorianismo. Com efeito,
quem pretendesse representar Cristo na sua divindade condenar-se-ia a absorver
nessa representação a sua humanidade; e quem mostrasse apenas um retrato de
homem, acabaria por ocultar que ele é também Deus.

 

9. O dilema posto
pelos iconoclastas envolvia algo que ia muito além da questão da possibilidade
de uma arte cristã; punha em causa toda a visão cristã da realidade da
Encarnação e, portanto, das relações de Deus com o mundo, e da graça com a
natureza, numa palavra, a especificidade da “Nova Aliança”, que Deus
concluiu com os homens em
Jesus Cristo. Os defensores das imagens advertiram muito bem
isso: segundo uma expressão do Patriarca de Constantinopla São Germano, ilustre
vítima da heresia iconoclasta, era toda “a economia divina segundo a
carne” (31) que era posta de novo em questão.

Com efeito, ver representado o rosto
humano do Filho de Deus, “imagem de Deus invisível” (Cl1,15), é ver o
Verbo feito carne (cf. Jo 1,14), o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo
(cf.Jo 1,29). Portanto, a arte pode representar a forma, a efígie do rosto
humano de Deus e levar aquele que o contempla ao mistério inefável do mesmo
Deus feito homem para a nossa salvação. Assim, o Papa Adriano pôde escrever:
“Graças a um rosto visível, o nosso espírito será transportado, por um atrativo
espiritual, até à majestade invisível da divindade, através da contemplação da
imagem em que está representada a carne, que o Filho de Deus se dignou assumir
para a nossa salvação. E, sendo assim, nós adoramos e conjuntamente louvamos,
glorifificando-o em espírito, este mesmo Redentor, porque, como está escrito,
‘Deus é Espírito’ e é por isso que nós adoramos espiritualmente a sua
divindade” (32).

O Concílio Niceno
II, portanto, reafirmou solenemente a distinção tradicional entre “a
verdadeira adoração (latria)” que, “segundo a nossa fé, é devida
somente à natureza divina” e “a prosternação de honra” (timetiké
proskynesis), que é prestada aos ícones, porque “aquele que se prostra
diante do ícone, prostra-se diante da pessoa (a hipóstase) daquele que na
figuração é representado” (33).

A iconografia de
Cristo implica, portanto, toda a fé na realidade da Encarnação e no seu
significado inexaurível para a Igreja e para o mundo. Se a Igreja costuma pô-la
em prática, fá-lo porque está convencida que o Deus revelado em Jesus Cristo resgatou
realmente e santificou a carne e o inteiro mundo sensível, ou seja, o homem com
os seus cinco sentidos, a fim de lhe permitir renovar-se constantemente ”a
imagem d’Aquele que o criou” (Cl 3,10).

10. O Concílio
Niceno II, por conseguinte, sancionou a tradição segundo a qual “devem
expor-se as venerandas imagens sacras, manufaturadas com tintas, com mosaico e
com outras matérias idôneas, nas igrejas consagradas a Deus, nos vasos e
paramentos sagrados, nas paredes e nos retábulos, nas casas e nas ruas; e isto
aplica-se tanto à imagem de Nosso Senhor Deus e Salvador Jesus Cristo e à de
Nossa Senhora Imaculada, a santa “Theotokos”, como às imagens dos veneráveis
anjos e de todos os homens santos e piedosos” (34). A doutrina deste
Concilio sustentou a arte da Igreja, tanto no Oriente como no Ocidente,
inspirando-lhe obras de uma beleza e de uma profundidade sublimes.

 Em particular, a Igreja grega e as Igrejas
eslavas, apoiando-se nas obras dos grandes teólogos São Nicéforo de
Constantinopla e São Teodoro Studita, apologistas do culto das imagens,
consideraram a veneração do ícone como parte integrante da Liturgia, à
semelhança da celebração da Palavra.

Como a leitura
dos livros materiais permite a audição da Palavra viva do Senhor, assim a
exposição de um ícone figurativo permite àqueles que o contemplam ter acesso
aos mistérios da Salvação      mediante a
vista. “Aquilo que por um lado é manifestado pela tinta e pelo papel, por
outro, no ícone, é manifestado pelas várias cores e pelos outros
materiais” (35).

