As Dez Palavras de amor

10-mandamentosNão é totalmente evidente que se recordem dos Dez Mandamentos. É um mandamento de Deus, ao invés, assimilá-los de cor e transmiti-los aos próprios filhos: “Os mandamentos que hoje te dou serão gravados no teu coração. Tu os inculcarás a teus filhos, e deles falarás, seja sentado em tua casa, seja andando pelo caminho, ao te deitares e ao te levantares” (Dt 6,6-7).

A nossa relação com o Decálogo vem desde a infância; para muitos uma recordação desbotada, como uma poesia de Pascoli ou de Leopardi.

Esse nosso mundo é complexo, desordenado, frequentemente indecifrável. A gente pede orientação. Quer um novo “sistema de sinal”: não se orienta mais nos labirintos de uma vida que se quer sempre mais moderna e sempre menos humana e divina.

Os Mandamentos são os melhores “desembaçadores de modernidades” possíveis. Em qualquer época e latitude recordam ao homem o que é e o que é bom ser. Senão o homem não conhecerá o seu caminho, restará estranho ao seu próprio destino humano. Devemos inverter a rota. Quem conhece o caminho sabe também dar valor às coisas, tem a medida das coisas. Muitos dizem: “a vida é privada daquilo que a torna forte, habitável. O verbo latino, a mesma palavra italiana “valere”, significa saudação de uma vida feliz, a saudação mais recorrente. O homem “se desvaloriza”, perde o valor se não tem em si aquilo que lhe atribui novo vigor, nova força. O homem não é uma moeda, que se desvaloriza, que não terá nunca, valor de Deus, o Espírito de Deus, a força de Deus, a lei de Deus.

“A lei do Senhor é perfeita, reconforta a alma; a ordem do Senhor é segura, instrui o simples. Os preceitos do Senhor são retos, deleitam o coração; o mandamento do Senhor é luminoso, esclarece os olhos” (Sl 18 (19) 8-9ss). Portanto, as “Dez Palavras” são a medida da nossa relação com Deus, com o próximo, com nós mesmos. São leis eternas de amor; de um amor dado e ainda para confirmar e para experimentar.

“Amarás o Senhor teu Deus de todo teu coração de toda tua alma e de todo teu espírito. Amarás teu próximo como a ti mesmo” (Mt 22,37-40). O cristianismo, em Jesus Cristo, levou à perfeição o caminho do amor. Dilatou o mandamento do amor até o extremo dos inimigos, fez do amor um “sim” pleno, um “sim” que vence cada “não” a um amor que não se faça misericórdia e justiça, compaixão e promoção humana, defesa dos últimos, dos pequenos, dos pobres.

Ocorre encontrar essa nova sintaxe do amor! Uma linguagem mais profunda que dê voz à interioridade. É isso afinal o pensamento do Papa Francisco. Ele afirma: “Os Dez Mandamentos são um dom de Deus. A palavra “mandamento” não está em moda; para o homem parece algo negativo, a vontade de alguém que impõe limites que coloca obstáculos a vida. Os Dez Mandamentos vêm de um Deus que nos criou por amor, de um Deus que estreitou uma aliança com a humanidade, um Deus que quer somente o bem do homem. Confiemos em Deus! Confiemo-nos a Ele! Os Dez Mandamentos nos indicam uma estrada a percorrer: deixemo-nos guiar por essas Dez Palavras que iluminam e orientam quem busca paz, justiça e dignidade. Os Dez Mandamentos indicam uma estrada de liberdade” (Vídeo mensagem à Renovação para o projeto Dez Praças por Dez Mandamentos, 8 de junho de 2013).

O amor não se impõe, o amor não constringe! O amor é beleza, bondade, oferta da vida na gloriosa renúncia de si.

Os verbos hebraicos usados pelos Dez Mandamentos não são de imperativo, mas de futuro. São todos conjugados no futuro, como o primeiro mandamento. Conjugam-se no futuro e se declinam na nossa vida no presente, porque com eles entramos na realidade de Deus, “no realismo da fé”.

Leia também: Os Mandamentos de Deus

Decálogo de amor para transformar o mundo

Como se manifesta o amor de Deus?

