A Moral no Antigo Testamento

O Herdeiro em Idade Infantil
Os dois capítulos anteriores procuravam mostrar a história do Antigo Testamento como paulatina ascensão do homem rude a um grau de religiosidade mais pura e perfeita.  Nessa ascensão, porém, se acham, de princípio a fim, disseminados episódios que a consciência cristã, à primeira vista, condena: os homens da Antiga Lei, mesmo os mais chegados a Deus, eram dotados de mentalidade primitiva e, de acordo com ela, praticavam o que hoje diríamos “escândalos morais” mentira, fraude, crueldade para com os adversários, concubinato, poligamia.  Esses males morais desnorteiam particularmente o leitor moderno pelo fato de que nem a consciência parecia repreender os israelitas que assim procediam, nem o próprio Deus os censurava ou coibia, como esperaríamos nós.

São esses fenômenos estranhos ou, se quisermos, os “escândalos” da moralidade do Antigo Testamento que ora se impõem à nossa consideração. Proporemos abaixo alguns princípios de caráter geral (cap. VII), que projetarão luz sobre aspectos particulares da moralidade veterotestamentária (cap. VIII).

Três afirmações cada vez mais precisas nos possibilitarão proferir um juízo sobre as narrativas “pouco edificantes” da história sagrada.

1. Antes do mais, no estudo do problema é preciso que se atenda ao seguinte:
Nem tudo que o Antigo Testamento narra é proposto ou insinuado como norma de conduta para o leitor. Em outras palavras: nem todos os heróis de um livro inspirado por Deus são inspirados em cada um dos seus atos.

Verifica-se que os opúsculos históricos da Bíblia por vezes referem os feitos iníquos, sem os julgar. Por vezes, porém, acrescentam às narrativas uma nota condenatória do mal: ora são os próprios personagens bíblicos que se penitenciam por ter agido erradamente, ora é o Senhor que censura os feitos pecaminosos,2 ora é o modo de narrar mesmo do hagiógrafo que dá a entender tratar-se de um ato mau à luz da própria moralidade do Antigo Testamento.

Ora, que significa o fato de que, na Sagrada Escritura, há narrativas de pecados, e de pecados reconhecidos como tais?

a)  Que o homem peque, certamente isto não é edificante.
Todavia não é algo que, dadas as circunstâncias habituais em que se desenvolve uma vida humana, deva por si causar surpresa. Poderia até haver certo grau de farisaísmo ou hipocrisia naqueles que se admirassem por encontrar falhas no próximo; nem mesmo os Santos nasceram tais,4 mas se tornaram santos por graça de Deus, através de muitas lutas e, não raro, quedas. Ora esta tragédia comum a todo homem, mesmo aos justos. Não escapa à perspectiva dos autores sagrados; já que ela constitui o fundo real da vida humana, ela tinha de ser envolvida dentro do “temário” da Bíblia e tornar-se um dos assuntos do colóquio de Deus com o homem através das páginas sagradas;

b) o fato de que a criatura peque e depois, penitente, reconheça a culpa, não somente não espanta, mas é autêntico motivo de edificação,5 pois a penitência é coisa que nem todos praticam, embora todos, em certo grau, sejam pecadores.  Se, pois, o ideal de uma vida virtuosa inclui a penitência, não nos surpreende que Deus, no Livro Sagrado, tenha proposto a figura de homens penitentes, sem silenciar o pecado que previamente cometeram.

2. Estas observações, porém, não bastam para resolver todo o problema, pois sabemos que as histórias de penitência edificantes não são as mais frequentes nem as mais características do Antigo Testamento.  Além disso, pergunta-se: embora no homem o pecado não seja para admirar, por que é que a Bíblia o descreve? Encontra-se repetidamente a narrativa de feitos iníquios nas páginas que, como se diz, visam por excelência a santificação dos leitores!  Será possível crer no valor de tais Escrituras?

Em resposta, dir-se-á: a dificuldade é formulada a partir de um pressuposto assaz deficiente.  A história bíblica foi redigida não apenas para evocar casos morais edificante, histórias que diretamente induzam à virtude; quem assim penasse, a reduziria a um livro de pedagogia infantil ou, conforme  o Apóstolo (1 Cor 3, 1-3; Hb 5, 12-14; Ef 4, 14), a um alimento para crianças (leite).  Contudo, além de nutrimento infantil, histórias edificantes, há na Bíblia também alimento sólido, ou seja, profundas verdades dogmáticas, que manifestam a sublime Sabedoria divina ao homem capaz de a aprender (cf. 1Cor 2, 6-16).