No Ocidente, a Igreja de Roma distinguiu-se,
numa continuidade sem interrupção, pela sua ação a favor das imagens (36),
sobretudo no momento crítico em que, entre os anos de 825 e 843, os      impérios bizantino e franco se
demonstraram ambos hostis ao Concílio Niceno II. No Concílio de Trento, a
Igreja católica reafirmou a doutrina tradicional, contra uma nova forma de
iconoclastia que então se manifestava. Mais recentemente, o Concílio Vaticano
II recordou com sobriedade a posição constante da Igreja a respeito das imagens
(37) e da arte sacra em geral (38).

 11. Desde há
alguns decênios para cá nota-se um surto de interesse pela teologia e pela espiritualidade
dos ícones orientais; isso é sinal de ritual da arte autenticamente cristã. A
este    propósito, não posso deixer de
exortar os meus Irmãos no Episcopado a “manterem o uso de expor imagens
nas Igrejas à veneração dos fiéis” (39) e a empenharem-se para que surjam
cada vez mais obras de qualidade verdadeiramente eclesial. O crente de hoje,
como o de ontem, há de ser ajudado na oração e na vida espiritual mediante a
visão de obras que procurem exprimir o mistério sem nunca o ocultar. É esta a
razão pela qual, hoje como no passsado, a fé é a indispensável inspiradora da
arte da Igreja.

A arte pela arte,
que não leve a pensar senão no seu autor, sem estabelecer uma relação com o mundo
divino, não encontra espaço na concepção cristã do ícone. Seja qual for o
estilo que adote, todo o tipo de arte sacra deve exprimir a fé e a esperança da
Igreja. A tradição das imagens mostra que o artista deve ter consciência de
cumprir uma missão a serviço da Igreja.

A arte cristã
autêntica é aquela que, através da percepção sensível, leva à intuição de que o
Senhor está presente na sua Igreja, que os acontecimentos da história da
Salvação dão sentido e orientação à nossa vida e que a glória que nos está
prometida começa já a transformar a nossa existência. A arte sacra deve tender
a proporcionar-nos uma síntese visual de todas as dimensões da nossa fé. A  arte da Igreja deve ter a preocupação de falar
a linguagem da Encarnação e exprimir, com os elementos da matéria, Aquele que
“se dignou habitar na matéria e realizar a nossa salvação através da matéria”,
segundo a fórmula feliz de São João Damasceno (40).

A redescoberta do
ícone cristão ajudará também a tomar consciência da urgência de reagir contra
os efeitos espersonalizadores, e às vezes degradantes, das múltiplas imagens
que condicionam a nossa vida, na publicidade e nos “mass-media”;
trata-se de fato de uma imagem que faz chegar até nós o olhar de um Outro
invisível e que nos dá acesso à realidade do mundo espiritual e escatológico.

12. Amadíssimos
Irmãos: Ao recordar a atualidade da doutrina do VII Concílio Ecumênico, parece-me
que estamos perante um chamamento à nossa tarefa primordial de evangelização. A
secularização crescente da sociedade mostra que ela está se tornando, em larga
escala, alheia aos valores espirituais, ao mistério da nossa Salvação em Jesus Cristo e à
realidade do mundo futuro. A nossa tradição mais autêntica, que compartilhamos
plenamente com os nossos irmãos ortodoxos, ensina-nos que a linguagem da
beleza, posta a serviço da fé, é capaz de atingir o coração dos homens e de os
levar a conhecer, a partir de dentro, Aquele que ousamos representar nas
imagens, Jesus Cristo, o Filho de Deus feito homem, o mesmo, ontem e hoje e por
todos os séculos” (Hb 13,8).

  A todos dou, de
coração, a Bênção Apostólica.

Dado em Roma,
junto de São Pedro, a 4 de dezembro, memória litúrgica de São João Damasceno,
Presbítero e Doutor da Igreja, do ano de 1987, décimo do meu Pontificado.

 Referências:

    1. Especialmente
com a Carta de 8 de outubro de 1987, do Cardeal Secretário de Estado ao

     Presidente da
Sociedade Internacional para a História dos Concílios, por ocasião do Simpósio
de Istambul
(L’Osservatore Romano, ed. quot. 12/13.10.87).

     2. Epi te 1200 è
epetèio apo tes syncleoseos tes en Nikai Aghias z’Oikomenikes Synodoy

     (787-1987),
Fanar, 14 de setembro de 1987.