Quais são os Dez Mandamentos?

Não são conselhos, não são proibições, não são concessões: são promessas divinas. E é extraordinário observar que essas dez palavras, para o povo de Israel, se tornam “a lei”, a lei de um povo que recebe de Deus a sua “constituição” antes de ser uma “nação”. A história do povo de Deus, que nas dez palavras encontra a sua identidade e o seu destino, é a história do “enquanto”, não do “princípio”. “No princípio” é Deus; “no enquanto” a história do homem. A “releitura” do Decálogo é uma ação profética, de conteúdo altamente profético, em um tempo em que a fé parece obscura pela presunção humana de considerar Deus longe, ausente; é melhor um deus que se torna presente com um “bezerro de ouro”, substituto dos desejos desenfreados do homem. Devemos ser conscientes que o crer deve implicar a manifestação da potencia de Deus, dos sinais que ainda caem do Céu como as “10 palavras sobre o Monte”; que o Céu é aberto sobre nós; que nenhum esforço humano, nenhuma manobra financeira contra a crise, nenhuma descoberta científica, nenhuma justiça social nunca serão suficientes para tornar plausível, conveniente, aceitável, “compatível” a nossa fé com o tempo corrente,

As Dez Palavras nos dizem como vencer a vida eterna e não falir na vida terrena; como ser verdadeiramente homens em um tempo que quase sempre beira à bestialidade instintiva; como ser filhos de Deus em um tempo em que a obediência à palavra de Deus para muitos crentes é uma calamidade, um incômodo, uma pena, um limite, à modernidade, ou melhor, uma possibilidade entre tantas outras. E de resto a história se repete: já os hebreus fugiam das ordens de Deus, se rebelavam contra Moisés e infringiam “a aliança” que Deus havia estabelecido com eles.

Os Mandamentos são preceitos de “lei natural”. São indicadores de verdadeira sociabilidade, são o alimento de máxima civilidade e de humanização possíveis, são o “código ético” das nossas sociedades. Deixamos, então, que Deus ainda tome a iniciativa: não somente quer a nossa libertação das tantas escravidões modernas, mas quer também reafirmar a sua aliança conosco. O homem não é nunca, sozinho, o protagonista da história. Ocorre incluir Deus, reincluir Deus no horizonte humano: não é nunca o limite da nossa liberdade humana.

Acolher as Dez Palavras significa participar da vida íntima de Deus; redescobrir que Deus é amor, não por aquilo que comanda ou faz, mas por aquilo que é, pela sua presença compassiva na história.

Devemos vencer um “falso moralismo”, que está reduzindo o cristianismo a uma série de preceitos estéreis de regras, que não convencem mais ninguém de suas bondades e de suas potências.

Devemos vencer um “falso laicismo”, que gostaria que se “desse a César aquilo que é de Deus” e a Deus indiferença e desprezo.

Devemos vencer um “falso ritualismo”, que gostaria na repetição fatigosa de fórmulas litúrgicas a expressão da nossa fé.

Devemos vencer um “falo naturalismo”, que gostaria do homem conformado diante do inelutável mal que aflige a história.

Devemos vencer um “falso messianismo”, que reduz o cristianismo a um juízo crítico sobre a realidade, sem compromisso, sem empenho, para muda-la, sem uma fé que faça pensamento, cultura, juízo sobre a realidade e empenho para transformá-la.

Devemos vencer um “falso devocionismo”, que reduz o cristianismo às práticas de piedade sem uma fé carismática, operativa, que procure milagres e audazes ações de renovação.

É esse o sentido da “nova evangelização”: anunciar um Deus que não se considera longe, que com Jesus desceu “do Céu para a terra” e que no Espírito Santo passou “da terra nos corações”, para realizar plenamente o destino de vida e não de morte contido no Decálogo. Como é confortante o Salmo (118,5): “Sejam direitas as minhas estradas em custodiar os teus preceitos. Não deverei me envergonhar se terei obedecido aos teus mandamentos”.

Retirado do livro: “Movidos Pelo Espírito Repartimos do Cenáculo”. Salvatore Martinez.

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
Adicionar a favoritos link permanente.