A verdade por trás de: “O Código da Vinci” – EB

Em síntese: O jornalista Richard Abanes acompanha, passo a passo, as afirmações de Dan Brown e mostra que não têm fundamento histórico. Dan Brown escreveu um romance policial, que é uma ficção baseada em premissas criadas pelo autor e não sobre dados históricos.

Ainda se escreve muito sobre o romance policial “O Código da Vinci” de Dan Brown ¹. Vários comentadores têm mostrado a inconsistência dos dados pretensamente históricos em que se baseia o autor para questionar as origens do Cristianismo. Entre os mais recentes comentários está o de Richard Abanes, cujo original inglês tem por título “The Vinci”. O texto inglês foi traduzido para o português pela editora Rideel, Avenida Casa Verde 455, 02519-000 São Paulo (SP).

Dessa obra extrairemos, a seguir, alguns tópicos dos mais relevantes:

A Divindade de Jesus

“O Código da Vinci”

Um voto à divindade de Jesus. Foi no Concílio de Nicéia, em 325, que os líderes da Igreja decidiram, por votos, fazer Jesus divino. “Até aquele momento da história, Jesus era visto pelos Seus seguidores como um profeta mortal” (DVC página 233).

“A verdade por trás de O Código:”

O Concílio de Niceia nada teve a ver com decidir a divindade de Jesus. O assunto mais interessante antes desse, envolveu um homem chamado Ário, o qual ensinava que Jesus foi um ser criado.

É importante registrar que, ao final do seu ministério terreno, a divindade de Cristo já estava sendo reconhecida, conforme evidenciado nas palavras de Tomé a Jesus: “Meu Senhor e meu Deus” (João 20, 28). Outras passagens da Bíblia em que se relaciona a divindade a Jesus incluem João 1, 1; Tito 2, 13; Hebreus 1, 8-10 e 2 Pedro 1, 1.

Ao final do segundo século, essa crença estava firmemente assimilada pelos Cristãos. Considere as seguintes descrições sobre Jesus:

Justino Mártir (aproximadamente 150): “Sendo o primogênito Verbo de Deus, é o próprio Deus”; “ambos Deus e Senhor dos exércitos”.

Irineu (aproximadamente 185): “Nosso Senhor e Deus, e Salvador e Rei”.

Clemente de Alexandria (por volta de 200): “Verdadeiramente a maior Divindade manifesta, Ele que é feito idêntico ao Senhor do universo, porque ele era Seu Filho”.

2. Maria Madalena e Jesus

2.1. O casamento de Jesus

O Código Da Vinci:

O casamento de Jesus. “Um tema particularmente problemático se manteve repetitivo nos evangelhos (gnósticos). Maria Madalena (…) Mais especificamente, o seu casamento com Jesus Cristo” (DVC página 244).

A verdade por trás de O Código:

Nenhum dos evangelhos gnósticos contido na biblioteca de Nag Hammadi – o Evangelho da Verdade, o Evangelho de Tomé, o Evangelho de Felipe –  contém referência alguma ao casamento entre Maria Madalena e Jesus. O Evangelho de Maria também silencia sobre o assunto.

2.2. A companheira de Jesus

O Código da Vinci:

“A companheira de Jesus. O Evangelho de Felipe diz que “a companheira do Salvador é Maria Madalena. Cristo a amava mais do que a todos os discípulos e costumava beijá-la sempre na boca. O resto dos discípulos ficou ofendido com isso e expressou reprovação. Eles disseram a ele: ‘Por que você a ama mais do que a nós?'”… Como qualquer estudioso de aramaico lhe dirá, a palavra companheira, naqueles dias, literalmente significava esposa” (DVC página 246).

A verdade por trás de O Código:

O Evangelho de Felipe não é escrito em aramaico. Ele é escrito em copta – uma forma mais recente de egípcio. E mesmo ele é uma tradução de um texto grego primitivo, não aramaico. Além disso, de acordo com o Professor Craig Blomberg do Denver Seminary, “nenhuma palavra da ‘companheira’ em aramaico ou hebraico significa esposa!”. Margaret Mitchell, professora de história da igreja primitiva na University of Chicago Divinity School, concorda substancialmente. Segundo Mitchell, O Código está usando “uma tradução duvidosa” de uma palavra que “é usualmente traduzida como amiga ou companheira.”

2.3. O casamento na perspectiva judaica

O Código Da Vinci:

“O ponto de vista Judaico do casamento. Jesus sendo um homem casado faz “infinitamente mais sentido do que nossa visão bíblica normal de Jesus” porque “o decoro social durante aquele tempo proibia um homem judeu de ser solteiro” (DVC página 245).