     3. J. D. Mansi,
Sacrorum Conciliorum nova et amplissima colectio (= Mansi) XIII, 459c.

     4. Mansi XII,
985.

     5. Cf. Mansi XII,
1007.1086 e Monumenta Germaniae Historica (= MGH), (Epistulae Karolini

     Aevi, t. 3), p.
29. 30-33.

     6. Cf. Mansi XII,
1127-1135 e 1135-1145.

     7. Segundo o
Presbítero João, representante dos Patriarcas orientais, Mansi XII, 990A e
XIII, 4A.

     8. Cf. Mansi XII,
1134.

     9. Mansi XIII,
208-209.

     10. Mansi XI,
1085.

     11. Cf. Mansi
XII, 1085-1111.

     12. Maisi XII,
994.1041.1114; XIII, 157.204.366.

     13. Mansi XII,
1086.

     14. Cf. carta de
Adriano I a Carlos Magno, em: MGH, Epistulae III (Epistulae Merowingici et

     Karolini Aevi, t.
I) p.

     587, 5.

     15. Mansi XIII,
463BC.

     16. Cf. Mansi
XIII, 200.

     17. Cf. Quartum
anatema, em: Mansi XIII, 400.

     18. Horos, in:
Mansi XIII, 377BC.

     19. Ibid., 377C.

     20. Cf. Santo
Ireneu, Adversus Haereses 1, 10, 1; I, 22. 1; em: Sources Chrétiennes (= SCH)

     264, p. 154-158;
308-310; Tertuliano, De praescriptione 13, 16; em Corpus Christianorum,

     Series Latina (=
CChL), I, p. 197-198; Orígenes, Perì Archòn, Pref. 4, 10, em SCh 252, p. 80-89.

     21. De Baptismo
IV, 24, 31; em: Corpus Scriptorum Ecclesiasticorum Latinorum (= CSEL) 51,

     p. 259.

     22. Sobre o
Espirito Santo, VII 16, 21.32; IX 22, 3; XXIX 71, 6; XXX 79, 15; em SCh 17 bis,
p.

    
298.300.322.500.528.

     23. Ibid. XXVII
66; 1-3, p. 478-480.

     24. Cf. Horos, in: Mansi XIII, 378E.

     25. Discurso
sobre as imagens III, 3, em: PG 94, 1320-1321; e B. Katter, Die Schriften des

     Johannes von
Damaskos, vol. III (Contra imaginum calumniatores orationes tres), em:

    
“Patristische Texte und Studien” 17, Berlim-Nova Iorque, 1975,
III, 3, p. 72-73.

     26. Dei Verbum,
9.

     27. Ibid., 8.

     28. Ibid., l0.

     29. Sobre o
Espírito Santo, XVIII 45, 19, em: SCh 17 bis, p. 496; Nicéia II, Horos, em:
Mansi

     XIII, 377E.

     30. Cartas de São
Gregório Magno ao Bispo Sereno de Marselha, em: MGH, Gregorii I Papae

     Registrum
Epistularum II, 1, lib. IX, 208, p. 195 e II, 2, lib. XI, 10, p 270-271; ou em:
CChL

     140A, lib. IX,
209, p. 768 e lib. XI, 10, p. 874-875.

     31. Cf. Teófano,
Chronographia ad annum, 6221, ed. C. de Boor I, Leipzig, 1883, p. 404; ou PG

     108, 821C.

     32. Carta de
Adriano I aos Imperadores, em: Mansi XII, 1062 AB.

     33. Horos, em:
Mansi XIII, 377E.

     34. Ibid., 377D.

     35. Teodoro
Studita, Antirrheticus, 1, 10, in: PG 99, 339D.

     36. Cf. Carta de
Adriano a Carlos Magno, em: MGH, Epistulae V (Epistulae Karolini Aevi, t.

     III), p. 5-57; ou
PL 98,

     1248-1292.

     37. Cf.
Sacrosanctum Concilium, 111, 1; 125; 128; Lumen Gentium, 51; 67; Gaudium et
Spes,

     62, 4-5; e também
Código de Direito Canônico, cân. 1255 e 1276.

     38. Sacrosanctum
Concilium, 122-124.

     39. Ibid., 125.

     40. Discurso
sobre as imagens, I, 16, em: PG. 94, 1246A: e ed. Kotter 1, 16, p. 89.

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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