A Meditação Transcendental

Está em moda entre nós a
prática da meditação transcendental. Transcendental porque transcende ou
ultrapassa as coisas sensíveis para atingir – como dizem – o âmago do ser, num
processo de interiorização. Examinemos o assunto mais de perto.

 1. Em que consiste a
meditação transcendental?

 A meditação
transcendental vem a ser um dos exercícios que os india­nos, desde remotas
épocas, realizam a fim de conseguir paz e felicidade interior. Consiste numa
técnica mental que leva a pessoa primeiramente a procurar se colocar em estado
de relax ou de distenção interior; nessas con­dições, o indivíduo tenta
esquecer todas as realidades sensíveis e esvaziar a mente de todas as imagens
materiais que habitualmente a distraem.

Cria-se, assim, um estado de
“percepção vazia”; esta acarreta a cessação de emoções, sentimentos e
afetos. Em conseqüência, dizem, a pessoa se aprofunda em sua consciência, o que
lhe permite descobrir a realidade mais íntima do seu próprio ser. Nos
sucessivos níveis de profundidade da mente, o indivíduo se torna sempre mais
consciente da sua natureza divina (!). Esse estado final é denominado
“pura percepção”.

   Essa técnica é
habitualmente efetuada em casa, sem ritual preparatório e sem postura própria,
bastando um lugar em que o interessado possa se sentir confortavelmente
sentado. Há quem pratique a meditação duas vezes por dia, ou seja, de manhã,
antes do café, e à noite, antes de jantar. Todavia, mesmo em viagem ou fora
de   casa, as pessoas podem realizá-la, valendo-se do ambiente de uma
sala de espera, de um ônibus, de um trem, de um avião… 

A meditação transcendental é
ensinada por mestres. Cada candidato deve levar ao seu mestre algumas flores e
frutas frescas e um lenço branco novo, que serão usados pelo professor numa
cerimônia tradicional que antecede a primeira sessão de aprendizagem. O som é
muito importante para provocar e facilitar a meditação, contribuindo para
desligar a mente das suas preocupações cotidianas e suscitar a paz.

A meditação transcendental
dá o nome de “mantras” aos sons aptos a produzir tais eleitos. Cada
pessoa, dizem, vibra especialmente com determi­nados sons ou mantras; daí
requerer-se a particular habilidade de um mestre para que descubra qual o
mantra mais adequado para cada indivíduo e o faça funcionar.

 2. Quem é o fundador
da meditação transcendental?

 Seu fundador é o
indiano Maharishi Mahesh Yogi, cujos livros são difundidos também no Brasil.

Maharishi foi durante 12
anos discípulo de Swami Brabamande Saraswati, geralmente conhecido como
“Guru Dev”, herdeiro das antigas tradições ascéticas hinduístas.
Depois da morte de Guru Dev, Maharishi passou a levar vida eremítica em Atar Kash, no Himalaia.
Após dois anos de solidão, Maharishi sentia seu pensamento insistentemente voltado
para determinada cidade do Sul da Índia; cedeu, então, à sugestão e viajou para
lá.

O bibliotecário municipal da
tal cidade o encontrou e lhe perguntou se vinha do Himalaia e se dava aulas;
Maharishi respondeu que vinha, sim, de Uttar Kashi, mas não lecionava; não
obstante, o bibliotecário, sem ulterior consulta, programou uma série de sete
aulas públicas que Maharishi deveria dar na semana seguinte. O mestre resolveu
aceitar a façanha, e passou a divulgar a sua técnica de meditação pelo mundo
inteiro.

 3. Um testemunho

 Há pessoas que se
dizem beneficiadas pela meditação transcendental quando ainda estão no início
dos seus exercícios. Com o tempo, porém, os efeitos da técnica são nefastos,
como atestam outros depoimentos, dos quais citamos aqui um, colhido nos Gahiers
Sur l’Oraison, de Henri Caffarel: “Sou francesa. Tony, meu marido, é
norte-americano. Durante vários anos estive­mos profundamente engajados nos
movimentos fundados pelo indiano Maharishi Mahesh Yogi, movimentos que têm por
objetivo promover e ensinar a técnica da meditação transcendental. Ambos éramos
instrutores dessa técnica e dedicávamos todo o nosso tempo a atividades de
ensino, organização, publicidade, etc, sem nos reservar tempo algum para
lazeres.

