A beleza cristã não é superficial

Nos últimos anos, é comum encontrar nas dioceses, paróquias e comunidades pessoas que buscam celebrações alegres, festivas com muitos símbolos e ornamentos bonitos. Preocupações que privilegiam a beleza externa das celebrações com encenações religiosas dramáticas e teatralização da fé, muitas vezes esquecendo o aspecto da interioridade do mistério celebrado.

Apesar de nossa cultura ser tecnologicamente sofisticada, carrega alguns traços primitivos. E estes aparecem na forma simbólica, alegórica e, por que não dizer, mágica de certas expressões religiosas.

No entanto, as paróquias vivem uma realidade de estetização generalizada, cujos objetos adquirem, constantemente, uma funcionalidade primária de embelezamento.

A estratégia da globalização, que influencia a necessidade da estetização do cotidiano das pessoas, acaba levando a uma grande preocupação com o belo principalmente em relação às crenças.

Muitas vezes, a grande preocupação dos fiéis pelo embelezamento das celebrações deixa de lado a beleza do conteúdo doutrinal quando aprofundado. Precisa-se resgatar o verdadeiro sentido da beleza como nos fala o papa Bento XVI em muitas de suas obras e em diversos contextos: “A beleza, antes de tudo, é coerência: coerência da criação, da revelação, da tradição e coerência também do homem receptor da obra divina”. “A beleza cristã não é superficial. Inclui a cruz do Filho encarnado e com ela a verdade sobre a dor”. “Uma beleza não aberta a Deus reclui o homem nele próprio e é capaz de levá-lo ao desespero ou a um espiritualismo sem estreita relação com Deus”. “Os crentes devem mostrar a beleza de sua fé em autênticas cerimônias, sobretudo em sua liturgia”.

Frente a “celebrações-espetáculos”, as paróquias são chamadas a vivenciar o belo nas celebrações do mistério pascal, levando em conta os seguintes aspectos: profundidade doutrinal, conscientização sobre o que realmente se celebra e sobre como se celebra.

Profundidade doutrinal
A grande missão da Igreja é evangelizar e levar a boa notícia do evangelho a todos. Na era da estetização da fé, as homilias estão perdendo sua relevância para as dramatizações. As celebrações do mistério pascal estão virando programas de auditórios. O importante é bater palmas, estender as mãos, dançar mantras, gritar vivas, aplaudir e balançar lenços ou bandeirinhas. O presbítero se torna um animador de auditório.

Atualmente os fiéis necessitam de boas e preparadas homilias com argumentos convincentes. Uma boa homilia tem começo (despertar curiosidade), meio (explicar a Palavra de Deus) e fim (apontar para o mistério celebrado). Supõe preparar bem para falar o essencial. O segredo de uma boa homilia, que transforme os corações, é uma longa adoração diante do Santíssimo, conforme afirmou o Cardeal Ivan Dias, arcebispo de Bombaim (Índia), em sua intervenção durante o Sínodo em outubro de 2007. A meditação pessoal é essencial para que a assembleia seja tocada pela palavra.

Conscientização sobre o que se celebra
As celebrações litúrgicas devem ser obra de Cristo Sacerdote e de seu corpo que é a Igreja. É uma ação sagrada por excelência, cuja eficácia, no mesmo título e grau, não é igualada a nenhuma outra ação da Igreja. Esta ação seja uma ação festiva, realizada na gratuidade da fé e que se faz com palavras, gestos, ações simbólicas, ritos… sinais sensíveis (cf. SC 7) e que os ritos iniciais e os ritos finais emolduram os ritos centrais da Palavra e da Eucaristia, intimamente ligados entre si e realizando, numa sequência lógica e teológica, um só ato de culto (cf. SC 56).

A beleza das celebrações com sinais, símbolos, palavras, gestos, canto, música, imagens, cores, vestes, etc. leva-nos a uma verdadeira comunicação com o transcendente. Como dizia Simone Weil, “a beleza está para as coisas como a santidade está para a alma”.

Conscientização sobre como se celebra
Para celebrar o mistério pascal é necessário que nossas celebrações sejam ação simbólica, expressando o grande mistério da fé cristã em gestos, palavras e atos significativos.

A celebração eucarística e qualquer celebração cristã é ação ritual, é a atualização de uma memória simbolicamente expressa da presença de Jesus.

Por isso, o uso de símbolos não se faz somente pelo gosto de novidade, mas pela sua capacidade de expressar o que é essencial ao que se celebra ritualmente.

Uma liturgia sacramental deve ser tecida de sinais e símbolos que expressam as dimensões da fé e da esperança, que são por ela alimentadas. Temos uma infinidade de sinais e símbolos que poderiam ser mais valorizados, dentro de uma criatividade mais adequada aos anseios dos participantes e ao caráter específico das celebrações como: lavar e ungir, partir o pão e partilhar o cálice, dar as mãos, sentar-se à mesa, ajoelhar, caminhar, cantar, impor as mãos; usar bem os livros litúrgicos: missal, lecionários dominical, semanal e santoral e o evangeliário; aproveitar o espaço litúrgico: altar, ambão, credência, presbitério, sacrário; fazer uso adequado dos objetos litúrgicos: cálice, âmbula, castiçal, candelabro, cruz, velas e ostensório, bem como das vestes litúrgicas: túnica, casula, estola, dalmática e véu umeral.

Contudo, é fundamental o silêncio. Guarde-se em seu devido tempo, um silêncio sagrado (cf. SC, 10; IGMR, 23).

Neste momento da história, no contexto pós-conciliar, é nosso dever zelar pelos três aspectos mencionados a fim de darmos “razões da nossa esperança” (1Pd 3,15), grande objetivo do pontificado do Papa Bento XVI.

Por Cônego Edson Oriolo
Gaudium Press

Sobre Prof. Felipe Aquino

O Prof. Felipe Aquino é doutor em Engenharia Mecânica pela UNESP e mestre na mesma área pela UNIFEI. Foi diretor geral da FAENQUIL (atual EEL-USP) durante 20 anos e atualmente é Professor de História da Igreja do “Instituto de Teologia Bento XVI” da Diocese de Lorena e da Canção Nova. Cavaleiro da Ordem de São Gregório Magno, título concedido pelo Papa Bento XVI, em 06/02/2012. Foi casado durante 40 anos e é pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova.
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