E como se hão de desvendar essas verdades dogmáticas transmitidas pelas histórias “não edificantes” da Sagrada Escritura?
Tenha-se em mente que a história sagrada é a história de gênero humano colocado entre a queda original e o respectivo reerguimento, entre o Prevaricador e o Restaurador, entre o primeiro Adão, infiel, e sua antítese, o segundo Adão. Ora quem, como os autores bíblicos (ou, em última análise, o Espírito Santo), descreve a história sob esse ponto de vista, não pode deixar de narrar as manifestações de miséria espiritual do homem decaído; estas constituem o fundo ao qual se sobrepôs a misericórdia do Salvador; somente se se mostra com clareza a depressão moral a que chegou o gênero humano após o primeiro pecado, é que se realça a correlativa generosidade do Criador, ou seja, o fato de que “onde o pecado abundara, superabundante foi a graça” (cf. Rm 5, 20).
Em outros termos: os “escândalos” narrados no Antigo Testamento não nos incutem a miséria dos filhos de Adão apenas para se descrever a história, para verificarmos (talvez com curiosidade mórbida) o que se deu, mas, antes de tudo, para que se ponha em relevo a figura grandiosa do segundo Adão, a condescendência e a imensa caridade do Salvador, que houve por bem acudir a tais homens…
Ao se defrontar, pois, com os episódios de “barbárie” das Escrituras antigas, não se deixe o leitor prender ao aspecto repugnante que eles podem Ter em comum com as narrativas de panfletos modernos; passe além das aparência superficial, e olhe “para dentro desses acontecimentos” com o olhar de Deus; então também eles lhe falarão de algo de muito sublime, pois, em última análise, lhe evocarão o Deus invencível em bondade, que se dignou dar remédio a tanta vileza da criatura; é, sim, conforme os teólogos, nos atos de compadecer-se da contínua fraqueza humana e perdoar que Deus por excelência revela a sua Onipotência, a sua ilimitada Perfeição.

3. Estas considerações, por muito significativas que possam ser, deixam aberta ainda uma questão: por vezes no Antigo Testamento os homens cometem atos ao nosso critério pecaminosos, sem que a consciência os pareça incriminar;8  nem Deus é dito repreender tais ações. Ora são esses varões (Abraão, Davi…) que a Bíblia apresenta como justos ou heróis do Antigo Testamento.  Que santidade é essa?  Não estaria assim insinuado que o que hoje se tacha de pecado, antigamente podia ser até virtude ?  Não se poderia inferir da Bíblia que o bem e o mal moral são questões de oportunidade, de modo contigente ?
Para dissipar esta dificuldade é preciso que de novo consideremos o problema dentro de um quadro muito vasto, à luz de Deus mesmo, não simplesmente do ponto de vista dos homens do século XX.

Qual será, pois, esse autêntico modo de ver?
Quem observa as obras de Deus verifica que o Criador costuma dar existência a cada ser mediante um processo de desenvolvimento paulatino: na natureza os corpos vivos se originam em estado embrionário e, através de um desabrochar mais ou menos lento, atingem a estatura definitiva: energias e qualidades neles contidas só aos poucos se desdobram.10
Ora o que se dá na ordem física se verifica igualmente na ordem moral, no que diz respeito à consciência humana. Haja vista a criança: a sua consciência é assaz rudimentar; poucos deveres indica, e poucas restrições impõe.  O pequenino conhece, sem dúvida, um preceito fundamental:
“Faze o bem, evita o mal”. Todavia, em que consiste exatamente o bem a praticar e o mal a evitar ele não o sabe dizer com muita clareza: poucas são as conclusões práticas que ele deduz daquele mandamento básico; assim o bem, para ele, vem a ser primariamente o que os mais velhos lhe indicam como tal; o mal será primariamente desobedecer a estes.  Só aos poucos é que o adolescente vai percebendo as consequências concretas do princípio “Faze o bem, evita o mal”.
Pois bem, Deus quis que se desse com o gênero humano inteiro algo de semelhante ao que se verifica com toda criança: nos primórdios da história, os homens tinham uma consciência moral pouco desenvolvida, a qual através dos séculos se foi tornando mais apurada, minuciosa.
Consequentemente também os membros do povo de Deus, que o Criador se dignou tornar portadores da verdadeira fé, possuíam, sim, apesar da sua sublime vocação, uma consciência moral ainda embrionária.  Percebiam bem que é preciso absolutamente “fazer o bem e evitar o mal”, obedecer a tudo que vissem ser da Vontade de Deus; mas a maioria das aplicações concretas deste princípio escapavam à sua percepção.  Não há dúvida, Deus lhes poderia ter revelado imediatamente tudo que a lei natural hoje nos incute; preferiu, porém, um lento desabrochar que, de resto, mais condizia com a maneira como o Senhor criou e rege o mundo.
E dois seriam, conforme o plano divino, os fatores que haviam de fomentar esse desabrochar: de um lado, a reflexão, a qual levaria os homens, de geração em geração, a compreender melhor as exigências do princípio “Faze o bem, evita o mal”.  De outro lado, também a Revelação divina os ajudaria a perceber a via para atingirem a perfeição (a Revelação era absolutamente necessária, suposta a elevação do homem a um fim sobrenatural, fim que ultrapassa as exigências da natureza).  Sob a influência, pois, destes dois “catalisadores”, a consciência do povo de Deus foi percorrendo o longo caminho que vai da moralidade simples dos Patriarcas do Antigo Testamento à lei de Cristo no Evangelho – a caridade; o percurso foi lento e árduo, em grande parte por causa das consequências do pecado original que obscureciam a inteligência e debilitavam a vontade do homem.