A verdade por trás de O Código:

É verdade que durante os tempos do Antigo Testamento esperava-se que os homens fossem casados. Na época de Jesus, entretanto, os judeus tinham se tornado mais flexíveis sobre o casamento. João Batista, por exemplo, permaneceu solteiro. E em 1 Coríntios 7, 8, o apóstolo Paulo encoraja os fiéis solteiros a permanecerem nessa condição, “assim como eu”. Nesse capítulo, Paulo trata especificamente do celibato, endossando-o como uma “dádiva” que é concedida a algumas pessoas.

3. A Direção da Igreja

O Código Da Vinci:

“Maria Madalena e a liderança da igreja. O Evangelho de Maria (Madalena) revela que Maria foi instruída por Jesus “em como conduzir a Sua Igreja… Como resultado, Pedro expressa seu descontentamento sobre ficar em segundo plano em relação a uma mulher”. De acordo com o Evangelho de Maria e o Evangelho de Felipe “inalterados”, “não foi a Pedro que Jesus deu orientações para estabelecer a Igreja Cristã. Foi para Maria Madalena” (DVC páginas 247-248).

A verdade por trás de O Código:

Olhando para o Evangelho de Maria do segundo século, nós devemos observar que ele não é parte dos manuscritos de Nag Hammadi (como O Código indica em algum lugar). Somente esses pequenos fragmentos dele existem: duas histórias muito curtas copiadas aproximadamente no terceiro século (em grego) e um parco fragmento mais longo copiado no quinto século (em copta).

A parte citada em O Código é tirada, parcialmente, dos fragmentos gregos e parcialmente do fragmento copta Mas eles realmente não dizem nada sobre Maria sendo escolhida para assumir o comando da Igreja. Nem revelam que Maria era esposa de Jesus. Os fragmentos simplesmente dizem: 1) Jesus amava Maria “mais do que o resto das mulheres” e “mais do que” os outros apóstolos, e que 2) Jesus dividiu com Maria certas verdades que ele não partilhou com os outros discípulos.

O real Evangelho de Maria comunica que o que Jesus supostamente transmitiu – o qual Brown omite de O Código – nada tem a ver com a liderança da Igreja. É sobre “poderes” metafísicos e as maneiras que eles utilizam para conquistar o espírito – tais como ignorância e cólera. Além disso, Pedro não expressa irritação sobre essa situação de liderança, ou falta dela. No texto gnóstico, ele contesta as afirmações de Madalena porque, como outro apóstolo diz, “esses ensinamentos são ideias estranhas”.

Com relação ao Evangelho de Felipe, ele também não diz nada sobre Jesus ordenando a Maria Madalena para tomar o comando por ele. O texto é, antes de mais nada, sobre “o sentido e o valor dos sacramentos” dentro do paradigma Gnóstico. Ironicamente, se esse texto faz alguma coisa, ele remove a essência de qualquer afirmação sobre Maria e Jesus serem casados. Ele faz isso através da adesão a um dos dogmas básicos do antigo Gnosticismo o qual declara que toda a substância física era inerente do mal. Consequentemente, relações sexuais eram intrinsecamente degradantes!

O Evangelho de Felipe vai mais longe, ao dizer que relações maritais sujam a mulher. Como explica Wesley Isenberg, tradutor do Evangelho de Felipe: “Mulheres sujas” são todas as mulheres que participam do relacionamento sexual, ou seja, do ‘casamento da contaminação’, que é carnal e voluptuoso (91, 34-24; 85,24).”

4. A ameaça do feminino

O Código Da Vinci:

“A ameaça do feminino. Os líderes da Igreja “predominantemente masculina” estavam tão ameaçados pelo poder da capacidade reprodutiva das mulheres, que eles rotularam o sagrado feminino e a deusa como sujos. “A mulher, outrora sagrada por dar a vida, era agora a inimiga” (DVC página 238).

A verdade por trás de O Código:

A mulher, de acordo com o Cristianismo, não é “inimiga”. Gênesis 2:18-25 nos diz que a mulher é realmente a ajudante indispensável do homem e digna de honra. Jesus e seus primeiros seguidores procuraram demonstrar, de forma consistente, essa verdade e elevar as mulheres a um lugar de igualdade com os homens. Por exemplo, foi dado às mulheres acesso direto a Cristo, enquanto ele fazia seus sermões (Lucas 10, 38-39). Isso rompeu com a tradição hebraica, a qual determinava uma rígida separação de homens e mulheres nos contextos religiosos – habitualmente ocorria a exclusão das mulheres de várias liberdades e bênçãos gozadas pelos homens, tais como o acesso pessoal a um rabino como Jesus.

