A importância de viver bem a liturgia

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O povo católico tem muitas dúvidas sobre a Liturgia e muitos desconhecem o seu sentido e toda a sua riqueza. Para conhecer a Liturgia não basta conhecer os ritos e as rubricas (normas) das cerimônias litúrgicas; é preciso se aprofundar na figura do Cristo Sacerdote, nos Sacramentos, e no mistério da Igreja, através da qual Cristo continua a sua missão de salvar a humanidade.

Desde a mais remota antiguidade o homem buscou formas de se comunicar com a divindade; isto em todos os povos; seja através de danças, músicas, usando elementos da natureza como flores, plantas, animais, frutas, etc. É uma tendência inata no homem. O ser humano gosta de celebrações: celebramos aniversários, casamentos, bodas, formaturas, vitórias conquistadas, etc. Tudo isto acontece também, espontaneamente, no campo da fé, para se comunicar com Deus que se revela ao homem.

As Sagradas Escrituras nos mostram que desde o Antigo Testamento o povo judeu celebrava ricamente a Liturgia. Deus estabeleceu uma Aliança com esse povo, através de Noé, Abraão, Isaac, Jacó, Moisés, Davi, dos Profetas, etc… E esse povo respondia então a Deus mediante um culto de louvor e de adoração, de maneira rica e muito criteriosa. A tribo de Levi, os levitas, foi escolhida por Deus para prestarem os serviços religiosos. Daí saía os sacerdotes. Nesta Aliança Deus propõe ao povo as suas Leis a serem observadas, e, em contrapartida promete ao povo caminhar com ele, socorrê-lo e libertá-lo em suas necessidades.

A Liturgia do Antigo Testamento foi a forma que o povo encontrou para dar a sua resposta a Deus e celebrar a sua presença. Assim, o povo ia ao Templo, que Jesus tanto valorizou, à sinagoga, e mesmo em família, para orar e ouvir a sua Palavra, e celebrar o seu Deus, o qual escolheu Israel como a sua Esposa. A Lei e os Profetas, os Salmos e os demais livros sapienciais tiveram grande importância nestas celebrações, e ainda tem hoje. O próprio Jesus cantou os Salmos na última Ceia. Veja algumas citações que se referem à liturgia: “Moisés aspergiu com sangue a Tenda e todos os utensílios do culto (liturgia)” (Hb 9,21). “Completados os dias do seu ministério (liturgia), Zacarias voltou para casa” (Lc 1,23). “Celebravam eles (os primeiros discípulos) a liturgia em honra do Senhor” (At 13,2).

A Liturgia, em todos os tempos, é o culto público que o povo presta a Deus. Podemos dizer que é um diálogo entre o povo e Deus. O povo celebra os mistérios de Deus. Deus se entrega como dom ao povo, e este, acolhendo o dom de Deus, responde a Deus com louvor, e canta as suas maravilhas. A Liturgia é o culto sagrado que os antigos levitas ofereciam a Deus e que hoje é prestado pelo próprio Cristo, que se fez Sacerdote e Vítima da nova e definitiva Aliança, estendido até nossos dias pela celebração da Eucaristia, que unindo o nosso sacrifício ao de Cristo nos faz também “hóstias vivas”.

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A Liturgia terrestre está unida à Liturgia celeste

A importância de se amar a Liturgia

O que é essencial na Liturgia?

A Liturgia católica, instituída por Jesus, visa celebrar (=tornar célebre), dar importância, honrar, exaltar, em comunidade, a Santíssima Trindade de modo especial e celebrar os “santos mistérios”, os sacramento e os sacramentais. O Concílio Vaticano II, através da Constituição Dogmática Sacrosanctum Concilium expôs de modo admirável o que é a Liturgia e como ela deve se realizar: “Na liturgia Deus fala a seu povo. Cristo ainda anuncia o Evangelho. E o povo responde a Deus, ora com cânticos, ora com orações” (SC,33). Pela Liturgia a Igreja celebra o mistério de seu Senhor “até que Ele venha” e até que “Deus seja tudo em todos” (1Cor 11,26;15,28). A Liturgia é uma ação sagrada, com ritos, na Igreja e pela Igreja, pela qual se realiza e se prolonga a obra sacerdotal de Cristo, para a santificação dos homens e a glorificação de Deus (cf. SC,7).

Assim, para celebrar bem a Liturgia é preciso ter uma profunda noção do que é o Cristianismo; o conhecimento da história da salvação, da obra de Cristo e da missão da Igreja. Sem isto a Liturgia não pode ser bem compreendida e amada, e pode se transformar em ritos vazios. Podemos dizer que o último tempo da história da salvação – o tempo de Cristo e da Igreja – é o tempo da Liturgia, uma vez que ela torna presente a obra redentora de Cristo pela celebração dos Sacramentos. Assim, somos também nós participantes da história da salvação. A Liturgia é a própria história da salvação em exercício, já que nela se celebra (torna presente) tudo o que Deus realizou ao longo dos séculos para salvar os homens.