Mais precisamente: a história do povo de Deus, ou seja, a história Bíblica, começa com a vocação de Abraão; Deus, desejando preservar a Verdadeira fé e a esperança messiânica no mundo idólatra, houve por bem escolher Abraão e sua posteridade para constituírem o povo messiânico; Chamou, pois, o Patriarca de Ur da Caldeia para a terra de Canaã, onde se estabeleceu a nação abraamítica ou israelita. É claro que essa gente, Oriunda de ambiente pagão, recebera, como herança de seus antepassados muitas tradições e costumes inspirados por mentalidade rude e supersticiosa, enfim, pela mentalidade que podiam Ter os homens após o pecado de Adão, dotados de consciência primitiva, de inteligência Obscurecida e vontade inclinada ao mal. Era com gente de tal nível cultural e moral que o Senhor havia de tratar continuamente… Não há dúvida, esse patrimônio primitivo de tradições e crenças. O Criador havia de poli-lo, elevá-lo, pois não estava à altura do culto do verdadeiro Deus; mas o Legislador não quis cortar bruscamente todas essas tradições (isto seria antipedagógico); eliminou em termos severos o que era estritamente politeísta; quanto às outras observâncias, preferiu ir contemporizando, tomando o israelita como era; permitiu, pois, que o povo vivesse, em parte, à semelhança dos demais povos orientais; às práticas antigas não politeístas, o Mestre divino apenas quis insuflar novo espírito, comunicando nobres idéias e aspirações aos israelitas mediante as instituições herdadas dos antenatos caldeus. Assim, fazia com que o povo se fosse elevando espiritualmente, até um dia poder ouvir a mensagem do Evangelho: “Este é o meu preceito: que vos ameis uns aos outros, como Eu vos amei” (Jo 15, 12).

Disto isto, é muito importante frisar que uma consciência moral ora mais, ora menos embrionária, como a tinham os homens do Antigo Testamento, não é incompatível com santidade, e elevada santidade.

E como não é incompatível?
Em qualquer época da história, a inocência consiste em que o homem nada faça contra a sua consciência, nada que lhe pareça contradizer à Vontade de Deus. Ora os grandes vultos da história sagrada, como dá a entender o texto bíblico, se esforçavam por não transgredir as poucas normas que o seu senso moral lhes incutia e, quando for debilidade da natureza as violaram, disto se arrependeram sinceramente.
Tais homens davam a Deus tudo que sabiam dever dar-lhe; este “tudo”, não há dúvida, era pouco em comparação com o padrão moral que hoje nos é proposto; acarretava, porém, esforço notável para eles. Na medida em que a consciência não os repreendessem, podiam seguir seus costumes primitivos; fazendo-o, não deixavam de nutrir prontidão absoluta para cumprir o que Deus lhes pedisse.13  Ora era esta incondicional adesão ao Senhor que os tornava justos. Tais varões, por conseguinte, são modelos de santidade, não pelo aspecto exterior de sua vida (este, por vezes, não atrai a consciência cristã), mas pelo ânimo interior com que se entregavam ao pouco ou muito que percebiam ser da Vontade de Deus ( e este ânimo interior ainda hoje é digno de ser imitado por qualquer cristão: assim a fé de Abraão, o fervor da oração de Davi, o zelo de Elias pela causa de Javé, etc.).