Todavia, nosso estado de
saúde se deteriorou. O de Tony se tornou crítico, tanto no plano físico como no
plano psicológico. Fisicamente, ele ia enfraquecendo cada vez mais, o que o
impedia, por exemplo, de transportar peso ou de caminhar rapidamente…
Psicologicamente, ele estava muito sujeito a manifestações esquizofrênicas:
freqüentes acessos de cólera e impulsos incontroláveis, que o deixavam perplexo
a respeito do que dentro dele estava ocorrendo. Tornou-se evidente que esse
estado de saúde estava diretamente ligado à prática da meditação
transcendental; agravava-se na proporção do número de anos dessa prática e em
virtude da participação de Tony em cursos especiais e em meditações
prolongadas, que eram reservadas aos instrutores.

A nossa reflexão feita
juntamente com outros instrutores amigos, que em parte também tinham graves
problemas de saúde, levou-nos a reencon­trar a verdadeira mensagem de Deus,
transmitida aos homens por Jesus Cristo. Para mim, isso significou o retorno ao
sacramento da reconciliação após 12 anos e, para Tony, o batismo (fora educado
numa família marxista atéia)…

Maharishi se vê desarmado
diante dos numerosos problemas de saúde que ocorrem em muitos instrutores (os
problemas aparecem mais rapidamen­te em quem mais se entrega à meditação); nos
últimos anos, dirigiu um apelo a sumidades médicas tradicionais. A quanto
parece, não foi encontrada ne­nhuma solução eficaz para melhorar a situação, a
não ser a de diminuir ou mesmo suprimir a prática da meditação transcendental…
Permanece no movimento o problema da saúde; por isso, diversas pessoas
questionam hoje a própria técnica deste tipo de meditação. Aliás, em todas as
partes do mundo, vários instrutores e discípulos da meditação transcendental
suspen­deram toda atividade de magistério e mesmo de prática pessoal, induzidos
por uma reflexão sobre tais fatos”.

4. A
filosofia subjacente

 Embora os arautos da
meditação transcendental afirmem que esta nada tem que ver com religião ou
filosofia, na verdade ela está associada à filosofia religiosa dos mestres
indianos, isto é, ao panteísmo. Isso quer dizer: segundo a escola de Maharishi
Mahesh Yogi, a divindade se identifica com o íntimo do homem e com o âmago de
todos os seres visíveis. São palavras de Maharishi:

“O divino
transcendental, onipresente é, por virtude de sua onipresença, o Ser essencial
de todos nós. Forma a base de todas as vidas; não é outro senão o nosso próprio
ser ou Ser” Meditação Transcendental, pág. 251).

Ora, é ilógico identificar o
homem – contingente e volúvel como é – com a própria divindade, que por
definição é o contrário do contingente e volúvel. Deus é essencialmente
distinto do homem, do mundo e das realidades visíveis, pois Ele é absoluto e
eterno, ao passo que as criaturas sensíveis são relativas, transitórias e
temporárias. O infinito não resulta das realidades finitas postas em evolução. Nem
devemos imaginar que o eterno seja a soma de numerosíssimas parcelas de tempo.

A meditação transcendental
também professa a tese da reencarnação que é um postulado gratuito, visto que
ninguém tem recordação do que tenha sido em existências pregressas. Deus não é
um ser frio e amedrontador; que castiga os homens segundo a lei cega do Karma,
mas é o primeiro Amor; que quer salvar todos os homens, e espera que a criatura
lhe diga um “sim” pronto e generoso (cf. 1Tm 2,4).

De resto, a tradição cristã
conhece e prática a meditação sem panteísmo e sem técnicas desgastantes, como
atestam Santa Teresa de Ávila e São João da Cruz.

 

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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