Algumas lições da morte de Muammar Kaddafi

Os meios de comunicação mostraram a maneira como foi morto Gaddafi, o ditador líbio que esteve no poder por mais de 40 anos e que subjugou indignamente seu povo, desfrutando de suas riquezas de maneira egoísta e despótica, tendo prendido e eliminado muitos dos seus adversários que lutavam por justiça e liberdade. Finalmente, para não entregar o poder, aceitou uma carnificina contra o seu próprio povo, levando o país a uma triste guerra civil que deve terminar com a sua morte.

Tudo isso é verdade, e o ditador precisava mesmo ser julgado e condenado, pois foi cruel. Mas não da maneira como foi. Ele deveria e poderia ter sido preso e julgado como foi Sadam Hussein e Hosni Mubarak, mas o que vimos foi vexaminoso e vergonhoso para a humanidade: um ser humano ser morto como se fosse o pior animal selvagem, da maneira mais cruel e indigna de qualquer ser humano. Não se buscou contra ele simplesmente justiça, mas se derramou sobre ele o mais triste ódio e a mais criminosa vingança. Isto é contra a lei de Deus.

Um erro não justifica o outro; esta é a base da moral cristã. Não se pode fazer o bem por meio de um mal. Não se pode eliminar um ser humano, por pior que ele seja, da maneira que vimos ser eliminado Gaddafi. Foi um ato vergonhoso para a humanidade e que merece desagravo.

Todo o episódio que levou à morte de Muammar Gaddafi serve de lição para todos os países. Não há lugar no mundo contemporâneo para ditaduras ferrenhas que se instalam no poder, como se seus governantes fossem donos da Nação e do povo; como se vê ainda em Cuba, depois de 50 anos sem que o povo possa, ao menos, eleger seus governantes. Isso levou esta Ilha a um atraso sem precedentes. O mesmo acontece na Coréia do Norte e outros países Árabes, onde o povo está saindo às ruas para exigir democracia: Irã, Egito, Iêmen, Arábia Saudita, Líbia etc.

A Igreja ensina que os cidadãos têm o direito e o dever de escolher livremente seus governantes; diz o nosso Catecismo que “se, por um lado, a autoridade remete a uma ordem fixada por Deus, por outro, são entregues à livre vontade dos cidadãos a escolha do regime e a designação dos governantes” (§1901). “A autoridade pública deve respeitar os direitos fundamentais da pessoa humana e as condições de exercício de sua liberdade” (Cat. §2254).

Um povo sem liberdade é um povo que perde a sua dignidade; é como um pássaro preso em uma gaiola: tem comida, mas não tem vida. Por isso a Igreja ensina que “a autoridade não deve se comportar de maneira despótica, mas agir para o bem comum, como uma força moral fundada na liberdade e no senso de responsabilidade” (§1902). “A autoridade política deve desenvolver-se dentro dos limites da ordem moral e garantir as condições para o exercício da liberdade”. (§1923)

Quando um povo não escolhe livremente seus governantes, não tem motivação para cooperar com eles. A Igreja condena também uma intervenção exagerada do Estado na vida da nação, pois isso limita a livre inciativa e o progresso.

“Uma intervenção muito acentuada do Estado pode ameaçar a liberdade e iniciativa pessoais. A doutrina da Igreja elaborou o chamado princípio de subsidiariedade” (Cat. §1883). “Segundo este princípio, nem o Estado nem qualquer outra sociedade mais ampla devem substituir a iniciativa e a responsabilidade das pessoas e dos órgãos intermediários (§1894).
E a Igreja ensina também que o cristão não está obrigado a obedecer leis imorais: “O cidadão está obrigado em consciência a não seguir as prescrições das autoridades civis, quando contrárias às exigências da ordem moral. “É preciso obedecer antes a Deus que aos homens” (At 5,29). (Cat.§2256)

O poder não pode ficar nas mãos de poucas pessoas, pois sabemos que “a carne é fraca” e que “o poder corrompe as pessoas”; por isso a Igreja ensina que:

“É preferível que cada poder seja equilibrado por outros poderes e outras esferas de competência que o mantenham em seu justo limite. Este e o principio do ‘estado de direito’, no qual é soberana a lei, e não a vontade arbitrária dos homens.” (Cat. §1904).

É por isso que numa autêntica democracia os três poderes são interdependentes: Judiciário, Executivo e Legislativo; e um não pode subjugar os outros, como temos visto acontecer fortemente hoje em alguns países da América Latina; isso destrói a verdadeira democracia.

O Catecismo da Igreja diz com todas as letras que: “Deve-se louvar a maneira de proceder daquelas nações em que a maior parte dos cidadãos, com autêntica liberdade, participa da vida pública.” (§1915). “É legítima a diversidade dos regimes políticos, contanto que concorram para o bem da comunidade”. (§1922)

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Prof. Felipe Aquino

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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