À luz destas ideias, vemos que é preciso distinguir dois tipos de moralidade primitiva, imperfeita: uma, a do homem nos primórdios da história; é compatível com elevada santidade, desde que o indivíduo em nada contradiga a sua consciência. Outra é a moralidade imperfeita do homem que teve conhecimento do Evangelho: para este indivíduo, repetir o que era praticado pelos justos do Antigo Testamento seria ilícito, já que a consciência iluminada por Cristo tem muito mais clara intuição do bem e do mal, é mais exigente.
Ao passo que outrora a imperfeição da moralidade provinha do Estado infantil da consciência humana, ela hoje proviria de decrepitude ou degenerescência culpável. Há, numa palavra, o primitivo ascendente (certos atos praticados no Antigo Testamento) e o primitivo decadente (os mesmos atos, caso sejam reproduzidos por quem de algum modo conheceu Cristo). Não há dúvida, o que hoje é pecado contra a lei natural sempre foi hediondo aos olhos de Deus (o mal não depende de mera convenção humana), mas não sempre foi percebido como tal pelos homens, já que a sua consciência moral só aos poucos, através de séculos, atingiu o pleno desenvolvimento.

Em conclusão: Deus ouve por bem fazer do homem seu filho, chamando-o ao consórcio íntimo da vida e da felicidade divinas, em vez de o deixar na qualidade de servo; em lugar da lei e do espírito de temor, que precederam a vinda de Cristo, quis dar-lhe o espírito de amor. Ora está claro, que um pai tem, em relação ao filho, exigências muito mais íntimas e delicadas que as do patrão em relação ao servo. Noblesse exige, o que quer dizer: o homem se aperfeiçoou, foi dignificado; por conseguinte, a consciência lhe pede mais do que pedia outrora, a fim de que se mantenha a altura do seu destino sobrenatural. Feliz todo aquele que se sujeita a tais imperativos, pois “servir a Deus, servir à lei de Cristo, é reinar!” 14
O significado destas considerações se patenteará ainda melhor no capítulo seguinte, que analisará alguns pontos particulares da moralidade do Antigo Testamento.

Haja vista apenas o caso de Abraão, que, dada a esterilidade de sua esposa Sara, se une tranquilamente à escrava Agar, afim de Ter prole. É, aliás, Sara quem estimula Abraão a tal feito (cf. Gn 16,2s). O filho assim gerado, Ismael, satisfaz o Patriarca; Deus mesmo promete que a Ismael dará uma posteridade inumerável, sinal de benção (cf. Gn 16, 10; 17, 20). A respeito deste episódio, veja-se a pág. 112.
Como exemplo, vem o caso de Davi, que, após duplo crime Repreendido pelo profeta Natã, reconheceu a culpa (cf.  2 Sm 12, 11-14).
Também Saul se penitenciou quando objurgado por Samuel (cf. 1 Sm 15, 24s.). Algo de semelhante fez o sacerdote Heli (cf. 1 Sm 3,18).
O incesto de Amnon com sua irmã Tamar é nitidamente relatado como ato pecaminoso (cf. 2 Sm 13, 1-22). O mesmo se diga da inveja de Saul contra Davi (cf. 1 Sm 19, 25-30).
Ao Narrar o proceder fraudulento de Jacó, que usurpou a benção Reservada a seu irmão Esaú, o autor sagrado dá mais de uma vez a entender que se trata de um feito condenável:
Rebeca e Jacó reconhecem que se o artifício for descoberta prematuramente, atrairá maldição, e não benção (cf. Gn 27,12s).
Isaque, ao perceber a fraude, censura Jacó (cf. 27,35);
Rebeca é punida, pois deve mandar partir o filho predileto para a Mesopotânia (cf. 27, 42-45);
Jacó  também é castigado, porque tem de passar longos anos no exílio, após os quais teme a vingança de seu irmão Esaú (cf. 29, 28-30;32, 10-13) Além disto, o próprio Jacó é, por sua vez, enganado por seu tio Labã (cf. 29, 25) e por seus filhos, que dele conseguem separar o filho bem-amado José (cf. 37, 25-36). Executa-se apenas a Bem-aventurada Virgem Maria.
S. Ambrósio (+ 397) notava a respeito da penitência de Davi (2Sm 12, 11-14):
“Davi pecou – coisa que costumavam fazer os reis; mas submeteu-se à penitência, chorou, gemeu – coisa que não costumavam fazer os reis.
Confessou a culpa, pediu indulgência, prostrado por terra deplorou a desgraça, jejuou, orou… Aquilo que os simples cidadãos se envergonham de fazer, o rei não hesitou em realizá-lo abertamente… Que tenha caído em falta, é obra da natureza; que a tenha apagado (pela penitência), é obra da virtude (sobrenatural)” (Apologia David ad Theodosium Augustum, 2, 6).
S.  Paulo fala da philanthropia de Deus, em Tt 3, 4.