5. Os Merovíngios

O Código Da Vinci:

“Os Merovíngios. “A linhagem de Cristo cresceu calmamente sob proteção, na França, até fazerem uma ousada mudança no quinto século, quando se casaram com pessoas de sangue real francês e criaram uma linhagem conhecida como linhagem merovíngia… Os merovíngios fundaram Paris” (DVC página 257).

A verdade por trás de O Código:

Paris foi fundada por um povo celta, os gauleses e especificamente a tribo dos Parissi, que se “assentaram lá entre 250 e 200 a.C.” A cidade se tornou parte do Império Romano depois de ser conquistada em 52 a.C., por Júlio César. Os merovíngios nem mesmo existiam nesse tempo. Eles apareceram centenas de anos mais tarde, quando a área foi tomada pelos Francos, uma união das tribos Germânicas do oeste. Essas tribos migraram até a Bélgica Gaulesa em aproximadamente 200 a 250 e sob o reinado do Rei Clovis l (481-511), tomaram o controle da área hoje chamada França em aproximadamente 486.

O começo da linhagem merovíngia pode ser traçado pelo Rei Meroveu que governou de aproximadamente 447 a 457 – muito tempo antes de os Francos entrarem na região de Paris. Foi seu neto, Clovis l, quem escolheu a já existente cidade de Paris para sua capital.

6. O Priorado de Sião

O Código Da Vinci:

“A natureza do Priorado de Sião. Atualmente localizada na França, essa organização é “uma das mais antigas sociedades secretas sobreviventes na Terra” (DVC página 113).

A verdade por trás de O Código:

Há, pelo menos, três organizações chamadas “O Priorado de Sião”. A primeira foi uma ordem monástica católica romana fundada em Jerusalém no mosteiro de Nossa Senhora do Monte Sião em aproximadamente 1100. Esse grupo de monges, conhecido como Ordre de Notre Dame de Sion (Ordem de Nossa Senhora de Sião), deixou de existir em 1617, quando foi absolvida pelos Jesuítas.

A história do segundo e do terceiro Priorados de Sião pode ser traçada pelo francês Pierre Plantard (1920-2000), que em 1942 fundou um grupo anti-maçônico e anti-judeu conhecido como Alfa Gálatas. Essa Vaincre “conquista”) temporária eram uma mistura de bases de anti-semitismo com antimaçonaria, observações pró-nazistas, espiritualidade esotérica e mitologia.

Pouco mais se sabe sobre Plantard até 1593, quando ele recebeu uma sentença de seis meses de prisão por fraude. Depois, em 1956, ele e três amigos formaram um clube social “devotado à causa de moradias de baixo custo.” Eles chamaram seu grupo
de Priorado de Sião e criaram um jornal intitulado C.I.R.C.U.I.T. Esse Priorado foi dissolvido em um ano.

O terceiro Priorado de Sião, também iniciado por Plantard, pode ser delineado no início dos anos 60, quando ele se tornou obcecado pela idéia de ser um mestre de ocultismo e descendente de reis. Ele recrutou uma série de seguidores e iniciou uma cruzada para trazer de volta a monarquia francesa através da popularização da idéia de que existia uma linhagem real escondida na França. Plantard e seus associados procuraram alcançar seus objetivos através do depósito de papéis falsificados em bibliotecas, incluindo a Bibliotheque Nationale (Biblioteca Nacional) em Paris.

Até aqui as ponderações do jornalismo Richard Abanes, movido pelo princípio: “Se Platão é amigo, mais amiga é a verdade – Amicus Platô, magis amica veritas”.

***

¹ Tenha-se em vista a notícia colhida no JORNAL DO BRASIL de 9/4/05, p. A/6:

“Em Paris, já virou mania. Londres e até Rosslin, na Escócia, não ficaram atrás. Todo mundo quer percorrer os lugares citados no livro O Código Da Vinci. Sem falar no comércio em torno dessa febre, que vai de livros sobre as obras do artista, bíblias, exposições e até filmes. O turismo não podia ficar de fora. Na Europa, chovem opções de roteiros para conhecer os locais citados no romance.

No Brasil, a agência Stella Barros lançou o pacote Nos Passos de Da Vinci em hotéis de primeiríssima categoria, com passeios e noites regadas a discussões acerca do livro, dirigidas pela dra. Reverenda Rebecca Brown, guia teológica especialista no assunto (…)

Revista: “PERGUNTE E RESPONDEREMOS”
D. Estevão Bettencourt, osb
Nº 517, Ano 2005, p. 323

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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