Jesus nos revelou plenamente o Pai, e ensinou-nos a comunicar com Ele. Ele é a ponte entre nós e o Pai. Ele é o Caminho, o Sacerdote único que apresenta a Deus as nossas preces (cf. Hb 5,7). É por isso que nas celebrações litúrgicas fazemos todas as ofertas a Deus “por Cristo, com Cristo e em Cristo”; tudo em seu Nome. A Liturgia participa do grande desejo de Jesus: “Desejei ardentemente comer esta páscoa convosco (…) até que ela se cumpra no Reino de Deus” (Lc 22,15-16).

Na Liturgia, a Igreja celebra principalmente o mistério Pascal pelo qual Cristo realizou a obra da nossa salvação (cf. CIC §1067). É o mistério central da vida de Cristo, sua Paixão, Morte e Ressurreição para nos salvar.

Quando a Liturgia faz memória desses mistérios, ela os torna presentes, traz para o momento atual esses acontecimentos da salvação e renova a nossa redenção; ainda nos indica o futuro: a construção do Reino de Deus. “No divino sacrifício da Eucaristia, “se exerce a obra de nossa redenção”, contribui do modo mais excelente para que os fiéis, em sua vida, exprimam e manifestem aos outros o mistério de Cristo e a genuína natureza da verdadeira Igreja” (SC 2). Pela Liturgia, Cristo, nosso redentor e sumo sacerdote, continua em sua Igreja, com ela e por ela, a obra de nossa redenção (cf. CIC §1069). Por meio dela Jesus Cristo exerce o seu múnus sacerdotal, onde é realizada a santificação do homem, e o culto público integral pelo Corpo Místico de Cristo, cabeça e membros.

Por isso, afirmou o Vaticano II que “toda a celebração litúrgica, como obra de Cristo sacerdote e de seu corpo que é a Igreja, é ação sagrada por excelência, cuja eficácia, no mesmo título e grau, não é igualada por nenhuma outra ação da Igreja” (SC,7). (CIC §1070).

Note, então, que nenhuma outra ação da Igreja supera a Liturgia. Por isso ela tem uma importância fundamental, e precisa ser celebrada muito bem. A Santa Sé tem a “Sagrada Congregação para o Culto Divino e disciplina dos Sacramentos”, que rege, com a aprovação do Papa, como a liturgia deve ser celebrada. Ninguém pode alterar por sua iniciativa as prescrições do culto litúrgico.

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Falando dos abusos que acontecem nas celebrações da Eucaristia, a Instrução “Redemptionis Sacramentum”, diz: “O Mistério da Eucaristia é demasiado grande «para que alguém possa permitir tratá-lo ao seu arbítrio pessoal, pois não respeitaria nem seu caráter sagrado, nem sua dimensão universal». Quem age contra isto, cedendo às suas próprias inspirações, embora seja sacerdote, atenta contra a unidade substancial do Rito romano, que se deve cuidar com decisão, e realiza ações que, de nenhum modo, correspondem com a fome e a sede do Deus Vivo, que o povo de nossos tempos experimenta, nem a um autêntico zelo pastoral, nem serve à adequada renovação litúrgica, mas sim defrauda o patrimônio e a herança dos fiéis com atos arbitrários que não beneficiam a verdadeira renovação e sim lesionam o verdadeiro direito dos fiéis à ação litúrgica, à expressão da vida da Igreja, de acordo com sua tradição e disciplina” (n. 10).

Todas as devoções do povo de Deus são importantes, especialmente as recomendadas pela Igreja, mas a Liturgia as supera. É toda a Igreja, o Corpo de Cristo unido à sua Cabeça, que celebra; por isso, as ações litúrgicas não são ações privadas, mas celebrações da Igreja, que é o sacramento da unidade, isto é, o povo santo, unido e ordenado sob a direção do Bispo. É por isso que a Igreja ensina que uma celebração comunitária, com assistência e participação ativa dos fiéis, deve ser preferida à celebração individual ou quase privada (cf. SC, 27 e CIC §1140).

Por tudo isso, a celebração litúrgica precisa ser muito bem preparada: as leituras bem feitas, sem erros e falhas; a música bem ensaiada e adequada, as vestes litúrgicas bem cuidadas, a igreja bem arrumada, os fiéis dispostos.

É de grande valor que as pessoas leiam as “Instruções gerais do missal romano”, que explicam com detalhes como a Santa Missa deve ser celebrada. E ainda a citada Instrução “Redemptionis sacramentum”, que mostra os erros e abusos que se cometem nas celebrações da Missa, e como ela deve ser celebrada e assistida corretamente. Esses documentos podem ser vistos nos sites: www.liturgia.pt e www.vatican.va; respectivamente.

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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