***

7. Note-se a oração do Missal Romano no 26º Domingo do Tempo Comum:
“Ó Deus, Manifestais a vossa onipotência, antes de tudo, compadecendo-Vos e perdoando…”
É, de fato, perdoando um sem-número de vezes ao pecador sinceramente arrependido que Deus Manifesta sua inesgotável ou infinita Bondade. A bondade e o amor das criaturas, por mais intensos que sejam, tendem a arrefecer e se extinguir, quando não encontram correspondência.
8. Assim Abraão, ao emigrar para o Egito, diz tranquilamente que sua esposa Sara é sua irmã, afim de que o Faraó, cobiçando a bela Sara, não venha a matar o marido Abraão (cf. Gn 12, 10-20).
O mesmo Patriarca se une à sua serva Agar, numa espécie de adultério (cf.Gn 16, 1-3). Tem concubinas até o fim da vida. E, apesar de tudo, diz o Gênesis que “morreu em feliz velhice”! (Gn 25, 8)
Davi foi um guerreiro não raro cruel; teve igualmente seu harém. Não obstante, Deus desde cedo o abençoou, prometeu tornar inabalável o Seu trono até que de sua linhagem nascesse o Messias; cf. 2Sm 7, 8-16.
9. É essa relatividade da Moral que professa a moderna “Ética da situação” ou o “Existencialismo ético”.
10. O Criador se poderia comparar a um agricultor que costuma lançar sementes na terra, e não plantar árvores adultas, carregadas de frutos.
As ideias desenvolvidas neste item 3 se devem, quanto ao fundo, à Obra de Maritain, Histoire d’Abraham (Paris, 1947).o israelita como era; permitiu, pois, que o povo vivesse, em parte, À semelhança dos demais povos orientais; às práticas antigas não politeístas, o Mestre divino apenas quis insuflar novo espírito, comunicando nobres ideias e aspirações aos israelitas mediante as instituições herdadas dos antenatos caldeus. Assim, fazia com que o povo
se fosse elevando espiritualmente, até um dia poder ouvir a mensagem do
Evangelho: “Este é o meu preceito: que vos ameis uns aos outros, como Eu vos amei” (Jo 15, 12)”.
11. A seguinte comparação, proposta por um autor moderno, vem oportunamente ilustrar a doutrina:
“Quando um professor quer influenciar a mente do seu discípulo, esforça-se por descobrir as idéias estranhas e tolas que este possui. Tendo-as percebido, serve-se delas para insinuar aspectos da verdade… Ora na Bíblia o Espírito Santo é tal mestre, tal pregador… Deus serviu-se das concepções de Israel como de um ponto de partida, embora fossem pouco
exatas. Começou (o seu ensinamento) utilizando os conceitos que Israel possuía; aperfeiçoou-os  gradativamente a fim de levar o povo a poder receber a Revelação cristã, que significa a plenitude ou a consumação do processo”.
O autor prossegue, observando que o Pedagogo Divino não quis apagar o cabedal de idéias religiosas que Israel possuía por ocasião da aliança no Sinai. Não quis romper os laços do povo com o seu passado. Sem intervir por meio de milagres, Deus permitiu que a Teologia e a Moral do Antigo Testamento se desenvolvessem aos poucos, se desembaraçassem lentamente de tradições pouco exatas, crescessem por Ação da Providência Divina e de revelações especiais. Cf. J. P. Weisengoff. “Inerrancy of the Old Testament in religious Matters” em The Catholic Biblical Quarterly, 17 (1955), 34s.
12. Tal é, entre outros, o caso de Davi, mencionado à pág. 133. Tal é também o de Moisés e Aarão: embora por seu zelo religioso muito tenham agradado a Deus, foram certa vez incrédulos (cf. Nm 21, 7-12); não obstante, morreram em santa paz com o Senhor.
13. Note-se o caso de Abraão, que não hesitou em deixar sua terra e sua parentela para ir à região desconhecida, à qual Deus o chamava (cf. Gn 12, 1-4). Também não vacilou, quando o Senhor lhe pediu que oferecesse seu filho em sacrifício (cf. Gn 22, 1-18).
14. Cf. Missal Romano, “Oração da Missa pela Paz”.

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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